O Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a analisar ontem uma questão polêmica: o uso de depósitos judiciais para o custeio de despesas públicas. Os ministros confirmaram liminar que suspendeu a eficácia da Lei nº 21.720, de 2015, editada pelo Estado de Minas Gerais, que prevê a transferência desses recursos para conta específica do Executivo.
Tramitam hoje no Supremo várias ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) contra leis estaduais neste sentido, que estariam em desconformidade com a legislação federal. E já foram concedidas liminares pelos ministros Teori Zavascki, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Rosa Weber. Esse foi um dos caminhos encontrados pelos governos estaduais para tentar driblar a crise econômica.
No caso de Minas Gerais, a liminar foi concedida pelo ministro Teori Zavascki. A norma, de julho de 2015, prevê o uso de 75% de todos os depósitos judiciais – e não só os de processos envolvendo entes públicos – “para custeio da previdência social, o pagamento de precatórios e assistência judiciária e a amortização da dívida com a União”.
A lei mineira entrou em vigor pouco antes da publicação pela União da Lei Complementar nº 151, de agosto de 2015, que prevê o uso de depósitos judiciais pelos Estados. A regulamentação, contudo, só autoriza a transferência de valores de processos em que entes estaduais façam parte, com limite de uso de 70% do total e prioridade para o pagamento de precatórios atrasados.
A ação contra a norma mineira foi ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR). No julgamento, o advogado Oswaldo Pinheiro Ribeiro Junior, que representou o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que é parte interessada, criticou o fato de Estados estarem usando esses recursos para pagamento de despesas públicas correntes, sem que haja a prioridade para os precatórios, como prevê a lei federal.
Ele citou como exemplo o próprio Estado de Minas Gerais, que tem uma dívida de R$ 3,6 bilhões em precatórios e, apesar de ter recebido cerca de R$ 4,8 bilhões em depósitos judiciais, somente pagou R$ 200 milhões de precatórios atrasados.
Representante do Banco Central, que também atua como amicus curiae, o advogado Flavio José Roman destacou que existem diversos precedentes no Supremo, três deles de 2010, que envolviam leis estaduais do Mato Grosso, Rio Grande do Sul e Amazonas. Os ministros julgaram inconstitucionais as normas ao entender pela competência exclusiva da União para legislar.
Em sua exposição, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ressaltou que a questão de fundo seria analisar se o Estado pode alcançar algo que não é dele ao usar depósitos judiciais de processos nos quais não é parte.
Para o advogado-geral do Estado de Minas, Onofre Alves Batista, porém, haveria “risco zero” com a operação. O Estado conseguiria restituir os valores utilizados. Segundo ele, em agosto de 2015, o fundo de reserva (de 25% do total de depósitos judiciais), que precisaria de no mínimo R$ 2,6 bilhões, tinha R$ 4,7 bilhões. “É absolutamente superavitário e há um nítido equilíbrio. Os ingressos são muito superiores aos eventuais saques”, disse.
A liminar contra Minas Gerais, agora referendada pelo Plenário, foi concedida no dia 29 de outubro de 2015. Logo após a decisão, o ministro Teori Zavascki aproveitou para esclarecer que os valores liberados até a concessão da liminar não tinham como ser suspensos.
Com o processo em curso no Supremo, o Estado de Minas Gerais entrou com uma ação ordinária no Tribunal de Justiça mineiro (TJ-MG) e conseguiu decisão, no dia 28 de outubro, para liberar a transferência de R$ 2,87 bilhões para a conta do Estado. O Banco do Brasil, após a decisão de Zavascki, determinou o bloqueio desses valores. Contudo, após o esclarecimento, os recursos foram liberados.
Fonte: Valor Econômico- 29/9/2016-