Há vício do serviço na emissão de comprovantes de operações bancárias em papel termossensível, pelas máquinas de autoatendimento, haja vista o curto prazo de duração das informações nele contidas? A questão será dirimida pela 4ª turma do STJ, em caso sob a relatoria do ministro Luis Felipe Salomão, que entendeu que sim.
No caso, o Instituto de Defesa do Consumidor e do Trabalhador do município de Teresópolis (INDEC) ajuizou ação civil pública em face do Santander, visando impedir a utilização de papel termossensível nas máquinas de autoatendimento, bem como postulando a condenação do banco a fornecer, gratuitamente, segunda via dos comprovantes, além de pagamento de R$ 3 milhões a título de danos morais difusos.
O juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente os pedidos para condenar a instituição financeira a conceder de forma gratuita aos consumidores a segunda via dos comprovantes apagados de operações bancárias, até 5 anos após o encerramento da conta – vedada a utilização de papel termossensível -, bem como determinou fosse divulgada a sentença em jornal de divulgação regional. O TJ/RJ deu parcial provimento ao recurso do banco, limitando a condenação a obrigação da emissão da segunda via do comprovante.
A instituição interpôs RESp no STJ alegando que o acórdão foi omisso. Sustentou que a emissão dos comprovantes em papel termossensível cumpre com exatidão a função a que se destinam, qual seja, permitir que o usuário verifique, através do respectivo comprovante emitido, a regularidade da transação bancária realizada, o que é algo efetuado imediatamente ou, pelo menos, em curto espaço de tempo. Salienta que tais comprovantes não visam conferir ao consumidor meio de prova para eventual alegação de inadimplemento de obrigação assumida frente ao prestador de serviço, mas tão somente a possibilidade de identificar a realização de determinada operação.
De acordo com o banco, o serviço de emissão de comprovantes em caixas eletrônicos consiste em comodidade oferecida ao consumidor, que pode se valer de outros meios para comprovar o adimplemento de sua obrigação frente ao prestador de serviços, como o extrato mensal e a impressão de comprovantes das operações realizadas no Internet banking.
Em seu voto, o ministro Salomão frisou que a questão era interessante. “A despeito de a discussão sobre os vícios do produto e do serviço não ser nova no âmbito desta Corte, verifica-se que o objeto do presente recurso especial ainda não foi apreciado, no âmbito do seu mérito, por nenhuma das Turmas especializadas na matéria.”
O papel termossensível, popularmente denominado de papel térmico, destacou o ministro, é corriqueiramente utilizado no comércio na impressão de notas fiscais e de comprovantes de transações.
Lembrando as razões pelas quais papel desbota rapidamente, o ministro destacou que, diante do conceito legal de “defeito na prestação do serviço”, a instituição financeira, ao emitir comprovantes de suas operações por meio de papel termossensível, acabou atraindo para si a responsabilidade pelo vício de qualidade do produto.
“Isso porque, por sua própria escolha, em troca do aumento dos lucros – já que impressão no papel térmico é mais rápida e bem mais em conta -, passou a ofertar o serviço de forma inadequada, emitindo comprovantes cuja durabilidade não atendem as exigências e necessidades do consumidor, vulnerando o princípio da confiança.”
O ministro pontuou ser da natureza específica do tipo de serviço prestado, o de emitir documentos de longa vida útil, a permitir que os consumidores possam, quando lhes for exigido, comprovar as operações realizadas, não cabendo, por óbvio, a argumentação de desgaste ou deterioração natural da impressão no papel.
Além disso, Salomão destacou que condicionar a durabilidade de um comprovante às condições de armazenamento do mesmo, além de incompatível com a segurança e a qualidade que se exige da prestação de serviços, torna a relação excessivamente onerosa para o consumidor, parte mais sensível da relação, que, além dos custos de emitir um novo comprovante, em outra forma de impressão (fotocópia), por sua própria conta, teria o ônus de arcar, em caso de perda, com uma nova tarifa pela emissão de 2ª via do recibo, o que se mostra abusivo e desproporcional.
“Tenho que o serviço disponibilizado foi inadequado e ineficiente, porquanto incidente na frustração da legítima expectativa de qualidade e funcionalidade do consumidor-médio em relação ao emaecimento prematuro das impressões em papel térmico, concretizando-se o nexo de imputação na frustração da confiança a que fora induzido o cliente.”
Desta forma, o ministro entendeu correta a decisão do TJ/RJ que, mantendo a sentença de piso, determinou apenas a abstenção da cobrança pela emissão de 2ª via do comprovante, que não seja em papel termossensível (sob pena de renovar o problema do desbotamento de informações), como suficiente para assegurar o cumprimento dos direitos do consumidor e dos preceitos da lei 8.078/90 até que eventual normativo disponha ou determine de forma diversa.
No sentindo do desprovimento do recurso do banco também votou o ministro Raul Araújo. O julgamento foi adiado por pedido de vista da ministra Isabel Gallotti.
Processo: REsp 1.414.774
Fonte- Migalhas- 17/12/2018- https://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI293055,41046-STJ+julga+se+ha+vicio+na+emissao+de+comprovantes+bancarios+em+papel