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Uso equivocado da ferramenta sigilo no Pje pode gerar intempestividade

A instituição do Sistema do Processo Judicial Eletrônico na Justiça do Trabalho, como tudo que é novo, traz desafios e dificuldades que apenas serão superados com a prática e o aperfeiçoamento necessários. Prevendo isso, ao instituir o sistema do PJe-JT, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho estabeleceu diretrizes para a sua implementação e funcionamento, mediante a Resolução CSJT n. 136/2014.

Mas, ainda assim, existe a possibilidade de equívocos no manejo das ferramentas pelos usuários do sistema. E é preciso ficar atento, pois as consequências desses erros podem ser decisivas no processo. Esses atropelos surgidos no uso da nova tecnologia serão tema de matérias informativas aqui, no Notícias Jurídicas Especial, nas quais procuraremos esclarecer as mais diversas questões envolvendo o Pje e seu sistema.

Nesta primeira especial sobre o PJe, você confere três casos recentemente analisados pelo TRT de Minas, nos quais os julgadores constataram que, ao lançar no sistema a petição de recurso ordinário, as partes usaram de forma equivocada a ferramenta “SIGILO”. Ao ser acionada, ela impede que a petição seja visualizada pelas partes, terceiros e até mesmo pelos serventuários da Justiça do Trabalho. Desta forma, uma petição configurada como sigilosa somente poderá ser visualizada e desbloqueada pelo juiz do processo. Mesmo que o juiz tenha acesso a todos os processos, a constatação de que as razões de recurso não estão visíveis porque sigilosas pode demorar porque não passará pelo crivo mais imediato da organização que é feito pelos serventuários na secretaria das varas e dos gabinetes.

Nas três situações, em razão das dificuldades iniciais com a operação do sistema, os recorrentes inseriram a condição de sigilo nas petições dos recursos, embora não se tratasse de hipótese legal que justificasse a decretação do segredo de justiça, como previsto taxativamente no artigo 155 do CPC. Assim, o lançamento dos documentos como sigilosos pelas próprias partes impossibilitou a publicidade e a visibilidade imediata da peça. As petições dos recursos ficaram “invisíveis” para a secretaria da Vara. Essa irregularidade pode ser constatada pela simples análise do “quadro de eventos do processo”, no qual não constará o protocolo da peça recursal tida como sigilosa.

Essa situação, comum aos três casos, gerou uma discussão sobre a tempestividade dos recursos. É que, embora eles tenham sido apresentados dentro do prazo legal, por terem sido gravados com sigilo tornando impossível sua visualização pela secretaria, foram dados a conhecer somente após a expiração do prazo, quando já iniciado o processo de execução. Dessa forma, foram considerados intempestivos pelo juiz de 1º Grau, que não os recebeu. Inconformadas, as partes interpuseram agravo de instrumento, insistindo na tempestividade dos recursos.

Veja como cada Turma decidiu essa questão, de acordo com os entendimentos diferenciados dos seus magistrados:

Caso 1: Sigilo deve ser justificado

No primeiro caso, analisado pela 9ª Turma do TRT de Minas, os julgadores foram unânimes em dar razão ao reclamado agravante. Conforme ressaltou a desembargadora Mônica Sette Lopes, relatora do recurso, o uso equivocado pelo recorrente da ferramenta “sigilo” no sistema PJE não implica em alteração da data da protocolização do recurso ordinário apresentado no prazo legal. Ela explicou que, apesar de ser impossível para os servidores da secretaria da Vara visualizar o recurso, a peça gravada com sigilo pode ser acessada pelo magistrado que tem a direção do processo, a quem cabe deferir ou não a solicitação de sigilo, conforme estabelecido no art. 37, parágrafo único, da Resolução CSJT n. 136/2014.
Segundo a desembargadora, não constitui pressuposto recursal a ausência de marcação de sigilo no sistema PJE pela parte na interposição de apelo. Assim, apresentado o recurso no prazo legal, ele deve ser considerado tempestivo, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LIV e LV, da CR/88). A relatora destacou o art. 61 da Resolução CSJT n. 136/2014, justamente prevendo dificuldades iniciais com a operação do PJe, orientou que todas as questões relativas à utilização e ao funcionamento do PJe-JT sejam resolvidas pelo juiz da causa, “em cada caso concreto, inclusive as hipóteses não previstas neste regramento”. Citou, ainda, o art. 37, parágrafo único, da Resolução, que estabelece que a solicitação de sigilo disponível no sistema PJe-JT deve vir justificada na petição, “cabendo ao magistrado deferi-la ou não”. Com base nesses fundamentos, a Turma deu provimento ao agravo de instrumento, para determinar o processamento do recurso ordinário interposto. ( 0010025-08.2013.5.03.0164 – AIRO )

Caso 2: Erro escusável

No segundo caso, levando ao conhecimento da 3ª Turma do TRT/MG, os julgadores decidiram da mesma forma, também por unanimidade. Na hipótese, o recurso foi erroneamente gravado como sigiloso pelo próprio reclamante. E, como nos demais casos, apesar de interposto no prazo legal, o equívoco impossibilitou a publicidade do ato. A relatora do recurso, desembargadora Taisa Maria Macena de Lima, esclareceu que a ferramenta “sigilo” foi inserida no sistema PJE apenas para se permitir que a defesa e os documentos fossem protocolados eletronicamente, de forma SIGILOSA, ou seja, invisível. Assim, no momento da audiência, não havendo acordo, seriam tornados públicos pelo julgador, através do desbloqueio. É que o art. 847 da CLT prevê que o momento oportuno para se apresentar a defesa é em audiência. Desta forma, a ferramenta visava apenas se evitar que a parte adversa tivesse acesso à defesa antes do prazo previsto na CLT.

Explicou a desembargadora que os documentos sigilosos somente são visualizados no painel de acesso do magistrado. Assim, no caso, a existência do recurso ordinário do reclamante somente foi constatada após a interposição do Agravo de Instrumento, o que levou o magistrado a declarar a intempestividade do apelo. Mas, na visão da desembargadora, a situação verificada no processo demonstra que o sigilo do recurso ordinário foi incluído pelo advogado por mero descuido ou dificuldade que todos os operadores do direito estão encontrando para o manejo deste novo sistema processual eletrônico, tratando-se, portanto, de “erro escusável”. Ela ponderou que meros equívocos no novo procedimento virtual devem ser relevados pelos julgadores, assegurando, desta forma, a observância de todos os princípios constitucionais. Assim, a Turma julgadora, acompanhando o entendimento da relatora, deu provimento agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso ordinário interposto. ( 0010132-78.2013.5.03.0026 – AIRO )

Caso 3: Enquadramento incorreto, erro inescusável

Por fim, no terceiro caso, apreciado pela 1ª Turma do TRT mineiro, a solução foi diferente. Embora a relatora do recurso, juíza convocada Maria Cecília Alves Pinto, tenha dado razão ao recorrente, a maioria da Turma decidiu de maneira contrária. Para a relatora, apesar de a aposição do sigilo por parte do recorrente ter dificultado o manejo desse novo sistema que é o PJe, o equívoco “não representou desprezo às regras de processo e à ética que permeia as relações processuais, revelando mero desconhecimento quanto ao uso adequado do sistema. Assim, interposto o recurso no prazo legal, essa relatora daria provimento ao AI para determinar o processamento do recurso ordinário”.

Mas, de acordo com o entendimento que prevaleceu na Turma, mesmo considerando se tratar de processo que tramita eletronicamente, o erro de processamento da parte quanto ao manejo do recurso ordinário foi grosseiro, o que não permite o seu conhecimento. Os julgadores registraram que o artigo 155 do CPC aponta quais são os casos em que se pode decretar o segredo de justiça, e, em nenhum deles se encontra a situação do processo. “O Pje, nesse aspecto, não introduziu qualquer novidade legislativa. Instrumentalizou, apenas e tão-somente, a possibilidade de a própria parte apontar os casos dessa ocorrência (e assim, de fato, deveria fazê-lo), pois, dada a instantaneidade de veiculação dos documentos vertidos ao meio eletrônico, não haveria como estes passarem pelo crivo do Juiz antes de chegarem ao conhecimento da parte contrária. Contudo, o uso dessa opção deve se ater aos casos previstos em lei. Quando a parte age em abuso, deve arcar com os riscos e ônus dessa opção. No caso, lançando a parte no recurso ordinário o crivo de segredo ou sigilo de justiça, só se pode considerar ele interposto, quando o juiz o disponibilizar para consulta no processo eletrônico, devendo esta data ser considerada como da interposição. Se extemporâneo, tem-se o decurso do prazo, com as consequências decorrentes”, destacou a relatora.
No caso, os julgadores verificaram que, tendo sido o recurso ordinário gravado com sigilo, sua existência somente foi descoberta depois da certificação do trânsito em julgado da decisão, com início da fase de execução. Nesse contexto, a maioria da Turma decidiu que não poderia haver o retrocesso do tempo, para a apreciação do recurso apresentado na fase de conhecimento. Por essas razões, a Turma, por sua maioria, manteve a decisão de Primeiro Grau que declarou a intempestividade do recurso, negando provimento ao agravo de instrumento interposto.
( 0010030-30.2013.5.03.0164 –AIRO )

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região Minas Gerais, 02.12.2014;
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