A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) começou a julgar ontem se é possível, na fase de execução de um processo, o devedor indicar à penhora cotas em fundo de investimento. Também avaliam se elas teriam o mesmo tratamento prioritário dado ao dinheiro pelo Código de Processo Civil (CPC).
Por enquanto, dois ministros, dos 15 que compõem a Corte Especial, votaram contra ao pedido do devedor. O julgamento foi suspenso por um pedido de vista.
O tema é julgado por meio de recurso repetitivo, portanto, a decisão fixará uma tese que servirá de orientação para as instâncias inferiores e para as turmas e seções do STJ. O repetitivo é formado por três processos do HSBC Bank Brasil Banco Múltiplo.
A instituição tem mais de 12 mil processos sobre o tema, como disse na sessão o advogado do banco, Marcos Cavalcante de Oliveira, do Sturzenegger e Cavalcante advogados. “A questão é de interesse geral para o funcionamento do sistema econômico. Os bancos são muito mais credores do que devedores indicando bens à penhora”, afirmou.
Os recursos do banco têm como pano de fundo uma ação civil pública do Instituto de Defesa do Consumidor (IDC) contra o Banco Bamerindus, sucedido pelo HSBC Bank Brasil Banco Múltiplo. O processo referia-se ao pagamento de expurgos inflacionários em cadernetas de poupança. Diversas execuções foram propostas após a decisão em ação civil pública.
Segundo Oliveira, desde 2010 há recurso pendente em sentença de liquidação. Portanto, tratam-se de execuções provisórias. Mesmo assim, foram iniciadas e o banco indicou para penhora cotas de fundos de investimento. Mas elas não foram aceitas pelos credores.
A instituição defende que as cotas poderiam substituir dinheiro na lista do Código de Processo Civil. De acordo com Oliveira, não se discute questão tributária, mas a natureza do cumprimento de uma execução provisória de sentença.
O voto do relator, ministro Marco Aurélio Belizze, não acompanhou a argumentação do banco. Para Belizze, as cotas de fundo de investimento consistem em valores mobiliários. Portanto, não estão na ordem legal de preferência de penhora, mas no fim da lista.
O CPC indica a ordem de bens que podem ser penhorados na execução por quantia certa, como dinheiro em espécie, depósito ou aplicação em instituição financeira, títulos da dívida pública, veículos e bens imóveis, entre outros. Pela norma, a penhora em dinheiro é prioritária mas, nas outras hipóteses, o juiz pode alterar a ordem prevista no código de acordo com as circunstâncias do caso concreto.
O Código de Processo Civil de 1973 apresenta dez itens penhoráveis. Como último deles, aparecem os títulos e valores mobiliários com cotação em mercado. Foi nesse item que o ministro Bellizze considerou as cotas de fundos. No novo Código de Processo Civil, em vigor desde março deste ano, este passou a ser o terceiro item da lista. Apesar de o caso concreto se basear no antigo código, a tese firmada terá aplicabilidade inclusive aos casos que estão sob a vigência do novo texto, segundo o relator.
No voto, o ministro destacou os riscos dos fundos e a volatilidade dos ativos. Além disso, ele lembrou que sobre os valores incidem taxas de administração e performance, além de tributação sobre os depósitos nos fundos. O ministro concluiu, portanto, que as cotas de investimento constituem valores mobiliários com cotação no mercado financeiro e não se incluem no conceito de “dinheiro em aplicação financeira”.
Segundo o magistrado, apesar de o CPC indicar que a execução deve ser conduzida pelo modo menos gravoso ao devedor, isso não serve de argumento para que o credor receba um bem que não seja o ideal. Ainda segundo ele, eventual rendimento do fundo de investimentos, beneficiaria apenas quem apresentou o bem, uma vez que o credor tem seu crédito restrito aos valores da sentença.
O ministro Felix Fischer acompanhou o voto do relator e a ministra Nancy Andrighi pediu vista em seguida.
Fonte: Valor Econômico- 19/5/2016-
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