Bitributação. A palavra resume o entendimento de especialistas em relação à recém-criada taxa municipal de controle e fiscalização ambiental que passou a ser cobrada das empresas no início deste ano pela Prefeitura de São Bernardo. O novo imposto surpreendeu os industriais são-bernardenses, que já pagam a TCFA (Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental) ao Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), órgão federal.
Para o advogado José Roberto Silva, que é procurador aposentado do município e especialista em Direito Tributário e Administrativo, trata-se de mais um imposto que incide sobre mesmo fato gerador. Ele cita ainda que a carga tributária brasileira já é um exagero, e que não tem cabimento mais uma taxa. Esse também é o entendimento do advogado Maurício Soares de Almeida Júnior, que atua nas áreas de Direito Administrativo e Civil. “Essa cobrança é bitributação, portanto, é ilegal”, diz.
O especialista Antônio Fernando Pinheiro Pedro, do Pinheiro Pedro Advogados, tem avaliação semelhante. “Entendo como bis in idem (termo em latim para designar tributo que incide duas vezes sobre mesmo fato gerador) o lançamento da taxa municipal”, afirma.
Questionada pela equipe do Diário, a Prefeitura respondeu, por meio de nota, que a taxa municipal foi criada “para que o município possa ter acesso ao percentual de 25% a que tem direito na taxa federal ao Ibama. Tanto municípios quanto Estados têm direito a uma parte deste imposto federal, porém, para terem acesso a essa parte, devem criar seus próprios instrumentos legais”, informa.
Almeida Júnior cita que a lei 10.165/2000 determina que a taxa seja paga ao Ibama e que Estados e cidades podem obter o repasse de parte da receita arrecadada com o TCFA, “assim como ocorre com IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores), em que a pessoa paga uma vez só e o órgão faz a partição”, diz. Para ter direito a parte dessa verba, é necessário, no entanto, firmar convênio com o órgão federal para desempenhar atividades de fiscalização ambiental, aponta a legislação. O advogado salienta que, se há problemas que impedem o repasse da verba ao município, isso não é motivo para que a administração passe a cobrar a mesma taxa das empresas da cidade.
Pinheiro Pedro considera que não serve de pretexto o fato de o tributo ter sido legalmente instituído no município como desculpa para que ocorra partição de receitas com a União. Ele observa ainda que o cadastro de atividades, bem como o relatório de emissões, resíduos e produção, estão vinculados à licença emitida pelo Estado e aos sistemas de informação e controle administrados pelo Ibama, “que já cobra a taxa”.
Outras cidades planejam cobrança
Atualmente, apenas São Bernardo tem taxa municipal de controle e fiscalização ambiental no Grande ABC, mas outras duas cidades planejam seguir esse caminho: as prefeituras de Diadema e Rio Grande da Serra. A primeira diz que tem projeto em análise para implantação da TCFA municipal. Ao mesmo tempo, no entanto, diz que o objetivo não é criar nova taxa, mas sim conseguir repasse de parte do que é cobrado pelo Ibama. A administração de Rio Grande da Serra também comunica que estuda a possibilidade de criar o imposto.
Por sua vez, o Semasa (Serviço Municipal de Saneamento Ambiental de Santo André) diz que trabalha na elaboração de projeto de lei que pedirá autorização legislativa para que o município possa requerer parte desta taxa já cobrada pelo Ibama.
INDIGNAÇÃO
Em reunião realizada há poucos dias para discutir o tema com empresários de São Bernardo, o diretor da regional do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo) no município, Hitoshi Hyodo, disse que recebeu com surpresa, na virada de 2013, a notícia de que haveria uma TCFA municipal. “Solicitamos a presença do secretário de Gestão Ambiental para tirar dúvidas, mas ele não veio”, lamenta.
Já faz alguns anos que o Ibama cobra a TCFA federal, que é trimestral, com valores que giram de R$ 50 (microempresas de baixo potencial poluidor) até R$ 2.250 (grandes empresas altamente poluidoras). Hyodo cita que a taxa municipal tem valores pequenos – vai de R$ 12 até R$ 500 trimestralmente, dependendo do porte e do grau de poluição. “Mas é bitribuição”, diz.
A nova taxa traz indignação a outros representantes do empresariado. “A Acisa (Associação Comercial e Industrial de Santo André) é contra a criação de impostos, se tiver na cidade, iremos procurar a Justiça”, afirma o presidente da entidade, Evenson Robles Dotto.
O Ciesp de São Bernardo avalia os encaminhamentos a serem dados, mas o diretor reforça que segue disposto ao diálogo com a administração municipal.
Empresas de ferramentaria pleiteiam ações do governo
Representantes do projeto APL (Arranjo Produtivo Local) de Ferramentaria do Grande ABC, que reúne pequenas empresas do segmento, com a participação e o apoio de entidades e prefeituras da região, vão enviar carta ao governo federal para relatar preocupação com o cenário da indústria automotiva brasileira e solicitar medidas emergenciais para reativar o segmento.
Segundo o secretário de Desenvolvimento Econômico de São Bernardo, Jefferson da Conceição, que integra a coordenação do APL, o documento a ser enviado contém, entre as reivindicações, elevação de carga tributária sobre produtos importados, novos incentivos fiscais aos veículos produzidos no País, investimentos das montadoras em pesquisa e desenvolvimento dos fornecedores e mais agilidade para a implantação da linha de crédito pró-ferramentaria.
O secretário executivo da Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC, Giovanni Rocco, salienta a importância da atividade automotiva para a região. “O grande desafio é fazer com que as benesses (os incentivos do governo dados à montadoras) atinjam toda a cadeia produtiva”, observa. A entidade também atua como uma das coordenadoras desse programa.
Entre os empresários do ramo, Graça Viana Miranda, que é diretora da pequena indústria Keefer, de São Bernardo, cita que o cenário é de preocupação. Ela acrescenta que, além de buscar o apoio do governo federal, o APL vem focando na procura de parcerias de negócios. Um exemplo é a aproximação com empresas do Japão, que pode resultar em negócios para indústrias da região.
TECNOLOGIA
Os coordenadores do APL de ferramentaria estão negociando com a Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), do governo federal, para viabilizar centro de tecnologia nesta área, para prestação de serviços de projetos, que deverá ter a participação do IMT (Instituto Mauá de Tecnologia) e da UFABC (Universidade Federal do ABC).
Segundo o superintendente do IMT, Fábio Sampaio Bordin, a ideia é ter ferramentas de software e hardware multiplataforma, que sirvam para oferecer serviços a todas as montadoras.
Fonte: Diário do Grande ABC; Clipping da Febrac- 29/4/2014.