Há pouco mais de seis meses, a Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Instrução Normativa (IN/RFB) nº 1.565/2015, que regulamenta as Leis 8.397/2002 e 9.532/1997, por meio da qual pretendeu-se aperfeiçoar os procedimentos relativos à constituição e à extinção de arrolamentos de bens e direitos para acompanhamento do patrimônio dos contribuintes, suscetível de ser indicado como garantia de débitos federais e para representação na propositura de medida cautelar fiscal.
Em comparação com a norma anterior, os pré-requisitos previstos na nova IN/RFB para constituição de arrolamentos não foram alterados. Como não houve mudança da legislação de regência sobre a matéria (Leis 8.397/2002 e 9.532/1997), que é a base legal para esse tipo de procedimento, a IN/RFB nº 1.565/2015 manteve o pressuposto fático que enseja a constituição do arrolamento. Ou seja, deverão ser arrolados os bens e direitos dos sujeitos passivos (contribuintes ou responsáveis) que possuem perante a Receita Federal débitos em valores que excedam, simultaneamente, 30% de seu patrimônio conhecido e R$ 2 milhões.
No entanto, por meio da IN/RFB 1.565, a Receita Federal promoveu, digamos, uma certa flexibilização da norma, no que diz respeito às hipóteses de cancelamento dos arrolamentos de bens. Isto porque, o artigo 9º, da instrução normativa, expressamente estabeleceu a possibilidade de o próprio contribuinte que alienar, transferir ou onerar bens ou direitos arrolados pleitear o cancelamento do arrolamento junto aos respectivos órgãos de registro público, o que antes não era possível.
A existência do arrolamento, em teoria, nunca poderia impedir a alienação, oneração ou a transferência de bens
Para tanto, a única exigência da IN é a apresentação de uma solicitação formal, acompanhada da prova do protocolo de comunicação à Receita Federal a respeito da alienação, transferência ou oneração, comunicação essa que, na forma do seu artigo 8º, também teve o respectivo procedimento simplificado.
De fato, a mera existência do arrolamento de bens, em teoria, nunca poderia impedir a alienação, oneração ou a transferência desses bens e direitos. Por outro lado, também é certo que, na prática, até a publicação da novel IN/RFB 1.565, os bens e direitos arrolados pelo Fisco eram de difícil negociação pelos contribuintes, em razão das diversas implicações operacionais que o arrolamento acarretava (e de certa forma ainda acarreta), sobretudo no que diz respeito ao tempo demandado para que as autoridades fiscais determinassem que os órgãos públicos de registro cancelassem o arrolamento.
Tal controle ficava nas mãos do próprio Fisco, fato que desencadeou o ingresso de várias medidas judiciais por parte dos contribuintes contra esses atos praticados pela Receita Federal, na maioria das vezes pelo rito específico do mandado de segurança, via processual mais célere e adequada para esse tipo de situação. Mediante ordem judicial liminar, rapidamente eram expedidos os ofícios aos referidos órgãos públicos para baixa do gravame de arrolamento nos bens dos contribuintes, permitindo-se a alienação e transferência a terceiros, de forma a evitar maiores prejuízos para os contribuintes.
Em que pese o relativo avanço trazido pela nova norma, em consonância com o princípio da eficiência que deve nortear a administração pública para também promover a desburocratização dos procedimentos relativos ao cancelamento dos arrolamentos de bens e direitos, cujo atendimento vem sendo obedecido ao menos por parte dos órgãos públicos, ainda assim não podemos dizer que a questão foi resolvida no âmbito fiscal.
Nesse sentido, mesmo após a edição da instrução normativa, não é raro nos depararmos com a desobediência por parte da própria Receita Federal aos seus termos e disposições. Em tais casos, ou seja, nas hipóteses em que há injustificada recusa do próprio Fisco ou dos órgãos públicos de registro dos bens e direitos em relação à aplicação da IN/RFB 1.565 para cancelamento do arrolamento, os contribuintes ainda são obrigados a lançar mão da via judicial para fazer valer o seu direito.
Por fim, é importante ressaltar que a IN/RFB nº 1.565/2015 também não se presta a permitir que os bens e direitos arrolados sejam indiscriminadamente alienados, transferidos ou onerados pelos contribuintes. Essa flexibilidade trazida pela norma, de fato, tem por objetivo viabilizar o cancelamento dos arrolamentos, desde que atendidos os requisitos legais. Todavia, a nova norma prevê, em contrapartida, a possibilidade de realização de novos arrolamentos e da propositura da medida cautelar fiscal, caso haja o descumprimento da respectiva legislação. Portanto, é recomendável que os pedidos de cancelamento de arrolamento sejam precedidos de uma melhor análise sobre sua viabilidade, para o fim de evitar consequências mais danosas aos contribuintes perante o Fisco.
Fonte: Valor Econômico- 1/3/2016-
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