O Tribunal Superior do Trabalho (TST) escolheu o primeiro tema a ser analisado como recurso repetitivo. Os ministros deverão decidir se cabe indenização por danos morais ao trabalhador obrigado a apresentar certidão de antecedentes criminais para ser contratado. Ainda não há data para o julgamento.
O assunto era controverso no TST até o fim do ano passado, quando a Subseção I de Dissídios Individuais (SDI-1) adotou o entendimento de que os empregadores podem solicitar o documento para admissão e que essa exigência não gera indenização por danos morais.
Agora, a SDI-1 – responsável por consolidar a jurisprudência – tem um ano para julgar os dois processos declarados como repetitivos no dia 26 de março. Nesse período, todos os outros recursos sobre o assunto no TST devem ficar paralisados à espera dessa decisão. Se não for julgado no prazo, o tema é desafetado como repetitivo e os processos poderão voltar a ser julgados.
A ferramenta, instituída pela Lei nº 13.015, de 2014, é semelhante à adotada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). O principal objetivo é desafogar o Judiciário.
Em 2014, segundo o presidente do TST, ministro Antonio José de Barros Levenhagen, o TST recebeu 309 mil processos cerca de 12% a mais do que em 2013. E julgou 284,5 mil ações, cerca de 12% a mais que no ano anterior. “Se continuarmos a julgar processo por processo não vamos conseguir reduzir o estoque, que ano a ano vem crescendo. Isso é uma bola de neve. A medida que o número de processos aumenta, por mais que nos esforcemos, sempre há um rescaldo”, diz o ministro.
Com o recurso repetitivo, de acordo com o ministro, será julgado um processo com tantos outros correlatos. “Depois disso, editaremos uma súmula, que valerá para todos os processos com matéria parecida”, afirma Levenhagen.
A Seção deverá analisar dois casos. Um deles envolve um recurso de um ex-trabalhador da AeC contra decisão do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da Paraíba, que negou indenização por danos morais pelo fato de a empresa ter exigido atestado de antecedentes criminais na sua contratação. O trabalhador alega que essa exigência fere a sua intimidade e dignidade e pede R$ 30 mil de indenização.
Em primeira instância, o pedido também havia sido negado. A juíza da 2ª Vara do Trabalho de Campina Grande (PB), Maria das Dores Alves, entendeu que, como o empregado apresentou certidão negativa de antecedentes criminais e foi admitido e mantido no emprego por mais de seis meses, “não há evidência de constrangimento real; não há indício de abalo moral concreto”. A decisão do TRT da Paraíba que manteve o entendimento foi unânime.
Outro caso envolve um recurso de um ex-trabalhador da Alpargatas contra decisão também do TRT de Paraíba, que manteve sentença a favor da empresa. O juiz Sérgio Cabral dos Reis da 4ª Vara do Trabalho de Campina Grande (PB) entendeu que a conduta da empresa é razoável e não implica desrespeito à dignidade e intimidade do trabalhador. “Em tempos de violência, como regra, é direito do contratante saber com quem está contratando, sendo a exigência das mais diversas espécies de certidões prática costumeira na realização dos negócios jurídicos”, diz na decisão. O posicionamento foi mantido por unanimidade na 2ª Turma do TRT.
Para o advogado trabalhista Fernando Lima Bosi, do Rayes & Fagundes Advogados Associados, que atua para bancos e empresas de segurança nesses processos, a tendência é que a SDI-1 mantenha o seu entendimento de que não é cabível a indenização por danos morais ao empregado apenas por exigir o atestado de antecedentes criminais. “Já existem decisões unânimes da SDI-1 nesse sentido, do fim de 2014 para cá”, afirma.
Os julgados contudo, segundo o advogado, fazem uma ressalva: incidiria indenização caso o candidato ao emprego fosse recusado ao apresentar o atestado com alguma condenação que nada tem a ver com a função que seria exercida. Por exemplo, um trabalhador condenado por não pagar pensão alimentícia aos filhos não poderia ser rejeitado para o cargo de jardineiro. “Nesses casos, haveria o pagamento de indenização”, diz Bosi.
De acordo com a advogada Andrea Pulici, sócia do escritório De Vivo, Whitaker e Castro Advogados, ao analisar o tema como repetitivo, os ministros deverão dar limites sobre as situações em que se pode admitir o pedido de atestado de antecedentes criminais. Para ela, há uma tendência a aceitar a exigência sem a incidência de danos morais para cargos que exigem confiança, em departamento financeiro, por exemplo.
Já as situações nas quais o trabalhador não foi admitido em consequência da apresentação do atestado, a indenização por danos morais deve ser confirmada. “Há juízes que entendem que, ainda que ele tenha sido condenado, já cumpriu sua pena, e não poderia, além ter sua intimidade invadida, ter sido preterido por isso”, diz Andrea.
Procurada pelo Valor, a assessoria de imprensa da AeC informou por nota que “as atribuições do cargo de atendente de telemarketing exigem conduta ilibada, já que os colaboradores que exercem determinadas funções têm acesso direto a informações sigilosas dos clientes”. A nota ainda acrescenta que “a empresa não tem a intenção de ofender a honra de nenhum funcionário, mas tem consciência do compromisso e do dever no trato das informações relativas aos clientes”. Já a assessoria de imprensa da Alpargatas informou por nota que a empresa não se manifesta sobre ações judiciais em andamento.
Fonte: Valor Econômico, por Adriana Aguiar e Beatriz Olivon, 01.04.2015; http://www.granadeiro.adv.br/template/template_clipping.php?Id=15706