Por Marcel Solimeo – 15 de Março de 2019
Economista-chefe da Associação Comercial de São Paulo
O crédito é fundamental para o crescimento da economia, especialmente no Brasil, devido ao baixo nível de renda da maior parte da população.
O popular crediário foi o principal instrumento de ampliação do consumo nas últimas décadas, permitindo o acesso a bens de maior valor, o que contribuiu também para a criação de um parque industrial voltado ao consumo doméstico.
O SCPC (Serviço Central de Proteção ao Crédito), criado pela Associação Comercial de São Paulo (ACSP) em 1956, atualmente Boa Vista Serviços, permitiu que o crediário fosse massificado, ao reduzir os riscos dos financiamentos com o cadastro negativo dos consumidores, o que deu maior segurança para a concessão do crédito.
Nas últimas décadas, no entanto, a dimensão do mercado interno exigiu grande expansão e diversificação dos financiamentos, o que se deu através do sistema financeiro, cujas exigências de informações são mais sofisticadas, para reduzir os riscos e custos das operações de crédito.
A informação negativa continua importante, mas não elimina a “assimetria de informações” com relação à capacidade de pagamento do consumidor.
Com as informações positivas se torna possível estabelecer limites de financiamento e juros diferenciados em função do histórico daqueles que pagam suas contas em dia, com o que se poderá não apenas expandir o crédito, como reduzir a taxa média de juros.
Em 2003 começou-se a debater no Brasil a necessidade de criação do cadastro positivo, a exemplo do que já existia nos países desenvolvidos, e mesmo em vários em desenvolvimento e a ACSP participou intensamente dos debates, que resultaram na elaboração de um projeto de lei sobre essa nova ferramenta para dar maior segurança à concessão do crédito.
O projeto de lei foi encaminhado ao Congresso em setembro de 2005, mas apenas em junho de 2.011 foi aprovado e se converteu na Lei 12.414.
Com o saudável objetivo de proteger a privacidade do consumidor, no entanto, essa lei estabeleceu regras de muita difícil implementação, acarretando baixa adesão dos consumidores. A autorização prévia exigida atualmente é o maior dos obstáculos, embora existam também dificuldades operacionais e de definição de responsabilidades
Agora o Senado aprovou o Projeto de Lei Complementar PLS 212/2017, que altera a Lei 12.414/11 para dar mais efetividade ao Cadastro Positivo, flexibilizando as regras, sem afetar a privacidade do consumidor, cuja vontade de participar ou não continua preservada.
Esse projeto foi aperfeiçoado na Câmara dos Deputados, onde teve como redator final o deputado Walter Ihoshi, cujo relatório, ao voltar ao Senado, foi preservado.
A forma de abertura do Cadastro é a principal mudança da nova Lei, que elimina a necessidade de autorização prévia do consumidor, que passa a ser de iniciativa do Banco de Dados.
Para assegurar o direito do consumidor o Banco de Dados deverá, em no máximo 30 dias, comunicá-lo da inclusão de seu nome no cadastro e oferecer meios que facilitam a retirada sem custos, caso não deseje se manter no cadastro.
É importante destacar que, para o “bom pagador” é vantagem manter-se no Cadastro, pois as informações o favorecerão no tocante a prazos e juros.
Outras alterações visam facilitar o fornecimento por parte dos bancos de “dados financeiros de pagamentos relativos às operações de crédito e operações adimplidas ou em andamento” de pessoas físicas ou jurídicas, “para a formação de histórico de crédito”.
Com as informações do sistema financeiro e de outras fontes, os Bancos de Dados poderão fazer o “score” do consumidor, isto é, dar uma nota que reflete o seu comportamento e grau de endividamento, permitindo ao financiador fixar taxas de juros diferenciadas em função do risco, o que poderá expandir mais o crédito.
Com isso, os bons pagadores de menor renda poderão ser os maiores beneficiados porque, geralmente, são os que enfrentam maiores obstáculos para a obtenção de crédito, seja pela maior dificuldade de comprovar a renda e o grau de endividamento, como a pontualidade.
O Cadastro Positivo permitirá também controlar o “endividamento excessivo” que hoje representa uma das principais causas da inadimplência, ao permitir conhecer o total de dívidas dos consumidores e limitar o crédito de acordo com capacidade de pagamento.
Fontes importantes de alimentação do Cadastro Positivo serão as empresas de serviços públicos (água, luz, telefone, gás) pois além de servirem para comprovar a pontualidade, seus dados poderão ser usados como indicador indireto de capacidade de endividamento permitindo construir um “score” dos que não tem comprovação de renda.
Com base nas informações das empresas de serviços é possível construir o “score” pois elas revelam, com base nos dados de consumo, uma renda estimada e capacidade de endividamento nos pagamentos.
Com a aprovação no Senado e a sanção do presidente o Cadastro Positivo deverá passar a funcionar mais amplamente, o que beneficiará financiadores, consumidores e a economia. Embora a Selic tenha sido reduzida, na vida real os brasileiros pagam uma das maiores taxas do mundo.
O que se espera agora é que o componente “risco” que compõe o “spread” bancário diminuindo em função de mais informações, o sistema financeiro promova também redução na taxa final paga pelos consumidores.
15/3/2019
Fonte- https://dcomercio.com.br/categoria/opiniao/o-que-esperar-do-novo-cadastro-positivo