Procurador João Batista de Figueiredo: jurisprudência citada em decisão monocrática foi firmada sem discussão
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) voltará a analisar uma questão polêmica: a possibilidade de cobrança de dívida do sócio-gerente de empresa que não participava da sociedade na época em que o tributo deveria ter sido pago. A 2ª Turma da Corte decidiu aceitar um recurso da Fazenda Nacional, colocando novamente em pauta discussão sobre redirecionamento de execução fiscal, tema que já se pensava estar consolidado na Corte.
Inicialmente, o relator do caso, ministro Mauro Campbell Marques havia, em decisão monocrática, negado o recurso com base na jurisprudência do tribunal, favorável ao contribuinte. Ele alterou seu entendimento depois de a questão ser levada à 2ª Turma na semana passada e o ministro Herman Benjamin apresentar entendimento contrário. Ainda não há data determinada para o julgamento.
Os ministros irão analisar o processo que envolve um sócio-gerente que, apesar de não estar na sociedade no período em que ocorreu o fato gerador do tributo, integrava a empresa quando ocorreu a dissolução irregular. A Fazenda Nacional entende que só esse fato bastaria para a cobrança ser redirecionada a ele.
De acordo com a Súmula nº 435 do tribunal, presume-se dissolvida irregularmente uma empresa que deixa de funcionar em seu domicílio fiscal, sem comunicar o fato aos órgãos competentes, o que legitimaria o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-gerente.
Na retificação de seu voto, Campbell afirma que não há uma unanimidade entre os precedentes da 1ª Seção – e que há decisões que consideram suficiente para o redirecionamento o exercício da gerência no momento da dissolução irregular. Anteriormente, porém, havia afirmado que “a jurisprudência do STJ encontra-se pacífica no sentido de que não é possível o redirecionamento da execução fiscal em relação a sócio que não integrava a sociedade à época dos fatos geradores”.
Nos últimos anos, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional vinha perdendo a discussão, segundo João Batista de Figueiredo, coordenador-geral da Representação Judicial da Fazenda Nacional (PGFN/CRJ). “A jurisprudência – citada na decisão monocrática do ministro Mauro Campbell Marques – foi firmada sem discussão, o que causou problemas e o ministro Herman Benjamin sugeriu uma revisão completa”, afirma Figueiredo.
A empresa que terá seu processo julgado pelos ministros da 2ª Turma do STJ está sem representação nos autos do processo e seus representantes não foram localizados pela reportagem até o fechamento da edição.
“A sustentação dos advogados vai ser fundamental nesse caso. Penso que se os ministros tivessem uma posição consolidada teriam naquele momento julgado o mérito”, afirma Emmanuel Biar, sócio da área tributária do escritório Veirano Advogados.
O advogado diz acreditar que o processo poderá ser julgado como recurso repetitivo. “Mesmo que não seja, será um precedente importante, que poderá ajudar a consolidar o entendimento dos tribunais”, afirma Biar.
De acordo com ele, é comum a mudança de sócios nas empresas, tendo em vista o tempo que o Fisco demora para lavrar as autuações fiscais. “Se pensarmos que o Fisco demora de cinco a dez anos entre a lavratura do auto de infração e a propositura da execução fiscal, é normal haver alguma alteração no quadro societário”, diz.
Além de alargar as hipóteses de redirecionamento em casos de dissolução irregular, uma decisão favorável ao entendimento da Fazenda Nacional poderá abrir um precedente perigoso, segundo Yun Ki Lee, sócio do Lee, Brock e Camargo Advogados. “Haveria a possibilidade de validar de vez o entendimento do Fisco favorável ao redirecionamento de execução fiscal contra sócios com poderes de gerência que ingressaram na sociedade após o fato gerador de tributos executados nas hipóteses de atos praticados com infração à lei ou com excesso de poderes”, afirma Lee.
A decisão da 2ª Turma, segundo Francisco Carlos Rosas Giardina, do Bichara Advogados, mostra que “o assunto não está tão pacífico quanto se imaginava”. “Se fosse só reafirmação de jurisprudência, prevaleceria a posição do ministro Mauro Campbell Marques”, diz.
Fonte: Valor Econômico- 24/3/2015-
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