João Paulo Todde Nogueira: pela primeira vez, Judiciário reconhece a viabilidade de pagamento com bens imóveis
Uma liminar do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região poderá servir de precedente para que contribuintes com débitos inscritos em dívida ativa ofereçam à União imóveis para quitar a dívida. A possibilidade, conhecida como dação em pagamento de bens de imóveis, está prevista no Código Tributário Nacional (CTN) e outras legislações esparsas, mas nunca foi aplicada. Para a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) o mecanismo carece de regulamentação e antecipou ao Valor que tais regras devem ser publicadas até o próximo dia 15.
A falta de regulamentação dos critérios e procedimentos para avaliar os imóveis é um dos principais argumentos da União para negar os pedidos administrativos formulados por contribuintes.
Na decisão, o magistrado federal Marcelo Albernaz determina que a Fazenda Nacional examine de novo o pedido administrativo de dação feito pela empresa, no prazo de 90 dias. E que se abstenha de negá-lo sob o pretexto de que falta regulamentação pelo Ministério da Fazenda ou sem um motivo objetivo e claro.
Na decisão, porém, o magistrado não acatou o pedido da empresa para suspender a exigibilidade de crédito tributário por meio da dação. E citou o artigo 4º da Lei nº 13.259, de 2016, segundo o qual a aceitação do imóvel ficará a critério do credor, como um impeditivo para aceitar a suspensão.
Mesmo assim, o advogado João Paulo Todde Nogueira, CEO do Todde Advogados, que patrocina a ação, afirma que a decisão é importante porque, pela primeira vez, o Judiciário teria reconhecido a viabilidade da dação em pagamento de bens imóveis em matéria tributária. E, mais do que isso, a demora da administração pública na regulamentação de dispositivos que tratam da matéria e entraram em vigor em julho de 2016, com a publicação da Lei 13.313.
“A maior parte das ações judiciais sobre a matéria morria na primeira instância sob a argumento de que não existe regulamentação, mesmo após a vigência da Lei n° 13.313”, afirma o advogado. E quando os processos alcançam os tribunais, os magistrados costumam manter a decisão de primeiro grau, como ocorreu no Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná.
O grupo econômico autor da ação possui uma dívida tributária de cerca de R$ 17 milhões e tinha a pretensão de oferecer em dação imóveis no valor de R$ 20 milhões. De acordo com Nogueira, o escritório tem clientes – instituições financeiras, indústrias e incorporadoras – com um total de R$ 50 bilhões em imóveis para quitar débitos tributários por meio de dação.
A Lei 13.313 alterou o artigo 4º da Lei 13.259, estabelecendo critérios e requisitos a serem observados pelos contribuintes interessados em extinguir o crédito tributário por meio da dação em pagamento de bens imóveis. Essa possibilidade só é permitida para extinção de créditos tributários inscritos em dívida ativa da União. A aceitação do imóvel ficará a cargo do credor e a avaliação será realizada nos termos de ato do Ministério da Fazenda.
Para o advogado Renato Vilela Faria, do Peixoto & Cury Advogados, o fato de não haver ato normativo do Ministério da Fazenda para regular a avaliação do bem imóvel, não impede que o Fisco proceda a aplicação do sistema. “Não é razoável os contribuintes terem que aguardar mais 15 anos de inércia dos poderes Legislativo e Executivo, restando-lhes tão somente o Judiciário para buscar medida que faça valer seus direitos”, diz. Para ele, a dação em pagamento, na prática, permite ao governo trocar um devedor por um ativo.
Na opinião do advogado e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Thiago Taborda Simões, a possibilidade de oferecer imóveis para o pagamento de débitos tributários traz vantagens para os contribuintes com patrimônio baseado em imóveis e também para o Fisco. “O mecanismo garante que o imóvel seja dado como pagamento pelo valor de mercado, em vez de ir a leilão e negociado por preço bem inferior ao que vale”, analisa.
Por nota, a PGFN informa que está finalizando o texto de uma portaria para regulamentar a matéria. Adianta que, em linhas gerais, a aceitação de bens imóveis será condicionada ao interesse por parte de algum órgão da União. Caso contrário, a dação não será aceita.
Fonte: Valor Econômico- 29/1/2018-