Após meio século de existência, o Código Tributário Nacional (CTN) tem como desafio atual estabelecer uma convivência harmônica com a Constituição Federal de 1988, promulgada 22 anos depois dele, e continuar servindo como orientação para a matéria tributária no Brasil.
A avaliação é dos ministros do Superior Tribunal de Justiça Regina Helena Costa e Gurgel de Faria, coordenadores científicos do seminário Código Tributário Nacional e seus 50 anos, que será realizado no dia 19 de outubro, no auditório do STJ.
Para os ministros, apesar de ser anterior à Constituição, o CTN mantém-se moderno ao disciplinar matérias relevantes do direito tributário contemporâneo, mas exige alterações por não regular outros temas que surgiram com o tempo.
“O código disciplina bem as questões da prescrição, da decadência, das obrigações e dos créditos tributários. Nós verificamos algumas lacunas, como no caso das contribuições, mas, de forma geral, não há necessidade de um novo código”, avaliou o ministro Gurgel de Faria. A ministra Regina Helena também não acredita que haja necessidade de mudanças substanciais no sistema tributário brasileiro.
Apesar da necessidade de alguns ajustes e atualização da legislação complementar, os coordenadores científicos ressaltam que essas modificações encontram dificuldades pela necessidade de que uma eventual reforma tributária seja realizada inicialmente com alteração da Constituição Federal.
“O sistema tributário no Brasil é peculiar, pois não está delineado no código correspondente e sim na Constituição da República. Nosso desejo é que o código estivesse em perfeita conformidade com a Constituição, o que evitaria muitos conflitos. Mas o discurso da reforma tributária, que já dura décadas sem uma efetiva implantação, acaba impedindo que o próprio código seja aperfeiçoado”, apontou a ministra Regina Helena.
Judicialização
As discussões geradas pela aplicação da Constituição Federal — principal referência em matéria tributária no país — e de leis infraconstitucionais como o CTN surgem como um dos motivos para uma série de questionamentos no âmbito do Poder Judiciário. O ministro Gurgel lembrou que, no tocante às turmas especializadas em direito público no STJ, 29,36% dos processos dizem respeito a matéria tributária.
Nos estados, a judicialização está relacionada principalmente ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Já os municípios enfrentam demandas relacionadas especialmente ao Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS). Os dois tributos geram as maiores arrecadações fiscais aos entes federativos.
No caso da União, as principais demandas têm relação com as contribuições sociais, como as contribuições para o PIS/Pasep e as contribuições previdenciárias, entre outras. “São os tributos menos conhecidos, menos estudados e, exatamente por isso, os mais polêmicos”, apontou a ministra Regina Helena.
No âmbito do STJ, a resolução de uma parcela das demandas tem-se dado por meio do julgamento de recursos repetitivos, cujas teses orientam todos os tribunais brasileiros. Recentemente, por exemplo, a Primeira Seção julgou a legalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins.
“Nessas matérias, caso não haja o reconhecimento de repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal, o STJ dará a última palavra, interpretando a legislação federal, fazendo a análise desses temas com base no CTN e nas leis específicas que tratam de contribuições e impostos. Estamos procurando dar essa orientação”, disse o ministro Gurgel.
Carga tributária
Os coordenadores científicos do seminário também comentaram a relação entre a arrecadação tributária e a restituição à sociedade brasileira em forma de serviços públicos. Na avaliação do ministro Gurgel de Faria, quando se compara o serviço público prestado pelo Estado à sociedade brasileira e o valor pago a título de tributos por ela, percebe-se que o percentual de contribuição é elevado.
“Tudo depende do que o Estado presta de serviço. Em outros países, por exemplo, como a Noruega, cobra-se mais do cidadão, algo em torno de 47%, mas a qualidade do serviço oferecido pelo governo é infinitamente melhor. E, quando eu digo serviço, ele é baseado nos três direitos básicos de uma população: saúde, segurança e educação. Os Estados Unidos, por exemplo, possuem um percentual de arrecadação inferior ao do Brasil, 22%, e oferecem também um serviço mais adequado”, diz ele.
Para a ministra Regina Helena Costa, a alta carga de impostos, antes de ser um problema tributário, constitui uma decisão política: “Qual o grau de sacrifício econômico que se vai impor a um povo para que se atinjam as metas a que se propõe o Estado perante a sociedade? No Brasil, o grau de sacrifício é alto, e o que o cidadão vê de realização é pouco.”
Seminário
“Como tribunal responsável pela interpretação e uniformização da legislação federal, o STJ não poderia deixar de realizar um evento sobre o tema”, explicou a ministra Regina Helena ao ressaltar a importância do seminário. Em 2016, vários debates sobre os 50 anos do CTN têm sido realizados em todo o país.
Para o evento, foram convidados professores que acompanharam o código tributário desde o seu nascimento e que atualmente pertencem a correntes teóricas distintas. “Os ministros também vão participar como debatedores e como presidentes de mesa. A ideia é fazer um grande colóquio e discutir boas e más experiências em relação ao código”, projetou a ministra.
Os coordenadores também ressaltaram a importância do comparecimento e da participação de magistrados, membros do Ministério Público, advogados, estudantes e servidores.
O seminário Código Tributário Nacional e seus 50 anos é promovido pelo STJ e pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CEJ/CJF) em parceria com a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) e a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). O evento terá entrada gratuita.
Os interessados em participar podem fazer a inscrição no site do CJF até o dia 14 de outubro. O evento contará com palestras e conferências sobre temas atuais e polêmicos relativos ao Código Tributário Nacional.
Fonte- STJ- 20/9/2016.