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Prazos na recuperação judicial

A Lei de Recuperação Judicial e Falências (LRF) determina (art. 61) que o processo se estenderá até que se cumpram todas as obrigações previstas no plano que se vencerem até dois anos após a data da sentença que conceder a recuperação judicial. Esse prazo se convencionou denominar “período de fiscalização judicial”.

Entretanto, a LRF ao disciplinar o plano de recuperação judicial não determina expressamente que deva haver pagamento aos credores durante os dois anos iniciais. A única exceção diz respeito aos créditos trabalhistas em relação aos quais “não poderá haver prazo superior a um ano” (art. 54). Não há qualquer disposição a respeito do início para pagamento aos demais credores.

Os planos de recuperação judicial, que são livremente negociados entre recuperandas e credores, fixam as datas para que sejam iniciados os pagamentos. Em razão da necessidade de recomposição do capital de giro das empresas e, também, do pagamento dos créditos trabalhistas, as parcelas devidas aos demais credores tem início, na maioria deles, entre 18 e 24 meses após a data da concessão da recuperação judicial. Dessa forma, os planos de recuperação judicial, em geral, estipulam prazo de carência.

O prazo de fiscalização judicial e o prazo de carência são distintos e disciplinam questões diferentes

Portanto, há o “prazo de fiscalização judicial” – determinado na Lei – e o “prazo de carência” – previsto no “plano de recuperação judicial”, e debatido e aprovado na assembleia-geral de credores.

Esses prazos são distintos seja na origem – determinação legal ou negociação no “plano” ou na matéria disciplinada – fiscalização judicial ou início de pagamento aos credores.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) firmou jurisprudência afirmando que o “prazo de carência” não pode ser superior ao “prazo de fiscalização judicial”.

Essa interpretação se iniciou no julgamento do caso Giokotu (Agv. De Instrumento nº 0136362-29.2011.8.26.0000-TJSP). Nesse acórdão, da lavra do festejado comercialista e desembargador Pereira Calças, em razão de inúmeras ilegalidades no “plano” foi anulada a deliberação da assembleia-geral de credores que o aprovou.
Dentre outros graves motivos, foi considerado ilegal o “prazo de carência” de 36. A partir desse acórdão o “prazo de carência”, na interpretação do tribunal paulista, deveria ser compatível com o “prazo de fiscalização judicial”.

Em acórdãos mais recentes a 2ª Câmara de Direito Empresarial do mesmo tribunal interpretou que o “prazo de fiscalização judicial” se iniciará após o término do “prazo de carência”, consignando que:

“Carência 18 meses. Supervisão judicial. A interpretação que melhor se ajusta ao quanto determinado na lei é admitir que o prazo de dois anos de observação judicial do cumprimento das obrigações contraídas com o plano de recuperação seja contado a partir do final da carência estabelecida. (Agv.Instrumento nºs 2081908-89.2016.8.26.0000-Rel. Des.C.A.Garbi)”

No mesmo sentido há decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo (Agv. de Instrumento nºs 2140328-87.2016.8.26.0000, 2102479-81.2016.8.26.0000 e 2171802-76.2016.8.26.0000). Em julgado recente, do mês de setembro, o acórdão admite haver “prazo de carência” de 36 meses, a partir do qual se iniciará o “prazo de fiscalização judicial” (Agv. de Instrumento nº 2097820-92.2017.8.26.0000). Embora nesse caso haja previsão de pagamentos para diversas classes de credores é o “maior” prazo de carência, de três anos para quirografários, que deverá ser considerado para iniciar o “prazo de fiscalização judicial”.

Entretanto, há de se considerar: que o prazo de “fiscalização judicial” decorre da lei e o de “carência” da convenção entre as partes na assembleia-geral de credores.

Disciplinam, portanto, questões diferentes que durante o “prazo de fiscalização judicial” competirá ao Judiciário, por meio do administrador judicial, acompanhar o cumprimento das medidas prevista para implementação do “plano de recuperação”. A fiscalização dos pagamentos – nos prazos fixados na assembleia-geral de credores – compete aos próprios credores; que não haverá prejuízo aos credores que, não efetuados os pagamentos nas datas aprazadas, terão os meios para cobrá-los, inclusive requerendo a falência da devedora inadimplente. No anteprojeto de alteração da Lei de Falências, em estudo no Ministério da Fazenda, o prazo de fiscalização judicial será excluído, encerrando-se o processo após a homologação do plano de recuperação e concessão da recuperação judicial.

Portanto, com fundamento nas considerações acima, ousamos discordar, com o máximo respeito aos fundamentos dos arestos citados, da tese de que os prazos de “fiscalização judicial” e “carência para início de pagamentos” devem ser harmonizados, entendendo que esses prazos são diversos e não há fundamento legal para justificar a necessidade de compatibilizá-los.

Renato Luiz de Macedo Mange é advogado especialista em reestruturação de empresas e sócio do Mange Advogados

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

Fonte: Valor Econômico- 30/11/2017-

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