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CPC nos Tribunais: O direito intertemporal e a fungibilidade do Recurso Especial e do Recurso Extraordinário

Por Rodrigo Becker Advogado da União. Mestre em Direito pela UnB. Ex-Procurador-Geral da União. Diretor da Escola Superior de Advocacia da OAB/DF. Professor da Pós-Graduação do IDP e da ENA. Membro da ABDPro (Associação Brasileira de Direito Processual). Membro-fundador da ABPC (Associação Brasiliense de Direito Processual Civil)

Por Victor Trigueiro Advogado da União, Diretor do Departamento de Acompanhamento Estratégico da Secretaria-Geral de Contencioso da Advocacia-Geral da União, Mestre em Direito pela UnB, Professor da Especialização em Processo Civil do IDP, IBG e Unyleya. Membro-fundador da ABPC (Associação Brasiliense de Direito Processual Civil). Ex Subprocurador-Geral da União

Dentre as inovações trazidas pelo novo Código de Processo Civil, merece destaque a criação do regime de fungibilidade entre o Recurso Especial e o Recurso Extraordinário, previsto no artigo. 1.032 e seguintes.

Para uma melhor elucidação sobre a questão, transcrevo os dispositivos:

Art. 1.032. Se o relator, no Superior Tribunal de Justiça, entender que o recurso especial versa sobre questão constitucional, deverá conceder prazo de 15 (quinze) dias para que o recorrente demonstre a existência de repercussão geral e se manifeste sobre a questão constitucional.

Parágrafo único. Cumprida a diligência de que trata o caput, o relator remeterá o recurso ao Supremo Tribunal Federal, que, em juízo de admissibilidade, poderá devolvê-lo ao Superior Tribunal de Justiça.

Art. 1.033. Se o Supremo Tribunal Federal considerar como reflexa a ofensa à Constituição afirmada no recurso extraordinário, por pressupor a revisão da interpretação de lei federal ou de tratado, remetê-lo-á ao Superior Tribunal de Justiça para julgamento como recurso especial.

Basicamente, o objetivo do legislador com a criação do referido regime foi inibir situação relativamente comum, sob a vigência do Código revogado, em que ambos os tribunais (STF e STJ) negavam conhecimento aos recursos extraordinário e especial interpostos. O Supremo Tribunal Federal o fazia sob o argumento de que a matéria seria infraconstitucional, ao passo que o Superior Tribunal de Justiça negava conhecimento ao RESP sob o argumento de que a matéria teria índole constitucional.

Estabelecia-se, assim, verdadeira negativa de jurisdição, impossibilitando o recorrente de ver a sua irresignação apreciada, quer seja sob o enfoque da Constituição Federal, quer seja sob o prisma infraconstitucional.

Pelo regime adotado no novo Código, uma vez negado seguimento a um Recurso Especial, sob o argumento de que a matéria é constitucional, caberá ao Superior Tribunal de Justiça remeter os autos ao Supremo Tribunal Federal, devendo antes oportunizar ao recorrente a possibilidade de complementar suas razões, apresentando inclusive a repercussão geral da questão constitucional.

De outro lado, uma vez negado seguimento ao Recurso Extraordinário, ao argumento de que o caso versa sobre questão infraconstitucional (ou ofensa reflexa), caberá ao STF remeter os autos ao STJ. Nesse particular, omitiu-se o Código quanto a necessidade de oportunizar a complementação das razões, providência que já vem sendo exigida pela doutrina[1]. Nesse sentido, o Enunciado nº 566 do Fórum Permanente de Processualistas Civis[2]

Pois bem. Estabelecido o quadro, cumpre-nos refletir sobre o aspecto temporal de aplicabilidade da fungibilidade entre os recursos excepcionais.

As opções variam de acordo com o fato considerado como gerador, para efeito de aplicação do regime: i) momento em que foi proferido o acórdão impugnado por recurso Especial ou Extraordinário; ii) momento em que foi interposto o recurso especial ou extraordinário; iii) momento em que foi negado seguimento ao RE ou RESP.

O STF, ao se deparar com o tema, optou pela tese consagrada no item “i”. Segundo a Corte Suprema, o regime de fungibilidade entre o Recurso Especial e Extraordinário não se aplica aos recursos regidos pelo Código de 1973 – assim entendidos os que impugnam acórdãos publicados antes de 18/03/2016, data em que entrou em vigor a nova codificação.

Transcrevo, a seguir, o julgamento proferido pelo STF sobre o tema:

EMENTA : PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INEXISTÊNCIA DE QUAISQUER DOS VÍCIOS DO ART. 1.022 DO CPC/2015. REDISCUSSÃO DE QUESTÕES DECIDIDAS. IMPOSSIBILIDADE. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015, ART. 1.033. INAPLICABILIDADE A RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS REGIDOS PELO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 (= ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO ANTES DE 18/3/2016).

1.O art. 1.033 do CPC/2015 (Se o Supremo Tribunal Federal considerar como reflexa a ofensa à Constituição afirmada no recurso extraordinário, por pressupor a revisão da interpretação de lei federal ou de tratado, remetê-lo-á ao Superior Tribunal de Justiça para julgamento como recurso especial) estabeleceu uma nova formatação para o recurso extraordinário.

2.Por essa razão, não se aplica a recursos extraordinários regidos pelo Código anterior, assim entendidos os que impugnam acórdão publicado antes de 18/3/2016, quando vigia a Lei 5.869/1973.

3.Embargos de declaração rejeitados. Rel. Ministro Teori Zavascki. (DJE 03/10/2016 – ATA Nº 147/2016. DJE nº 210, divulgado em 30/09/2016).

Com as devidas vênias, não nos parece ter andado bem neste ponto o Supremo Tribunal Federal, ao consagrar posição que revela um viés defensivo na sua jurisprudência.

Melhor seria se a Corte Suprema tivesse observado o princípio da primazia do julgamento de mérito, aplicado o regime de fungibilidade e determinado a remessa dos autos ao Superior Tribunal de Justiça, para julgamento do caso.

Nos parece razoável considerar que o momento adequado para aferição da aplicabilidade da fungibilidade seria aquele em que o Tribunal decide pela inadmissibilidade do recurso especial ou do recurso extraordinário. Nesse sentido, Fredie Didier Junior e Leonardo Carneiro Cunha[3] e o Enunciado nº 564 do Forum Permanente de Processualistas Civis[4].

Considerando que o CPC[5] trouxe como valor primordial a primazia do julgamento de mérito[6] e o princípio da cooperação, partimos do pressuposto de que qualquer medida que possa ser adotada no sentido de preservar a possibilidade de julgamento do mérito dos recursos deve ser prestigiada.

Nesse sentido, o regime previsto no artigo 1.032 e seguintes do CPC poderia ser aplicado a todo e qualquer recurso, independentemente da data em que a decisão foi proferida ou que o recurso foi interposto, desde que o juízo de admissibilidade no tribunal “ad quem” tenha sido feito sob a vigência do Novo Código de Processo Civil.

Estabelecida a orientação no STF, dificilmente haverá reversão do entendimento, de modo que deve-se considerar o posicionamento firmado no sentido de que o regime de fungibilidade apenas se aplicará a acórdãos proferidos já sob a vigência do Novo Código de Processo Civil.
—————
[1] Segundo a doutrina de Fredie Didier Junior e Leonardo Carneiro da Cunha, “caberá ao relator, à semelhança da regra decorrente do art. 1.032 (conversão do recurso especial em recurso extraordinário, determinar a intimação do recorrente para que adapte o seu recurso e se manifeste sobre a questão infraconstitucional”. Didier Jr, Fredie, Cunha, Leonardo Carneiro, Curso de Direito Processual Civil, 13ª Ed, Jus Podivm, Salvador, 2016, p. 356.

[2] Na hipótese de conversão do recurso extraordinário em recurso especial, nos termos do art. 1.033, cabe ao relator conceder o prazo do caput do art. 1.032 para que o recorrente adapte o seu recurso e se manifeste sobre a questão infraconstitucional.

[3] A regra deve ser aplicada aos recursos ainda pendentes de análise no início da vigência do CPC – 2015 e interpostos na vigência do CPC – 1973. Didier Jr, Fredie, Cunha, Leonardo Carneiro, Curso de Direito Processual Civil, 13ª Ed, Jus Podivm, Salvador, 2016, p. 350.

[4] Os artigos 1.032 e 1.033 devem ser aplicados aos recursos interpostos antes da entrada em vigor do CPC de 2015 e ainda pendentes de julgamento.

[5] Diversos são os artigos do Código que direcionam o magistrado a privilegiar o julgamento de mérito do caso em detrimento de uma solução processual que ocasione a extinção do processo sem julgamento do mérito. São eles: Art. 4º, 6º, 139, IX, 932, § único, 938, §1º, 1.029, §3º

[6] Alexandre de Freitas Câmara, ao citar o art. 4º do Código, assim dispõe: “Consolida-se, aí, um princípio fundamental: o de que se deve dar primazia à resolução do mérito (e à produção do resultado satisfativo do direito) sobre o reconhecimento de nulidades ou de outros obstáculos à produção do resultado normal do processo civil. Eis aí, portanto, o princípio da primazia da resolução do mérito.”, in http://genjuridico.com.br/2015/10/07/o-principio-da-primazia-da-resolucao-do-merito-e-o-novo-codigo-de-processo-civil/

21/10/2016

Fonte- http://jota.info/cpc-nos-tribunais-o-direito-intertemporal-e-fungibilidade-recurso-especial-e-recurso-extraordinario

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