Manoel Pereira Calças: queremos que esses processos passem a ser o foco principal porque a ação será mais efetiva
O Judiciário de São Paulo quer por um ponto final nos 1.329 processos de falência antigos, que se arrastam por mais de décadas e ainda são regidos pela Lei da Concordata – em desuso desde 2005, quando entrou em vigor a Lei de Recuperação Judicial e Falências. Para acelerar o encerramento, todas essas ações serão deslocadas das varas cíveis da capital paulista, onde tramitam atualmente, para uma vara única e especializada no tema.
Entre os casos e os 60 mil incidentes relacionados a essas ações, está o processo de falência da Mappin, maior loja de departamentos do país na década de 90. A empresa teve a falência decretada em 1999, com cerca de R$ 400 milhões em dívidas, e o processo ainda não teve fim. Faltam ser pagos cerca de 20% dos funcionários da época em que as lojas estavam em atividade.
Também fazem parte do acervo as falências da Petroforte – uma das principais distribuidoras de combustíveis do país, cujo processo corre desde 2001 – e da Fazenda Reunidas Boi Gordo, que ganhou fama na segunda metade da década de 90 pela promessa de grande retorno aos investidores.
Na época, prometia-se ao investidor que adquirisse um animal o retorno, após 18 meses, do valor pago mais 42% referentes ao lucro pela venda do boi engordado. Os problemas começaram quando a companhia passou a utilizar o dinheiro de novos investidores para pagar contratos vencidos – num esquema conhecido pelo mercado como “pirâmide financeira”.
A Boi Gordo acabou pedindo concordata em 2001 e teve a falência decretada três anos depois. O processo é um dos maiores e mais complexos entre os antigos de São Paulo. São cerca de 30 mil incidentes – metade dos 60 mil relacionados a todo o acervo.
A 3ª Vara de Recuperação Judicial e Falências é que receberá esses processos. Criada em 2005 junto com outras duas, também especializadas, a unidade era a única ainda não implantada.
No começo da semana, o Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) aprovou proposta da Corregedoria não só para instalar essa terceira vara como também para a utilização exclusiva da unidade, pelos primeiros dois anos, para o andamento dos processos antigos.
A 1ª e a 2ª Varas de Recuperação Judicial e Falências de São Paulo tratam, desde que foram instaladas, somente dos casos posteriores à lei de 2005. Todo o acervo anterior, de casos já em andamento, permaneceram nas varas cíveis centrais da capital paulista – e ainda sob o rito da chamada Lei da Concordata (Decreto nº 7.661, de 1945).
“Nós queremos que esses processos passem a ser o foco principal. Porque assim a ação será mais efetiva, mais direcionada ao fim”, diz o corregedor-geral da Justiça de São Paulo, Manoel Pereira Calças. Ele chama a atenção ainda que a nova unidade vai trazer alívio às varas cíveis. “Elas vão se livrar de um volume processual que ocupa espaço e atrapalha o andamentos dos demais casos”, pondera.
O acervo que hoje está nas varas cíveis representa cerca de 40% da quantidade de casos de recuperação judicial e falência que tramita nas duas varas especializadas. E são todos ainda físicos, documentados em papel. O acervo é tão volumoso que a Corregedoria, ao apresentar projeto ao Conselho da Magistratura, indicou que serão necessárias aproximadamente 300 prateleiras para acondicionar a papelada.
O advogado Nelson Carmona atua em cerca de 140 processos de falência antigos. O mais velho deles está completando 34 anos. Envolve uma empresa de engenharia que teve a falência decretada em 1983. O encerramento, segundo ele, depende ainda da venda de bens.
O advogado diz que muitos dos profissionais que atuam nos cartórios onde estão esses casos já se aposentaram. Foram substituídos por pessoas mais novas que, muitas vezes, não têm conhecimento sobre a lei de 1945. ” Eles até fogem dessas falências antigas”, conta. Por isso, para ele, a concentração desses casos em uma vara única e especializada “certamente irá fazer os processos andar”.
Carmona também é síndico da massa falida da Mappin. Ele diz que foram pagos, do início do processo até agora, cerca de 80% dos credores trabalhistas. Uma das pendências do caso é a venda do edifício que fica na Avenida Juscelino Kubitschek – que abrigava uma das unidades mais famosas da rede e onde hoje funciona uma loja do Supermercado Extra. O leilão está previsto para ocorrer entre os meses de março e abril. E quando acontecer, segundo o advogado, o processo se encaminhará para o fim.
A massa falida da Mappin detém 30% desse edifício. Os outros 70% pertencem à empresa Gazit Brasil, adquiridos, principalmente, de fundos de pensão que haviam comprado frações do imóvel na época de sua construção. Essa foi uma das estratégias do grupo Mappin para obter recursos para a obra. O quinhão pertencente à massa falida, de acordo com Carmona, está avaliado em R$ 135 milhões.
Nelson Carmona calcula que somados esses valores aos R$ 100 milhões que já existem em caixa será possível liquidar as dívidas trabalhistas e parte do passivo tributário. A divisão dos recursos, no entanto, pode ainda demorar um pouco. A falência do Mappin teve mais de cinco mil pedidos de habilitações de credores. “E existem ainda alguns pendentes”, pondera.
Fonte: Valor Econômico- 27/1/2017-