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Projeto do Executivo autoriza Fisco a pedir falência em recuperação judicial

O Poder Executivo encaminhou um Projeto de Lei ao Congresso Nacional em maio de 2018 que poderá tornar a Fazenda Pública um dos principais credores nos processos de Recuperação Judicial, caso o texto original seja aprovado. A proposta prevê ainda mais poder ao Fisco quando o autoriza a pedir falência da empresa quando não houver o pagamento das dívidas renegociadas. Essa participação do Executivo precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional por meio do projeto número 10.220, de 2018, que tramita apensado a outras propostas na Comissão de Finanças e Tributos da Câmara.

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), assinou ato de criação de uma comissão especial para analisar o teor da matéria e deu prosseguimento para tramitar em mais três comissões. “Por oportuno, determino que CTASP também se manifeste sobre o mérito da matéria. Em razão da distribuição a mais de três comissões de mérito, determino a criação de Comissão Especial para analisar a matéria, conforme o inciso II do art. 34 do RICD. Proposição Sujeita à Apreciação do Plenário. Regime de Tramitação: Prioridade (Art. 151, II, Regimento Interno da Câmara dos Deputados)”, diz o último despacho de Rodrigo Maia em 18 de maio. Mas a última movimentação da proposta foi em plenário recebendo mais dois projetos para serem apensados em 27 de novembro.

A matéria foi enviada ao Congresso pelo ex-ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, com foco em desburocratizar várias etapas do processo. “Hoje, demora-se cerca de dez anos para uma empresa sair de uma recuperação ou ser decretada a sua falência. Queremos reduzir isso para quatro anos. Esse projeto facilita a retomada econômica das empresas em dificuldade. Com isso, aumentará a oferta de crédito para empresas nessa situação. Claro, com a aprovação de todos os credores, que poderão recorrer a financiamentos para investimento. Com a nova lei, esperamos mais segurança jurídica nos contratos. É importante que preservemos o bom funcionamento de crédito no País. Não podemos diminuir oferta de crédito [para as empresas]”, explicou Meirelles em entrevista coletiva após o evento da TMA Brasil, em novembro.

O item mais polêmico é o que autoriza a Fazenda a requerer falência da empresa em processo de recuperação por meio de órgãos como a Advocacia Geral da União. As entidades de recolhimento de impostos não participavam do processo de recuperação, apenas executavam e penhoravam os bens do devedor. A reportagem entrou em contato com a Procuradoria da Fazenda Nacional em Goiás para falar sobre a proposta, mas não houve retorno.

“A Seção IV do Capítulo V, que versa sobre o procedimento para a decretação da falência, foi atualizada para estipular que as Fazendas Públicas poderão requerer a falência do devedor em processo de recuperação judicial ou durante o cumprimento do plano de recuperação judicial. O projeto também atualiza as determinações decorrentes da sentença que decretar a falência, como a anotação da falência do devedor pelo Registro Público de Empresas e pela Receita Federal do Brasil para que conste a expressão ‘Falido’ e a data da decretação da falência. Este procedimento aumenta a transparência do processo”, diz o trecho do texto de 65 páginas, atualmente questionado por juristas.

O primeiro projeto apresentado pelo Ministério da Fazenda não continha esse item, acrescentado depois pela Procuradoria da Fazenda Nacional, como explica o professor adjunto da Universidade Federal de Goiás e especialista em Recuperação Judicial e Falência, Álvaro Mariano. “A proteção da Fazenda pública tende a frustrar a ideia de proteção que a empresa em recuperação busca. A possibilidade de a Fazenda pública pedir falência de uma empresa dá um grande poder que já existe na Lei de Execuções Fiscais.” O professor acrescenta que o Fisco pouco participa da atual legislação por existir a Lei de Execuções Fiscais.

Quanto ao item que dá mais um poder ao juiz de transformar em falência quando for identificado esvaziamento patrimonial durante o processo, Álvaro Mariano avalia que esse “abuso de direito já está previsto na lei vigente com o afastamento do proprietário do comando da empresa, o que é frequente”. “A legislação vigente já imputa ao administrador judicial a função de procurador de Fazenda, no sentido de que se a empresa em recuperação não pagar os tributos, por exemplo, ele tem poder para pedir falência.”

O projeto do Executivo também propõe alterar parcialmente a ordem de pagamento dos créditos na falência. A ordem de preferência proposta é: 1) os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 salários-mínimos por credor, e os decorrentes de acidentes de trabalho; 2) os créditos gravados com direito real de garantia; 3) créditos das Fazendas Públicas, independentemente da sua natureza e tempo de constituição, excetuados os créditos extraconcursais e as multas tributárias; 4) os demais créditos das Fazendas Públicas inscritos em Dívida Ativa; 5) créditos quirografários; 6) multas contratuais e penas pecuniárias, inclusive multas tributárias; 7) créditos subordinados; e 8) juros vencidos após a decretação da falência. Os itens 1 e 2 mantiveram a ordem de prioridade estabelecida na Lei atual. Os créditos quirografários foram equiparados aos créditos com privilégio especial ou com privilégio geral.

A Lei de Recuperação Judicial e Falência fez parte da primeira série de microrreformas econômicas do primeiro mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003 a 2007) para fomentar a economia nacional.

Leilões a qualquer preço

Outra atualização importante diz respeito ao preço praticado nos leilões: 1) em primeira chamada, pelo valor de avaliação do bem; 2) em segunda chamada, dentro de 15 dias contados da primeira, por 50% do valor de avaliação; e 3) em terceira chamada, dentro de 15 dias contados da segunda, por qualquer preço. Este regramento é importante, pois atualmente há casos onde o processo alonga-se indevidamente em função do administrador judicial precisar aguardar condições de mercado mais favoráveis para vender os ativos por um preço considerado justo.

A Seção II do Capítulo V da Lei de Recuperações Judiciais e Falência, no que se refere à classificação dos créditos na falência, tem apenas dois artigos: um que trata da ordem de pagamentos na falência e outro que dispõe sobre os créditos extraconcursais, aqueles que têm preferência aos créditos na falência.

Apenas em Goiás, o Fisco teria cerca de R$ 5 bilhões

Se a modificação na Lei estivesse em vigor, o Fisco recuperaria cerca de R$ 5 bilhões de empresas goianas em recuperação ou teria pedido a falência das mesmas. Apenas o grupo Odilon Santos deve cerca de R$ 1 bilhão no mercado, entre créditos trabalhistas, Fazendas federal, estadual e municipal, credores reais e empréstimos bancários.

O restaurante Piquiras acumulou dívidas de R$ 20 milhões quando decidiu optar pela recuperação judicial e o Kabanas chegou em R$ 7 milhões de passivos, principalmente com empréstimos bancários. A empresa Stemac, de geradores de energia, está entre os casos mais emblemáticos de recuperação judicial em Goiás, ao analisar o valor dos passivos: R$ 650 milhões.

A JJZ Alimentos, que controla um frigorífico entre os principais negócios, amontoava dívidas de R$ 30 milhões e 1,2 milhão de euros com credores no exterior. A construtora goiana Encol, falida em 1999, possuía dívida de R$ 1 bilhão. A falência prejudicou 23 mil funcionários e 42 mil clientes após pagar apenas alguns créditos trabalhistas.

Esvaziamento patrimonial será motivo para decretar falência

O projeto adiciona ainda dois novos motivos para que o juiz transforme o processo de recuperação judicial em falência: quando identificado esvaziamento patrimonial da devedora que implique em liquidação da empresa durante o processo de recuperação judicial e por descumprimento dos créditos parcelados juntos às Fazendas Públicas.

Outros pontos relevantes do projeto

A) o local da sede da empresa é o juízo competente para homologar o plano de recuperação ou a falência;

B) o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) dará ampla divulgação sobre decisões referentes a falência, recuperação judicial e extrajudicial;

C) o CNJ apresentará plano de implementação de varas especializadas, com competência regional, para tratar de assuntos falimentares e de recuperação empresarial;

D) o Ministério Público e a Advocacia Pública poderão participar nos processos de falência, recuperação judicial e extrajudicial;

E) o prazo para uma nova recuperação judicial é reduzido de 5 para 2 anos;

F) a Receita Federal e as secretarias da Fazenda poderão requerer a falência do devedor;

G) pode ser colocado em votação um plano proposto pelos credores, mesmo que não conte com a concordância do devedor;

H) os patrimônios de afetação constituídos pela empresa não se submetem aos efeitos da recuperação judicial.

Fonte- Clipping Fenacon- 21/1/2019- https://www.jornalopcao.com.br/reportagens/projeto-do-executivo-autoriza-fisco-a-pedir-falencia-em-recuperacao-judicial-159121/

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