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SP adota mediação em processos de recuperação

Credores de empresas em recuperação judicial terão a chance de se manifestar sobre o processo, por meio de audiências de mediação, antes de o plano de pagamento ser colocado em votação. Essa é uma iniciativa que está sendo desenvolvida em São Paulo, pela 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais, e tem como objetivo tornar os processos mais democráticos e eficientes.

A Saraiva, maior rede de livrarias do país, será a estreante na modalidade. Os mais de mil credores da empresa – que está em processo recuperação desde novembro do ano passado – estão sendo convidados a participar de uma sessão de mediação marcada para a próxima terça-feira em um hotel na capital paulista.

Será um primeiro encontro, dirigido pelo administrador judicial, mas sem a presença de representantes da companhia. Ele vai coletar as informações e entregá-las à Saraiva, antes da apresentação do plano de pagamento.

Tendo acesso a esses dados, a empresa poderá, já na primeira proposta, conciliar os interesses dos credores com a sua capacidade financeira. O plano deve ser apresentado no dia 4 de fevereiro. Depois da data, uma nova rodada de conversas deve ocorrer, mas dessa vez com a participação tanto dos credores como da devedora.

“A mediação cria mais um caminho de negociação e conversa entre as partes. Pode ser que una tanto os pontos que quando chegar a assembleia o negócio seja meramente homologatório”, diz Ronaldo Vasconcelos, sócio do Lucon Advogados e que atua como administrador judicial no processo da Saraiva.

Pelo trâmite normal do processo, sem a mediação, isso raramente ocorre. A lei que regula esses procedimentos (nº 11.101, de 2005) determina que a assembleia-geral – evento em que se coloca o plano da devedora em votação – deve ocorrer até seis meses após o início do processo e o clima não costuma ser muito amistoso.

Isso porque os planos geralmente preveem descontos, prazos de carência e parcelamento dos valores devidos pela empresa. As assembleias costumam se estender por horas, dias às vezes, e são passíveis, inclusive, de pedidos de suspensão.

O uso de técnicas tanto de mediação como de conciliação já foi usado em processos de recuperação, mas em situações específicas. A Justiça do Rio de Janeiro determinou, no caso da Oi, por exemplo, o procedimento da mediação em uma discussão sobre as multas aplicadas à companhia pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Havia divergência entre as partes em relação aos valores estarem ou não sujeitos à recuperação judicial.

No processo da Oi também ocorreu uma mediação entre a companhia e os credores com valores de até R$ 50 mil a receber. Já em São Paulo, recentemente, foi feita uma audiência de conciliação entre a Avianca, que entrou com o pedido de recuperação no mês de dezembro, e arrendadores de aeronaves que tentavam retomar parte da frota da companhia.

O que a 2ª Vara da Capital paulista está propondo, no entanto, é algo mais abrangente. A mediação será usada de forma coletiva, a todos os credores envolvidos no processo, e para tratar do plano como um todo. Quem custeará o serviço no caso da Saraiva, por exemplo – que contará com mediadores profissionais de duas empresas diferentes – será o administrador judicial.

“Fazer com que o credor e o devedor consigam conversar e chegar a uma solução consensual é muito melhor do que o juiz ter que decidir de forma impositiva”, diz o juiz Paulo Furtado, titular da 2ª Vara e idealizador da proposta.

O que se espera, ele complementa, é que as audiências de mediação tenham como resultado o melhor plano de pagamento que a devedora possa oferecer aos credores. Além de facilitar a aprovação, na assembleia-geral, tende a evitar contestações futuras no Judiciário.

Paulo Furtado afirma, no entanto, que as audiências de mediação não serão aplicadas a todo e qualquer processo de recuperação. Vai depender do caso. “Temos que verificar se é possível e se pode ser eficaz”, frisa o juiz. Será levado em conta, por exemplo, se os credores e a devedora têm mais interesses em comum do que divergências.

A Saraiva tem na sua lista de credores uma quantidade expressiva de fornecedores. Essa condição, aos olhos do juiz e do administrador judicial, a torna “o caso perfeito” para o uso das técnicas de mediação. “Para os credores é muito ruim que o negócio deixe de existir. A Saraiva responde por cerca de 30% das vendas de livros no país. Sem ela as editoras, por exemplo, teriam dificuldade para escoar as suas produções”, diz Ronaldo Vasconcelos.

O uso da mediação está também previsto para questões específicas do processo da Saraiva. Uma das discussões em que o procedimento deve ser aplicado é a que trata da venda consignada de livros. Não está claro no processo ainda quanto isso representa em valores.

A Saraiva entrou com o pedido de recuperação judicial em novembro do ano passado para reestruturar uma dívida de quase R$ 700 milhões. Foram registrados, até agora, 1,2 mil credores, mas é possível que esse número aumente. Os maiores são o Banco do Brasil, que tem crédito de R$ 90,7 milhões, e o BNDES, com R$ 41,7 milhões a receber. Com esses credores, segundo afirmam fontes que acompanham a tramitação do processo, a empresa já estaria negociando.

Advogados da área ainda não têm uma opinião formada sobre as audiências de mediação, no modelo como pretende implantar a 2ª Vara de São Paulo, porque trata-se de algo inédito. Se der certo, afirmam especialistas ouvidos pelo Valor, “pode ajudar bastante no processo”.

Há o receio, entre aqueles que advogam para devedoras, no entanto, de que se a empresa não conseguir atender a vontade dos credores possa haver frustração e isso acabe complicando o relacionamento com a devedora e, consequentemente, prejudicando o processo. “As negociações são sempre muito complexas nas recuperações judiciais. Então tem que tomar cuidado para que isso não se torne um complicador”, pondera um advogado.

A Saraiva informou que vê de forma positiva a iniciativa do administrador judicial e juízo da recuperação. “Acreditamos que o diálogo aberto com nossos fornecedores é um dos pilares para o sucesso da nossa reestruturação”.

Fonte: Valor Econômico- 24/1/2019-

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