A proposta da nova Lei de Falências enviada ao Congresso pelo governo trouxe entre suas inovações a possibilidade de a recuperação judicial de uma empresa ser estendida ao grupo econômico ao qual pertença, caso a Justiça considere o risco de esvaziamento patrimonial da companhia em recuperação.
Em entrevista ao Valor, Waldery Rodrigues Junior, assessor especial do ministro da Fazenda, Eduardo Guardia, apontou que o mecanismo chamado de “consolidação substancial” é uma das iniciativas com objetivo de oferecer segurança aos investidores.
Para o assessor, a hipótese não gera o risco de uma empresa em dificuldade econômica dentro de um grupo contagiar outras, pois só poderá ocorrer se o juiz entender que há movimento indevido ou fraudulento.
O Ministério da Fazenda aponta a chamada “sucessão de passivos” como outro ponto fundamental da proposta que gerará maior segurança jurídica ao sistema de recuperação brasileiro. A ideia é garantir que investidores, interessados em adquirir ativos de uma empresa em recuperação, não sejam surpreendidos com obrigações não previstas no negócio.
Um exemplo é uma empresa em recuperação vender ativos e o comprador ser responsabilizado por possíveis débitos trabalhistas. Nesse caso, o dispositivo deixa claro que o passivo segue com a empresa em recuperação. “A ideia é atrair investimentos. O comprador só vai querer adquirir se tiver a certeza de que o passivo ali está claramente demonstrado”, disse.
Para Rodrigues Junior, a venda de ativos e a busca de financiamentos são essenciais para viabilizar qualquer processo de recuperação, cuja taxa de sucesso no Brasil é baixa. Hoje não há regra clara sobre isso. A nova lei estabelece por exemplo a definição do que é uma Unidade Produtiva Isolada (UPI), que será segregada para venda a um investidor com a segurança de que não haverá sucessão.
O terceiro ponto ressaltado pelo técnico da Fazenda é a preferência a ser dada ao pagamento de empréstimos concedidos durante a recuperação (chamado de Dip Finance). Nesse sentido, disse, haverá uma prioridade ainda maior para 10% do crédito aprovado, se este for ofertado no início da recuperação.
“As empresas em processo de recuperação têm pouco ou nenhum acesso a recursos financeiros. Para preencher esta lacuna, o projeto cria um mecanismo para assegurar que os recursos destinados ao financiamento da recuperação da empresa tenham efetivamente prioridade no recebimento em caso de liquidação, ficando estes apenas abaixo dos créditos trabalhistas”.
Com a nova lei, a Fazenda quer aumentar as chances de recuperação das empresas, fortalecendo os credores e fomentando o papel dos investidores. Segundo Rodrigues Junior, hoje o índice de recuperação dos créditos em recuperação judicial está em torno de 25%. O desenho da lei tem a intenção de elevar para padrão entre 65% e 70%, vigente em países desenvolvidos que inspiraram o projeto, como Estados Unidos e Canadá. Ele também disse que a ideia é reduzir o atual prazo de até dez anos para decretação de falência para um nível de dois a três anos.
Para a sócia da área de contencioso estratégico do Siqueira Castro Advogados, Yasmin Cotait, a proposta da Fazenda de forma geral dá mais poder aos credores, equilibrando um pouco mais o jogo nos processos de recuperação. Yasmin considerou, porém, que o projeto poderá dar muito poder aos bancos, em razão do peso maior dos volumes de créditos envolvidos. Acrescentou ser correta a decisão da proposta de dar prioridade ao pagamento dos financiamentos concedidos durante o período de recuperação judicial.
Fonte: Valor Econômico- 11/5/2018-