Depois da C&A, foi a vez do Grupo Folha e da Emplavi Realizações Imobiliárias obterem, na Justiça, tutelas antecipadas (espécie de liminar) para deixar de recolher o adicional de 10% sobre o valor da multa de 40% do FGTS. A penalidade é paga pelo empregador em demissões sem justa causa. As decisões de primeira instância também garantem a devolução dos valores pagos pelas empresas nos últimos cinco anos. A União já recorreu das decisões que beneficiam a C&A e a Emplavi.
Com o argumento de que o adicional já teria cumprido o papel para o qual foi criado, as empresas buscaram a Justiça após a decisão do governo federal de manter a cobrança. Em julho, a presidente Dilma Rousseff vetou um projeto de lei, aprovado pelo Congresso, que extinguia a multa. A alegação foi a perda anual de R$ 3 bilhões nas contas do FGTS com o fim da arrecadação o que, segundo o governo, “impactaria fortemente” o desenvolvimento do programa habitacional Minha Casa, Minha Vida.
O aumento foi fixado pelo governo em 2001 por meio da Lei Complementar nº 110 com o objetivo de obter recursos para cobrir o rombo dos expurgos inflacionários dos planos Verão (1989) e Collor I (1990). Uma das previsões da norma foi o aumento da multa rescisória, incidente sobre o valor do FGTS depositado na conta do trabalhador e devida na demissão do funcionário. A lei estipulou um percentual a mais de 10% destinado ao governo, elevando a multa 40% para 50%.
Segundo levantamento feito por advogados nos balanços, o FGTS seria superavitário desde 2005. Em janeiro de 2007, foi paga a última parcela dos expurgos. Por essa lógica, não haveria mais necessidade de arrecadação.
A mensagem de veto ao projeto é um dos fundamentos utilizados pelos juízes para dispensar as empresas do pagamento da multa. Na decisão favorável à Emplavi Realizações Imobiliárias, o juiz Ivani Silva da Luz, da 6ª Vara Federal de Brasília, afirma que o texto evidencia ainda mais que o objetivo que gerou a criação da multa foi atingido. “Se cumprida a finalidade que motivou a instituição da contribuição, esta perde seu fundamento de validade, de modo que a exigência passa a ser indevida”, diz na decisão do dia 5 de dezembro.
Nas ações, as empresas alegam que a multa já teria cumprido o papel para o qual foi criada e que o governo a usaria para outros fins, como o programa habitacional Minha Casa, Minha Vida e o cumprimento do superávit primário (economia para pagar juros da dívida pública). Em setembro, o governo enviou um projeto de lei ao Congresso que transfere os recursos da multa ao “Minha Casa, Minha Vida”.
Para dispensar as empresas do Grupo Folha do recolhimento do percentual, a juíza Isaura Cristina Oliveira Leite, da 4ª Vara Federal de Brasília, transcreve na íntegra a tutela antecipada concedida à C&A em 25 de outubro.
Para fundamentar a decisão favorável à varejista, a juíza Solange Salgado, da 1ª Vara Federal de Brasília, havia citado o voto do ministro Joaquim Barbosa proferido em junho de 2012 no julgamento de duas ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) que questionaram a própria criação da multa adicional de 10% sobre o FGTS. Naquela ocasião, Barbosa ressalvou que “a existência da contribuição somente se justifica se preservadas sua destinação e finalidade”.
Ajuizadas logo após a criação da multa em 2001, as Adins só foram julgadas, no mérito, em 2012 sob relatoria de Barbosa, atual presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). Na ocasião, a Corte declarou a constitucionalidade da multa adicional de 10% sobre o FGTS.
De acordo com o advogado Flávio Carvalho, do escritório Souza, Schneider, Pugliesi e Sztokfisz Advogados, o voto do ministro fortalece a tese dos contribuintes. “A ressalva que ele fez deixou em aberto a discussão sobre a perda de fundamento, o que é relevante para as empresas agora”, afirma Carvalho, que defende a C&A, a Emplavi e o Grupo Folha.
Segundo Carvalho, Barbosa recebeu antes do julgamento petições de empresas que alertavam sobre a perda de finalidade da arrecadação, ou seja, que o rombo nas contas do FGTS não existiria mais. Mas ele não teria analisado esse ponto por não fazer parte da argumentação das Adins.
Fonte: Valor Econômico; Clipping da Febrac- 16/01/2014.