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TSE tenta fechar brecha para doações ocultas

Resolução editada pelo Tribunal Superior Eleitoral para a eleição de outubro vai fechar uma das brechas para doações ocultas de empresas para candidatos: o uso dos comitês financeiros e partidos como intermediários da contribuição, como forma de esconder a relação direta entre doador e candidato.

Publicada no dia 5 de março, a Resolução 23.406 determina que os candidatos deverão identificar CPF ou CNPJ do doador originário de repasses feitos por partidos, comitês e campanhas de outros candidatos nas prestações de contas feitas ao TSE durante a eleição. Isso vai permitir, na visão de técnicos do tribunal, saber quem financiou cada campanha.

Nas eleições anteriores não havia essa regra, adicionada a pedido do Ministério Público de São Paulo neste ano. O partido ou comitê indicava na prestação de contas de quem recebeu o dinheiro e para quais candidatos tinha feito doações, mas não fazia uma ligação direta. Muito dinheiro costuma passar pelas contas das legendas durante a eleição e fica impossível dizer, com precisão, quem foi o destinatário das doações de cada empresa – e saber, com isso, as relações empresariais de cada político.

Isso ocorreu, por exemplo, na campanha do atual prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), em 2012. O petista recebeu 90,7% dos R$ 42 milhões arrecadados por meio de repasses dos diretórios nacional e estadual e dos comitês para prefeito e vereador. Desta forma, só é possível identificar com certeza os doadores de menos de R$ 4 milhões da campanha mais cara do país na última eleição municipal.

Não basta consultar as doações recebidas pelo comitê financeiro da campanha, que recebeu R$ 37,9 milhões, para saber de onde veio o dinheiro. Na planilha constam nomes de construtoras, seguradoras e outras empresas, mas o grosso da arrecadação (R$ 29 milhões) foi doado pelo diretório nacional, que por sua vez recebeu o dinheiro de empresas. Mais difícil ainda é retirar essas informações da prestação de contas do diretório nacional, pela qual passaram mais de R$ 200 milhões durante os quatro meses da campanha de 2012.

O mesmo ocorreu em 2010. O diretório nacional do PT recebeu R$ 81,9 milhões em doações, que repassou a 287 candidatos a deputado federal e governador. O PSDB, que perdeu a eleição nacional, distribuiu R$ 54 milhões para 86 candidatos à Câmara dos Deputados, Senado Federal ou aos governos estaduais, sem que seja possível saber exatamente quem pagou cada campanha.

Com a mudança nas prestações de contas, o TSE pretende pôr fim a isso. Cada candidato terá que dizer o nome do responsável pelo recurso repassado pelo partido ou comitê e que vai ser aplicado em sua campanha. “Essa nova regra dá maior transparência. Vem para atender tudo aquilo que a sociedade hoje clama”, diz José Norberto Lopes Campelo, presidente da Comissão Especial de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil.

A alteração, porém, é criticada pelo advogado Leandro Petrin. Especialista em direito eleitoral, ele defende que a obrigatoriedade de dizer quem é o doador pode acabar relacionando empresas e candidatos que não tenham relação. “Não é uma conta obrigatoriamente casada. Muitas empresas doam para um partido e deixam que os dirigentes escolham as candidaturas que vão receber”, afirma. “Da mesma forma, candidatos fortes costumam receber esses recursos sem necessariamente terem relação com as empresas que contribuíram para o partido, como forma de alavancar a candidatura ou puxar votos para a Câmara”, diz.

Petrin aponta os danos que isso pode causar tanto na imagem das empresas quanto dos candidatos. “De repente um dos dois é pego em esquema de corrupção e já vão fazer a relação direta entre os dois”, pondera. Técnicos do TSE ouvidos pelo Valor reconheceram que este é um problema a ser enfrentado, mas argumentaram que o eleitor tem o direito a mais transparência para decidir em quem votar.

Para Petrin, a decisão do TSE em 2010, de obrigar as legendas a abrirem contas específicas para movimentar as doações eleitorais e prestarem informações durante a eleição já é suficiente. “Quando se fala na lógica da fidelidade partidária, do fortalecimento dos partidos, não há porque fazer essa distinção. Quem doou para o Fernando Haddad estava doando para a estrutura do partido”, afirma.

Outro que é contra a norma é o professor de ciência política da Universidade de Brasília David Fleischer. “Acho muito complicada essa norma e muito fácil de burlar. O partido não vai abrir duas mil contas separadas, vai ser impossível confirmar a informação”, diz, ao apontar o aumento da contabilidade não oficial. “A alternativa para a empresa que quer doar e não quer aparecer é o caixa dois.”

Tesoureiro do PSB, o deputado federal Márcio França (SP) diz que a mudança é positiva. “Na verdade, não existe mais doação oculta, o partido já presta contas em abril e outubro e se cruzar os dados dá para saber quem doou, mas vai tornar mais rápido o acesso à informação”, diz. Os secretários de finanças de PT e PSDB não responderam ao pedido de entrevista.

Fonte- Valor Econômico – 01/04/2014; https://www1.fazenda.gov.br/resenhaeletronica/MostraMateria.asp?page=&cod=955890

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