Mais da metade dos acordos entre companhias e sindicatos, de janeiro a julho, está fora do PPE.
Enquanto o governo acena com uma ambiciosa reforma trabalhista, uma das principais ferramentas capazes de atenuar a escalada do desemprego, o Programa de Proteção ao Emprego (PPE), criado em julho do ano passado, revelou-se inacessível à maioria das empresas por excesso de burocracia e rigidez nas regras.
Má notícia na conjuntura atual, em que a taxa de desemprego avança para 12% da população economicamente ativa , atingindo a 11,8 milhões de pessoas, e a perspectiva de retomada da atividade ainda é incerta.
BUROCRACIA DIFICULTA
Levantamento da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), feito a partir de dados do Ministério do Trabalho, mostra que o número de acordos entre empresas e sindicatos com redução de expediente e remuneração chegou a 208 entre janeiro e julho deste ano, mas a maior parte, 62%, foi feita à margem do PPE, que exige o aval do governo.
Exigências como estar com o pagamento de impostos em dia e comprovar que demitiu mais do que contratou nos últimos 12 meses explicam porque as empresas buscam acordos à parte. O principal benefício do PPE é que a empresa aprovada no programa pode reduzir a jornada e o salário dos empregados em 30% e, como contrapartida, o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) cobre 50% do desconto das remunerações.
PROGRAMA MAIS FLEXÍVEL
— O PPE é uma ferramenta essencial para o mercado de trabalho em momento de grave crise. No entanto, da forma como está, é muito burocrático, difícil de aderir. O ideal seria facilitar o acesso — afirmou Hélio Zylberstajn, responsável pelo levantamento da Fipe.
O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Rafael Marques, concorda com Zylberstajn. Ele afirma que o programa precisa ser mais flexível em quesitos como o que proíbe aos trabalhadores sob o PPE de fazer horas extras, por exemplo. Segundo Marques, esta norma “engessa” a possibilidade de haver uma retomada da atividade da companhia caso haja um pedido inesperado de um cliente.
Em São Bernardo do Campo, como acontece no resto país, diz Marques, a maioria dos acordos de redução de jornada e salário ocorreu fora do PPE. Em todos os acordos, porém, o sindicato garantiu que a redução do salário não fosse proporcional à da jornada, mas que seguisse a regra do PPE. Só que nesses acordos “paralelos”, em vez do FAT, são as empresas que bancam os 50% da redução do salário.
Pelo levantamento da Fipe, porém, essa não é bem a realidade. Excluindo os acordos dentro do PPE, os dados mostram que, enquanto a redução de jornada média, desde julho de 2015, foi de 20%, o desconto salarial médio foi de 17,4%. Ou seja, em muitos dos acordos, as empresas não cobrem a parte do FAT no PPE.
GOVERNO JÁ SINALIZOU MUDANÇA
O empresário José Carlos Nadalini, dono da Engrecon, que fabrica autopeças em Santana de Parnaíba, na Região Metropolitana de São Paulo, relata que demorou meses para conseguir aderir ao PPE e quase desistiu. Produtora de engrenagens para caminhões, a empresa foi impactada duramente pela queda do mercado e reduziu seu quadro de funcionários de 240 pessoas para 130.
— Só insisti no PPE porque quero evitar a demissão. São funcionários que treinei, é um custo muito alto demitir e não reter o talento já treinado — ressaltou Nadalini.
Para Marques, esse pouco mais de um ano de PPE serviu como aprendizado para aperfeiçoar uma possível segunda versão do programa, já que o prazo para adesão ao atual se encerra em dezembro. O ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, admitiu, numa visita recente ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, a necessidade de rever as regras do PPE para tornar o programa mais efetivo. Ele também prometeu a composição de um grupo de trabalho para fazer essa revisão.
— Temos ligado no Ministério para saber do andamento da formação desse grupo, mas não tivemos resposta — disse Marques.
Procurado, o Ministério do Trabalho não respondeu às solicitações da reportagem.
Fonte- O Globo- 13/9/2016- http://oglobo.globo.com/economia/burocracia-emperra-programa-de-protecao-ao-emprego-20099522