Deslocando-o do capítulo atinente às provas do Código de Processo Civil revogado, o novel diploma processual estabelece no artigo 361, inserido entre as normas disciplinadoras do procedimento da audiência de instrução e julgamento, a ordem para a produção da prova oral, procurando otimizar o aproveitamento das declarações para o esclarecimento dos fatos.
Verifica-se claramente que tal determinação guarda coerência com a estrutura dialética do processo contencioso, cabendo ao autor a ofensiva e ao réu a defesa, no tocante à prova dos fatos, em perfeita sintonia com a regra do subsequente artigo 373, vale dizer, ao autor incumbe a prova dos fatos constitutivos do seu direito, e, ao réu, em imediata sequência, a prova dos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor.
Importa frisar que o preceito em apreço, parcialmente repetido no artigo 456 do Código de Processo Civil em vigor, refere-se a uma ordem preferencial, embora não cogente, porque nada obsta a que as partes, de comum acordo, modifiquem-na, por mera conveniência ou por qualquer outra razão circunstancial, visando sobretudo a evitar o adiamento da audiência (artigo 456, parágrafo único). Tudo dependerá da relação entre o depoimento da testemunha e o fato probando, que pode ser colhido em sequência diferente àquela predeterminada, desde que o litigante, que consentiu com a alteração, entenda que não sofrerá prejuízo.
A esse respeito, mesmo sob a égide do código revogado, a jurisprudência vinha se escudando no princípio da razoabilidade, deixando de anular o processo quando ocorrida a aludida inversão da ordem de oitiva de testemunhas, desde que não evidenciado qualquer prejuízo, como se infere de julgamento da 11ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, na Apelação 9184245-18.2008.8.26.0000, da relatoria do desembargador Airton Pinheiro de Castro.
Abonando esse posicionamento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial 249.673-RS, relatado pelo ministro Sidnei Beneti, asseverou que: “A inversão na ordem da oitiva das testemunhas não acarretou prejuízo à defesa do agravante, razão pela qual, ausente a prova de efetivo prejuízo, não merece reforma o aresto recorrido quanto ao tema” (DJe 28/2/2013).
Acrescente-se que o artigo 139, inciso VI, do Código de Processo Civil autoriza o juiz a “dilatar os prazos e alterar a ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de modo a conferir maior efetividade à tutela do direito”, por meio de decisão devidamente fundamentada.
Recomenda-se que, no início da produção da prova oral, segundo o artigo 357, inciso II, o juiz se reporte às questões de fato, sobre as quais deverá girar a instrução, que foram fixadas na decisão de saneamento.
Nos casos em que houve produção de prova pericial, como já foi ela realizada, serão ouvidos na referida audiência, primeiramente, o perito e os respectivos assistentes técnicos, a requerimento das partes, a respeito dos quesitos suplementares, caso não respondidos ou respondidos, por escrito, de forma insatisfatória (artigo 361, inciso I). Nessa hipótese, deverão ser intimados por meio eletrônico, com antecedência mínima de 10 dias, na forma do artigo 477, parágrafos 3º e 4º, do Código de Processo Civil, para que compareçam à audiência de instrução e julgamento.
Se todos eles forem intimados, após os esclarecimentos do perito, serão ouvidos o assistente técnico indicado pelo autor e, em seguida, aquele indicado pelo réu. Poderão eles reproduzir oralmente respostas trazidas por escrito.
Passa-se então à colheita do depoimento pessoal do autor, que necessariamente deve ter sido intimado para tal finalidade (artigos 361, inciso II, e 385, parágrafo 1º). Se houver litisconsórcio ativo, caberá ao réu eleger qual deles deve depor em primeiro lugar. Após o depoimento do autor, tomado sem a presença dos outros litigantes que ainda não depuseram (artigo 385, parágrafo 2º), passa-se à oitiva, se houver, do outro litisconsorte e, em seguida, do réu, observando-se a mesma ordem.
Serão inquiridas, em imediata sequência, as testemunhas arroladas pelo autor, na ordem por ele escolhida, e, em seguida, aquelas arroladas pelo réu (artigo 361, inciso III). Deverão ser elas ouvidas separadamente, cuidando-se para que uma não assista ao depoimento da outra (artigo 456).
Tenha-se presente que, determinada diferente distribuição do ônus da prova, ao ensejo da decisão de saneamento e organização do processo (artigo 357, inciso III, do Código de Processo Civil), o juiz deverá igualmente inverter a ordem de inquirição das testemunhas, ouvindo as do réu e, em seguida, aquelas arroladas pelo autor.
Dispõe ainda o parágrafo único do artigo 361 que, durante o depoimento de todas as pessoas acima referidas, certamente para evitar tumulto, os advogados e o representante do Ministério Público não poderão intervir ou apartear sem permissão do juiz.
Frise-se que entre as prerrogativas do exercício profissional do advogado, consoante dispõe o artigo 7º, inciso X, da Lei 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia), encontra-se a de “usar da palavra, pela ordem, em qualquer juízo ou tribunal, mediante intervenção sumária, para esclarecer equívoco ou dúvida surgida em relação a fatos, documentos ou afirmações que influam no julgamento, bem como para replicar acusação ou censura que lhe forem feitas”.
Todavia, deverá exercê-la, quando reputar pertinente, após a autorização do juiz, de forma serena, cordata e em tom de voz condizente.
Ademais, norteadas pelo princípio da cooperação, tão prestigiado pelo novo estatuto processual, as partes deverão envidar todo o esforço para evitar o adiamento da audiência de instrução e julgamento. Nesse sentido, devem elas por meio de seu advogado diligenciar junto à escrivania para que sejam expedidas as cartas de intimação a tempo de chegarem ao seu destino antes da data aprazada para a realização do mencionado ato processual.
Na verdade, excluindo-se a hipótese de ser provocado pelo requerimento conjunto das partes, o adiamento da audiência, que embaraça a marcha normal do processo, somente se justifica em circunstâncias excepcionais, inesperadas, que acabam impondo a redesignação daquele ato (cf. artigo 362 do Código de Processo Civil).
José Rogério Cruz e Tucci é professor titular e diretor da Faculdade de Direito da USP e membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas.
Fonte- http://www.conjur.com.br/2017-ago-08/paradoxo-corte-producao-prova-oral-nonovo-codigo-processo-civil