Assim como o empregador pode aplicar a justa causa ao empregado que pratica falta grave, o empregado também pode tomar a iniciativa de rescindir o contrato de trabalho, por alto faltoso do empregador. É a chamada rescisão indireta, também conhecida como justa causa do empregador, disciplinada no artigo 483 da CLT. A vantagem dessa forma de desligamento para o empregado é que as verbas rescisórias são as mesmas devidas na dispensa sem justa causa. E é isso, justamente, o que visam muitos trabalhadores que tentam obter na Justiça do Trabalho a declaração da rescisão indireta, ao invés de simplesmente pedir demissão do emprego.
Recentemente, o juiz Eduardo Aurélio Pereira Ferri, titular da 8ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, julgou uma reclamação que ilustra bem essa realidade. No caso, a empregada de um supermercado pretendia obter a declaração da rescisão indireta, alegando que sofreu desvio de função no emprego. De acordo com o magistrado, o fato não ficou provado nos autos. Mas, ainda que assim fosse, ele entendeu que o motivo não justificaria a rescisão indireta do contrato de trabalho: “O descumprimento das obrigações trabalhistas previstas no art. 483, ´d´ da CLT, como causa de rescisão indireta do contrato de trabalho, tem que se caracterizar como falta grave o suficiente para inviabilizar a continuação do vínculo empregatício”, destacou.
O juiz sentenciante lembrou que, no mundo contemporâneo, em razões das recorrentes crises econômicas, tem-se visto até mesmo a redução de salários e aposentadorias. Ele deu, como exemplo, a Grécia. Conforme ponderou, se o reclamado tivesse deixado de pagar salários, aí sim haveria motivo para se buscar a rescisão indireta. Afinal, ninguém sobrevive sem receber salários. Mas o caso é diferente. Ele lamentou o fato de que, hoje em dia, todo e qualquer descontentamento seja utilizado para buscar a rescisão indireta e o pagamento o de indenização por dano moral.
“Infelizmente, no mundo contemporâneo, a possibilidade de ir a juízo pedir reparação moral e rescisão indireta em decorrência do mínimo dissabor, vem deixando as pessoas extremamente melindradas, sendo certo que pequenos aborrecimentos e alteração na rotina de trabalho ao longo dos anos foram, são e continuarão sendo parte do cotidiano de todos”, refletiu. O julgador lembrou uma decisão do TRT de Minas, que entendeu que a falta de pagamento regular de horas extras não seria motivo grave o suficiente para declaração da rescisão indireta. O pagamento das horas extras, neste caso, poderia ser cobrado por meio de simples ajuizamento de reclamação trabalhista, não dando ensejo à rescisão indireta.
No sentir do julgador, a reclamante estava insatisfeita com o emprego, mas, ao invés de simplesmente pedir demissão, optou por pleitear judicialmente a rescisão indireta do contrato de trabalho, a fim de obter direitos decorrentes da dispensa injusta. Tanto é assim que ela se afastou do trabalho antes mesmo de obter um pronunciamento judicial.
Diante desse cenário, o magistrado negou a pretensão e reconheceu que o fim do contrato de trabalho se deu por iniciativa da reclamante, sendo o réu condenado às parcelas rescisórias próprias desse tipo de rompimento contratual. De acordo com o julgador, sendo a reclamante demissionária, não há direito a entrega de guias. Afinal, não há levantamento de FGTS e nem recebimento de seguro-desemprego nessa forma de desligamento. ( nº 00224-2014-008-03-00-0 )
Fonte: TRT-MG; Clipping da Febrac- 24/4/2014.