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Procurador pretende alterar gestão da dívida ativa

Nomeado procurador-chefe da Fazenda Nacional em dezembro, quando Nelson Barbosa assumiu o Ministério da Fazenda, Fabrício da Soller, 41 anos, enfrenta o desafio de chefiar a procuradoria num contexto de quedas sucessivas de arrecadação federal e do gradual retorno à normalidade dos trabalhos, após a paralisação de diversas atividades no ano passado em razão da insatisfação de servidores com a carreira. “Já tivemos momentos muito difíceis desde que estou na PGFN [Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional], mas enfrentamos agora um duplo desafio: temos a conjuntura econômica e política do país, o que não passa despercebido por ninguém e tem seu reflexo em toda a sociedade e órgãos públicos”, disse.

Há 18 anos na PGFN, o catarinense começou sua carreira na procuradoria regional em Brasília e foi coordenador da representação judicial, adjunto de consultoria e contencioso e procurador-geral substituto, sob o comando dos ministros Antonio Palocci, Guido Mantega e Joaquim Levy. Nessa jornada, é reconhecido por ser um procurador arrojado. Foi ele quem esteve à frente do projeto que criou um “acompanhamento especial” para teses e processos judiciais de maior relevância para a União.

Agora, no comando da PGFN, pretende melhorar a gestão da dívida ativa – que alcançou R$ 1,58 trilhão -, deixando de lado os créditos “irrecuperáveis”. “Temos um número muito grande de empresas que já encerraram suas atividades ou não têm patrimônio para responder por esses créditos”, disse o procurador-chefe em entrevista ao Valor no Ministério da Fazenda, em Brasília. A seguir, os principais trechos da conversa:

Valor: Há mais pressão sobre a PGFN em um momento como esse, de crise?

Fabrício da Soller : Sim. A procuradoria não é uma ilha. Ainda quando o ministro Joaquim Levy estava aqui, já havia uma preocupação em se buscar alternativas para um incremento na arrecadação da dívida ativa, para uma melhor atuação na representação judicial. De 2015 para cá, a conjuntura não facilitou. A situação foi se agravando. As quedas de arrecadação mostram isso. Você tem uma queda de receitas que é superior, inclusive, à redução da atividade econômica. Não só reflete a redução da atividade econômica, mas também um algo a mais. Deve haver empresas que, na dificuldade, estão deixando de fazer o recolhimento dos tributos. Isso vai bater obviamente depois na dívida ativa da União. Já tivemos momentos muito difíceis desde que estou na PGFN, mas enfrentamos agora um duplo desafio: temos a conjuntura econômica e política do país, o que não passa despercebido por ninguém e tem seu reflexo em toda a sociedade e órgãos públicos.

Valor: Foi estabelecido um percentual de recuperação da dívida ativa?

Soller : Não estabelecemos o quanto queremos arrecadar [recuperação de créditos] com a dívida ativa da União. Num momento como esse, com a arrecadação em queda e a necessidade de cumprir a lei de responsabilidade fiscal e atingir o superávit primário estabelecido na lei de diretrizes orçamentárias, você tem um esforço em todas as áreas do Ministério da Fazenda. Da nossa parte, quando você olha para o estoque da dívida ativa e vê R$ 1,58 trilhão [dado de dezembro], imaginamos como recuperar uma parcela maior e chegamos na questão de mudar a nossa sistemática de trabalho. Muitos créditos são irrecuperáveis. Temos um número muito grande de empresas que já encerraram suas atividades ou não têm patrimônio para responder por esses créditos. O que temos pensado em fazer é dizer que esse crédito é irrecuperável, deixá-lo de lado, e buscar outros meios de cobrança administrativa [do que é recuperável].

Valor: Quais processos de interesse da PGFN podem ser julgados este ano pelo Supremo Tribunal Federal (STF)?

Soller Mais de 700 processos podem entrar na pauta a qualquer momento. E quando você lembra que na época do julgamento do mensalão não se fez outra coisa, pensa-se que hoje também pode ocorrer o mesmo. Não pedimos nada ainda [aos ministros]. Mas é muito relevante quando vemos o STF julgando a Lei Complementar nº 105 [sobre sigilo]. Não pedimos para pautar, mas foi importante que tenham julgado, porque havia uma decisão do Plenário do Supremo, de 2010, sem repercussão geral, que estava causando um prejuízo grande para a administração tributária. Juízes citavam a decisão para impedir o Fisco de ter acesso aos dados. Será importante para a estabilização tributária se, dentro do possível, o STF julgar causas fiscais este ano.

“Com a transação tributária, pode-se criar um estímulo para o contribuinte se tornar inadimplente”

Valor: O projeto de lei que regulamentaria a transação tributária, que é a possibilidade de acordo entre o contribuinte inadimplente e o Fisco, está parado há anos. O que pensa sobre esse instrumento?

Soller : Creio que o projeto de transação não caminhou pela complexidade. Quando se fala em transação em matéria tributária, pode-se criar um estímulo para o contribuinte se tornar inadimplente, depois fazer um acordo e pagar menos do que o devido. É preciso ter cuidado para não desestimular a arrecadação corrente. É a mesma preocupação em relação a projetos que cedem a instituições financeiras a cobrança da dívida ativa. Não sou contra a ideia da transação, ela é prevista no CTN [Código Tributário Nacional] como forma de por fim ao crédito tributário. Mas em matéria tributária é muito complicado. Só para mencionar um aspecto: o princípio da isonomia. Em todos os parcelamentos especiais os contribuintes são tratados de forma igual, com os mesmos descontos em juros e multa. Por isso, teria que haver um arcabouço normativo que desse segurança jurídica à transação.

Valor: Qual o impacto da mobilização da advocacia pública por mudanças na carreira?

Soller : As pessoas expressaram isso com muita clareza no ano passado. Uma grande insatisfação que vem de uma discrepância. Quando você compara com outras funções essenciais à Justiça – como Ministério Público (MP) e Poder Judiciário -, você vê uma diferença muito grande de estrutura e remuneração. Um gap que eu nunca tinha observado, não com essa profundidade que se apresentou. Isso levou à paralisia de atividades na advocacia pública. Dentro da PGFN, perdemos pessoal nas áreas voltadas para grandes devedores e acompanhamento das ações mais relevantes. Isso teve seu preço. É um grande desafio assumir num momento em que nenhuma dessas insatisfações foi resolvida.

Valor: Houve alguma evolução em relação aos pleitos da categoria?

Soller : Foi encaminhado um projeto de lei ao Congresso em que se busca tratar dessas insatisfações em alguma medida. Não que ali se esteja tratando da mesma forma que o Judiciário e o MP. Mas se pegou um diferencial que a advocacia pública tem e é só dela. E que está consagrado agora no novo Código de Processo Civil (CPC), que é o dever de os honorários advocatícios serem destinados aos advogados públicos. Como está no Estatuto da OAB para qualquer advogado. E que as procuradorias regionais, estaduais e municipais, já tinham. O que esse projeto busca fazer é disciplinar a forma como esse direito será exercido. Além disso, uma pequena recomposição foi prevista, escalonada. Não digo que resolve por completo a insatisfação dos colegas, que é maior do que isso. Também temos uma função fundamental à Justiça. Defendemos todas as políticas públicas, o erário público, cobramos a dívida ativa e atuamos pela União em causas bilionárias. Sem isso, o Estado não se sustenta.

Valor: Algo foi feito para otimizar o trabalho dos profissionais?

Soller : Sim. Um outro projeto cria uma carreira estruturada de apoio administrativo no âmbito da Advocacia-Geral da União (AGU). Hoje em dia, o que usamos é um plano de cargos do Ministério da Fazenda, mas que também atende Receita e Secretaria do Tesouro, entre outros. Com uma carreira de apoio, poderíamos nos concentrar em fazer o que é mais relevante, mais valioso para a instituição. E não se perder em coisas que poderiam ser resolvidas por servidores administrativos.

Valor: Quais medidas que constam do novo CPC vão impactar a PGFN?

Soller : O principal ponto é o dos honorários. É inegável que é um grande estímulo para a advocacia privada e pública. E quem paga é a parte. Não é dinheiro público e [o mecanismo] vem auxiliar como elemento de eficiência, não é uma questão unicamente corporativa. É fácil imaginar que haverá um número muito maior de impugnações aos valores das causas. Mas o ganho é grande.

Fonte: Valor Econômico- 4/4/2016-
http://alfonsin.com.br/procurador-pretende-alterar-gesto-da-dvida-ativa/

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