O reclamante prestava serviços de instalação e reparo de linhas à Telemar por meio de outra empresa e procurou a Justiça do Trabalho para pedir o reconhecimento do vínculo de emprego diretamente com a empresa de telefonia. Como fundamento, apontou a terceirização ilícita. No entanto, ao se defenderem, as duas empresas envolvidas requereram o sobrestamento (suspensão) do feito até final manifestação do Supremo Tribunal Federal acerca da possibilidade ou não de contratar empresas terceirizadas em relação a atividades inerentes na área de telecomunicação.
O processo foi analisado na 44ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte pelo juiz substituto Ricardo Gurgel Noronha, que rejeitou a pretensão das rés. “O caso em tela não envolve as operadoras de serviços de call center e seus contratados. Para situações idênticas é que houve a determinação de suspensão do feito por força da decisão do STF, com foros de repercussão geral no Recurso Extraordinário com Agravo (proc. ARE 791932), sendo que reclamante não exerceu a função de operador de teleatendimento”, destacou na sentença.
O magistrado se referia à decisão proferida pelo Ministro Teori Zavascki nos autos do Recurso Extraordinário com Agravo nº 791932-DF, em que se discute a licitude da terceirização da atividade de call center pelas concessionárias de telecomunicações à luz do artigo 94, inciso II, da Lei 9.472/97 (“No cumprimento de seus deveres, a concessionária poderá, observadas as condições e limites estabelecidos pela Agência: (…)II – contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço, bem como a implementação de projetos associados”). O Ministro determinou o sobrestamento de todas as causas que apresentem questão idêntica à que será resolvida com foros de repercussão geral no caso, sem prejuízo do término de sua fase instrutória, bem como das execuções já iniciadas (publicado em 26/09/2014).
Em sua decisão, o juiz sentenciante se reportou a decisão de Turma do TRT de Minas em Embargos de Declaração, que revogou despacho anterior que havia acatado o sobrestamento. O entendimento esposado, por maioria de votos, foi o de que a decisão proferida pelo Ministro alcança apenas as ações em que se discute a licitude da terceirização dos serviços de call center à luz do artigo 94, II, da Lei 9.472/97. Para o juiz sentenciante, esta também não é a situação dos autos. “Não se tratando a hipótese de questão idêntica à mencionada na decisão do Supremo Tribunal Federal, rejeito o requerimento de suspensão formulado pelas reclamadas”, concluiu.
No mérito, o julgador considerou ilegal a terceirização dos serviços do reclamante para a Telemar por meio de outra empresa. Ao caso, aplicou o artigo 9° da CLT, reconhecendo a fraude aos direitos trabalhistas. Por identificar a subordinação estrutural/integrativa do reclamante à empresa, atuante na área de telecomunicação, decidiu declarar o vínculo de emprego entre ele e a Telemar. “Se a Telemar vende uma linha telefônica, é evidente que precisará de empregados para fazer a sua instalação e reparo, e, nesse tocante, o reclamante se encontra estruturalmente subordinado à segunda reclamada, mesmo que não estivesse sob as ordens diretas de qualquer preposto dela”, destacou na sentença, identificando, no caso, também, a presença dos demais requisitos da relação de emprego, quais sejam, onerosidade, pessoalidade e não eventualidade.
Na decisão, o juiz expressou o seu entendimento sobre a discutida legalidade das terceirizações nas empresas de telefonia: “Nesse diapasão, não se prescinde da resolução da questão sobre ser admissível a terceirização de atividades normais ou essenciais (atividade-fim), no presente caso. A despeito do artigo 94, II, da Lei 9.472/97 c/c artigo 25, § 1º, da Lei 8.987/95 mencionar a possibilidade de contratação de terceiros para a realização de atividades inerentes ao serviço, entende este Juízo que as normas retrocitadas apenas explicitam/ratificam as previsões contidas na Lei 6.019/74 e na Súmula 331, I, do C. TST. Do contrário, representaria admitir a precarização das relações de empregos. Fazendo uma interpretação sistemática-constitucional, considerando em especial o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (art. 1°, III, CF/88), os valores sociais do trabalho (art. 1°, IV, CF/88), os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil de constituir uma sociedade justa, livre e solidária e erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais (art. 3°, I e III, CF/88) e que a ordem econômica é fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social (art. 170, CF/88), refuta-se a interpretação de que a expressão inerentes contida na lei de telecomunicações seja um permissivo amplo para a contratação de empresas interpostas para os serviços típicos de sua dinâmica empresarial, transferindo o risco da atividade para a parte mais fraca da relação de emprego, quem seja, o trabalhador, que será privado de diversos direitos, tendo sua relação fadada à precarização”, pontuou.
As funções reconhecidas como exercidas pelo reclamante foram, inicialmente, as de Trainee instalador e reparador de linhas e aparelhos telefônicos e, depois, de reparador de linhas e aparelhos. A Telemar foi condenada ao pagamento de verbas relativas ao contrato de trabalho, bem como ao cumprimento de obrigações pertinentes, tudo conforme determinado na sentença. Como real empregadora, foi considerada responsável por todas as verbas deferidas na decisão. Já a outra reclamada, deverá responder de forma solidária (artigo 9° da CLT c/c art. artigo 942 do Código Civil). Há recurso em tramitação no TRT de Minas.
( 0002202-89.2014.5.03.0182 RO )
Fonte- TRT-MG- 29/5/2015.