Aparentemente favorável à indústria, a proposta de reforma do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), mencionada pela presidente Dilma Rousseff na primeira reunião ministerial do seu segundo mandato, preocupa o setor de comércio e serviços.
O discurso de Dilma trouxe novamente à tona o receio de entidades que representam os dois segmentos de que a alíquota do PIS e da Cofins seja uniformizada a 9,25% sobre o faturamento. Segundo estudos já existentes, isso elevaria em 104%, em média, a carga tributária das empresas de serviços com as duas contribuições.
Os cálculos apontam ainda para uma alta de 4,3% dos preços no setor, o que elevaria em 0,6 ponto percentual a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Os dados foram reunidos em estudo encomendado pela Fenacon, entidade que reúne empresas de contabilidade, ao Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT).
Ao mencionar uma reforma de PIS e Cofins em seu discurso, a presidente Dilma salientou que a mudança aconteceria “para simplificar o aproveitamento de crédito tributário”. A facilitação do uso de créditos, com a adoção do chamado crédito financeiro, é um pleito da indústria. A principal crítica das indústrias é que no sistema de cálculo não cumulativo de PIS-Cofins, no qual a alíquota é de 9,25%, muitas aquisições não dão direito a crédito para abater do recolhimento das duas contribuições.
Atualmente, porém, boa parte das empresas de comércio e serviços paga a alíquota de PIS-Cofins de 3,65% sobre o faturamento, num sistema cumulativo, que não dá direito a créditos. Como representantes do governo, em ocasiões anteriores, sinalizaram a unificação dos dois tributos, esses segmentos temem que a reforma os obrigue ao sistema de recolhimento não cumulativo, com alíquota maior, de 9,25%.
Nesse caso, como praticamente não possuem créditos de PIS e Cofins, os dois setores sofreriam o impacto quase que integral do aumento de alíquota, diz Valdir Pietrobon, diretor político e parlamentar da Fenacon. Segundo ele, o levantamento pedido pela entidade mostra que a alíquota de equilíbrio para o setor de serviços – na migração do sistema atual de pagamento de PIS-Cofins para uma forma de cálculo que dê direito a créditos – seria de 3,9%. Fontes da Receita Federal dizem que ainda não há definição para a mudança das duas contribuições.
Caso a alíquota das duas contribuições seja uniformizada a 9,25% para todos, o impacto será de R$ 32,5 bilhões em carga tributária adicional ao ano para o setor de serviços. Responsáveis por uma arrecadação de R$ 253,72 bilhões no ano passado, PIS e Cofins representam 21,5% do total da receita tributária federal.
A Fenacon, porém, defende que, mesmo com a reforma mencionada por Dilma, as empresas tenham opção de se manter no cálculo cumulativo atual, com alíquota de 3,65%. Romeu Camargo, assessor jurídico da FecomercioSP, que reúne as empresas de varejo, concorda.
“Caso não seja dada a oportunidade de permanecer no atual sistema de recolhimento, o comércio será altamente onerado.” Camargo destaca que, tanto no setor de serviços como no comércio, o principal desembolso é com mão de obra. “Mas essa despesa não é admitida como insumo e não gera crédito de PIS e Cofins. O que as empresas desses setores têm para gerar crédito é muito pequeno.” No setor de serviços, diz Pietrobon, a mão de obra representa mais de 50% dos custos. Na indústria a despesa fica em 20%.
Segundo o estudo do IBPT, um sistema não cumulativo, que dá amplo direito a créditos, tende a ser mais vantajoso para o setor manufatureiro.
Nas indústrias, a lista de custos e despesas que podem gerar créditos tributários a serem deduzidos da carga de PIS-Cofins equivale a 42% da composição média dos preços. Para o setor de serviços, a fatia cai para 12,5%.
“Tanto no comércio quanto na indústria o que gera crédito é pouco representativo. São insumos como energia elétrica e frete, por exemplo”, diz Camargo. O levantamento do IBPT analisou amostra de 1.257 prestadoras de serviços.
Everardo Maciel, sócio da Logus Consultoria e ex-secretário da Receita Federal, diz que o receio do setor de comércio e serviços é procedente.
Ele lembra que atualmente há uma discussão interminável sobre o que dá direito, ou não, a crédito de PIS-Cofins. “Isso se deve à miríade de regras especiais e também à interpretação da Receita de que a definição sobre a natureza do insumo segue a aplicada para o cálculo do IPI”, diz, referindo-se ao Imposto sobre Produtos Industrializados.
Com isso, explica, há uma interpretação que restringe os insumos e despesas que podem dar origem a créditos.
A complexidade do PIS-Cofins, porém, argumenta Maciel, se refere ao cálculo não cumulativo das duas contribuições, no qual se aplica a alíquota dos 9,25%. O sistema cumulativo, diz, usado por grande parte do setor de comércio e serviços, “é um sistema simples que não traz problema algum”. Para ele, um sistema não cumulativo, mesmo com ampliação das possibilidades de uso de crédito, como pleiteia a indústria, pode coexistir com o sistema cumulativo já utilizado hoje por grande parte das empresas de comércio e serviços.
Júlio de Oliveira, sócio do Machado Associados, lembra que as formas de recolhimento de PIS-Cofins estão, na regra geral, relacionadas à sistemática de pagamento do Imposto de Renda. As grandes empresas que optam pelo lucro real pagam as duas contribuições pelo sistema não cumulativo, que admite créditos, com alíquota de 9,25%. As empresas menores costumam optar pelo lucro presumido, no qual o PIS e a Cofins são calculados a 3,65% sobre o faturamento, sem créditos.
Do lado do contribuinte, o grande receio é que qualquer mudança nos dois tributos resulte em elevação de carga tributária. “O governo federal tem tentado conseguir resultados quase sempre elevando as receitas e não cortando despesas”, diz Oliveira. Ele lembra que a desconfiança de que o objetivo não é a simplificação, e sim a elevação de arrecadação, tem razão de ser. A última grande mudança nas duas contribuições aconteceu em 2003, no PIS, e em 2004, na Cofins, quando foi instituído o cálculo não cumulativo hoje criticado pelas empresas.
Na época, afirma Oliveira, houve grande elevação de carga tributária.
Segundo dados da Receita, de 2003 para 2004 o recolhimento da Cofins cresceu 25% em termos reais, enquanto a arrecadação total administrada pelo órgão aumentou em 10,2%. O recolhimento do PIS de 2002 para 2003 teve alta real de 17,4% enquanto a arrecadação total no mesmo período encolheu 2,6%.
Fonte- Valor Econômico- 13/2/2015- https://www1.fazenda.gov.br/resenhaeletronica/