Helena Abdo: ideal seria uso da tutela antecipada em caráter incidental
Uma empresa em recuperação judicial conseguiu decisão da Justiça Federal para bloquear valores que haviam sido depositados em juízo em um outro processo, de competência estadual – e na qual havia autorização para que o dinheiro fosse levantado pela parte contrária. O pedido da companhia foi deferido pela 2ª Vara Federal do Rio de Janeiro por meio de tutela em caráter antecedente.
O instrumento é uma das novidades do novo Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde março. Permite aos advogados agir de forma mais rápida para obter uma tutela antecipada (espécie de liminar). Isso porque demanda menos fundamentação sobre o caso. Só é submetido ao juiz o pedido de urgência, o mérito sequer é apresentado.
“É como se fosse a primeira metade de um processo”, diz a advogada Daniela Soares Domingues, do escritório Siqueira Castro. “Muito mais simples, tem duração menor e o juiz analisa com mais rapidez”, acrescenta.
O caso concreto trata unicamente do bloqueio dos valores depositados. A juíza Andrea de Araújo Peixoto, da 2ª Vara Federal, levou em consideração o fato de o dinheiro estar prestes a ser levantado. Ela destacou, em sua decisão, o risco de “perecimento do direito de recebimento do crédito” quando a empresa propuser a ação de cobrança.
A discussão envolve a empresa Superpesa, que está em recuperação judicial, e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Trata de contratos de locação de imóveis. A UFRJ ocupa um prédio da Superpesa que fica no bairro da Lapa, no Rio, onde funciona a Escola de Música. Já a Superpesa ocupa um terreno da universidade localizado no Parque Tecnológico, na Ilha do Fundão, zona norte da cidade. Além da troca de imóveis, estava prevista uma compensação de valores.
O conflito entre empresa e universidade se iniciou a partir de uma ação de reintegração de posse, pela UFRJ, para reaver o imóvel da Ilha do Fundão. O processo tramita na 6ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, apensado aos autos da recuperação da empresa. A Superpesa, desde então, deposita em juízo os valores referentes à locação do imóvel. O montante está, atualmente, em cerca de R$ 2 milhões.
A Superpesa ingressou com a tutela antecipada em caráter antecedente, na Justiça Federal, depois de o juiz da recuperação autorizar a universidade a levantar a quantia total depositada. O argumento foi o de que não estavam compensados os valores referentes à locação do imóvel onde funciona a Escola de Música. Por isso o pedido de bloqueio de parte do dinheiro – R$ 1 milhão aproximadamente.
“O objeto da nossa ação era impedir a UFRJ de levantar esses valores. Por isso nós fizemos essa medida preparatória para só depois entrar com a medida principal efetiva, que é a execução de título extrajudicial”, diz a representante da Superpesa no caso, a advogada Danielle Capistrano, do escritório Capistrano, Gameiro & Silveira.
Especialista na área, a advogada Helena Abdo, do escritório Souza Cescon, entende que o ideal, nesse caso, seria o uso da tutela antecipada em caráter incidental, que também é novidade do novo CPC. Porque, segundo ela, a medida incide em um processo já em curso – para proteger algo relacionado àquela ação.
No caso concreto, haveria duas possibilidades: ingressar com a medida na Justiça Estadual, onde os valores estão depositados, ou na Justiça Federal – porque a Superpesa tem ação de despejo relacionada ao prédio onde funciona a Escola de Música. “Já a tutela em caráter antecedente pressupõe que vai haver uma outra demanda, com um pedido principal relativo ao que foi decidido. E, no caso, é muito provável que o mesmo pedido já esteja contido em uma das duas ações já em curso”, diz a advogada.
Em nota, a Advocacia-Geral da União, que representa a UFRJ, informou que já recorreu da decisão. De acordo com o órgão, a dívida da Superpesa seria de R$ 3 milhões. E acrescentou que “a universidade deixou de repassar os valores referentes ao aluguel do prédio na Lapa, para fins de compensação”. A AGU também recorreu contra a instauração de processo na esfera federal.
Fonte: Valor Econômico- 17/11/2016-
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