Decisão recente do pleno do Tribunal Superior do Trabalho (TST) aumentou a insegurança sobre a atualização monetária de débitos trabalhistas. A Corte e o Supremo Tribunal Federal (STF) têm passado sinais trocados sobre o tema, com alto impacto para trabalhadores e empresas.
Por maioria de votos, o pleno do tribunal trabalhista determinou que a dívida seja atualizada pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-e) a partir do dia 25 de março de 2015. A data é a mesma usada pelo Supremo Tribunal Federal no acórdão que determinou a aplicação do índice para os precatórios (ADI 4.357). A decisão do tribunal trabalhista vale apenas para um caso.
O TST havia determinado, em agosto de 2015, a correção pelo IPCA-e em substituição à Taxa Referencial Diária (TRD). O objetivo era resguardar o direito à recomposição integral do crédito trabalhista reconhecido por sentença transitada em julgado. A decisão retroagiria a junho de 2009, ou seja, o novo índice deveria ser aplicado nas execuções em andamento a partir daquele ano.
Além disso, os ministros haviam decidido que o índice seria utilizado pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) para a tabela de atualização monetária da Justiça do Trabalho (tabela única). Dessa forma, determinaram que os juízes trabalhistas observassem o novo índice de correção em todos os casos.
Agora, o TST modulou os efeitos dessa decisão para que o novo índice seja aplicado a partir de março de 2015 – não mais retroagindo a 2009.
No meio do caminho entre as duas manifestações do tribunal do trabalho, porém, o STF suspendeu os efeitos da primeira decisão do TST – que determinou a substituição dos índices. Na liminar, concedida em outubro de 2015 a pedido da Federação Nacional dos Bancos (Febraban), o ministro Dias Toffoli considerou que o tribunal trabalhista extrapolou o entendimento do STF fixado no julgamento sobre a constitucionalidade do regime de pagamento dos precatórios (ADIs 4357 e 4425).
Toffoli ressaltou que a alteração da correção monetária determinada pela Corte trabalhista atingiu não só o caso concreto, mas todas as execuções em curso na Justiça trabalhista. Isso porque o TST acionou o CSJT para providenciar a ratificação da “tabela única” da Justiça do Trabalho.
Decisões similares também foram proferidas pelos ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.
E agora?
Do cenário complexo gerado pelas decisões, advogados trabalhistas têm extraído conclusões diferentes.
Para o advogado Daniel Chiode, do Mattos Engelberg Advogados, a decisão mais recente do pleno do TST está em desconformidade com a decisão do Supremo. Isso porque, segundo ele, o STF não permitiu a fixação de qualquer índice diverso da TR ainda que caso a caso. “E isto foi feito pelo TST”, afirma.
De acordo com Chiode, não se pode ‘por arrastamento’ achar que pode declarar inconstitucional aquilo que ainda está vigente. “O próprio ministro Dias Toffoli reconhece nas diversas reclamações que são submetidas ao STF, que o Supremo só deve autorizar outro índice quando tiver lei neste sentido.”, explica.
Com a decisão divergente do TST, o Supremo deve ser provocado para decidir novamente a questão. Na opinião de Chiode, isto deve forçar o STF a fixar de novo algo que vincule as demais decisões sobre o assunto. Até lá, a questão continua sendo decidida caso a caso, o que pode gerar insegurança jurídica já que nem o STF, nem o TST são uniformes quanto ao tema.
O advogado André Torres, do Pinheiro Neto Advogados, entende o contrário. “Ao definir a data de 25 de março de 2015 como marco temporal do início da incidência do IPCA-e, o TST se adequou ao entendimento do STF na ADI 4357 e, ao mesmo tempo, cumpriu a decisão liminar proferida pelo ministro Dias Toffoli na Reclamação 2202, decotando do acórdão a determinação de que fosse reeditada a tabela única de cálculo de débitos trabalhistas”, afirma.
Marco
A decisão de fixar um marco temporal – março de 2015 – para a aplicação do IPCA-e veio depois de intenso debate entre os 27 ministros do pleno. Prevaleceu o voto do ministro Cláudio Brandão, relator do ArgInc-479- 60.2011.5.04.0231.
Ao analisar embargos de declaração em incidente de arguição de inconstitucionalidade, o pleno conferiu efeito modificativo para modular a decisão proferida em março de 2015, que declarou inconstitucional, por arrastamento, a expressão “equivalentes à TRD”, contida no artigo 39 da Lei 8.177/91, e acolheu o IPCA-e como índice de atualização monetária dos débitos trabalhistas.
Além disso, os ministros decidiram cancelar a ordem de reedição da Tabela Única de cálculo de débitos trabalhistas, para que fosse adotado o índice IPCA-e, “visto que tal comando poderia significar a concessão de efeito erga ornes [a decisão], o que não é o caso”.
Ficaram vencidos as ministras ministros Maria de Assis Calsing, Maria Cristina Peduzzi, Dora Maria da Costa e os ministros Antonio José de Barros Levenhagen e Ives Gandra Martins Filho. Eles julgaram prejudicados os embargos de declaração em razão da liminar deferida por Toffoli.
O ministro Brito Pereira, por sua vez, acolheu os embargos de declaração para prestar esclarecimentos, sem modular os efeitos da decisão.
Segundo Ricardo Calcini, assessor de desembargador e professor da Escola Judicial no Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), o TST decidiu não só aplicar o índice IPCA-e ao caso concreto, como também modular os efeitos da decisão para produzir efeitos a partir do dia 25 de março de 2015.
“Mesmo sem dar eficácia erga omnes, para não conflitar com o entendimento esposado pelo STF, parece que o TST sinalizou pela possibilidade de, no caso em concreto, ser possível a aplicação do índice IPCA-e como critério de atualização monetária dos débitos trabalhistas a partir de 25 de março de 2015″, explicou.
Precatórios
No julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 4357 e 4425, em março de 2013, o STF declarou inconstitucional, dentre outras disposições da EC 62/2009, o uso da TR como índice de correção monetária, por não representar fielmente a evolução inflacionária.
Após ter sido informado pelo Conselho Federal da OAB sobre a paralisação do pagamento de precatórios por alguns Estados e municípios, o ministro Luiz Fux, redator do acórdão das ADIs, determinou que os tribunais de justiça continuassem a efetuar o pagamento de precatórios na forma da EC 62/2009, até que o STF decida em definitivo sobre a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade. A decisão foi proferida na Ação Cautelar (AC 3764).
No caso do índice de correção aplicado aos precatórios federais, Fux entendeu que deve ser utilizado o índice previsto nas Leis de Diretrizes Orçamentárias da União de 2014 e 2015, que instituíram o IPCA-e em substituição ao índice de remuneração básica da poupança (TR).
Fonte: JOTA, por Livia Scocuglia, 27.04.2017-
http://www.granadeiro.adv.br/clipping/2017/04/27/tst-fixa-marco-temporal-para-aplicacao-do-ipca-e