Embora ainda não existam estatísticas, até porque qualquer resultado nesse sentido depende da realidade de cada empresa, as melhorias, na avaliação de especialistas, já são percebidas. “Os ganhos são monstruosos”, resume Tânia Gurgel, professora, contadora e sócia da TAF Consultoria, ao se referir, por exemplo, aos benefícios apurados apenas com a implantação da Nota Fiscal Eletrônica (NF-e), que teve a adoção no Brasil iniciada há dez anos.
Na opinião da consultora, a agilidade que a NF-e trouxe ao setor de compras é impressionante, com impacto na logística de saída e entrada de insumos ou produtos em estoque. “A redução de custos com fretes e pessoal, eliminando horas extras, é enorme”, diz. Outro módulo doSped que trouxe benefícios é o da Escrituração Contábil Digital (ECD), na avaliação de Geuma Nascimento, sócia da Trevisan Gestão & Consultoria (TGeC).
Segundo ela, as empresas conseguiram desativar diversas obrigações acessórias, entre elas o livro Diário, o livro Razão e balancete contábil analítico. “O tempo e os gastos envolvidos para impressão, encadernação e registros são infinitamente maiores se comparados ao tempo, materiais usados e taxas de registro da ECD”, explica Geuma.
Vale ressaltar, entretanto, que a mensuração real desse ou daquele ganho de tempo é variável de uma empresa em relação à outra, mesmo sendo do mesmo setor, já que isso depende da forma de contabilização usada, o que impacta, consequentemente, em maior ou menor consumo de tempo para depuração das informações.
Flagelação do caixa
Geuma avalia que o Sped tem também outros objetivos. Entre eles, o combate à sonegação e à fraude, que exigem organização, disciplina e maior rigor sobre os controles internos por parte das empresas. Ela cita vários fatores que deterioram o patrimônio e o caixa das empresas e que poderão ser minimizados quando todos os módulos do Sped entrarem em vigor. “Há alto grau de destruição de patrimônio, que em muitas empresas passa quase que despercebido. Dentre as formas mais ocultas e perversas, estão a gestão fraca, as fraudes, os roubos, os erros intencionais na folha de pagamento para beneficiar colegas de trabalho, a obsolescência de materiais, a ausência de inventário rotativo de estoques, a péssima gestão de contratos (tanto com clientes quanto com fornecedores) e de desempenho, as compras equivocadas, a má qualificação de fornecedores e de materiais e a falta de equipes qualificadas de gestão de perdas e de estoques.”
Além disso, sobre aquele balanço trabalhoso e moroso que toda empresa faz anualmente, Geuma afirma que ficou mais fácil com os módulos do Sped em vigor. Isso é muito relevante em um país onde, além da pesada carga tributária, a complexidade para o pagamento de impostos faz com que as empresas gastem, em média, 2.600 horas por ano para realizar operações que envolvem o pagamento de impostos, segundo o Banco Mundial.
Segundo Geuma, a ECD, que também reúne os dados monetários das diversas transações mercantis, é uma ferramenta com poder de organização de dados através dos respectivos registros. Mas, explica, ainda requer conhecimentos técnicos acurados e cuidados especiais por parte do contabilista. “O velho e bom conceito da contabilidade continua sendo exigido”, destaca.
Estoques
Sobre o Bloco K, que exigirá o envio eletrônico de dados sobre estoques, matéria-prima, uso de insumos no processo produtivo e detalhes industriais sobre a transformação em produto final, Tânia explica que as companhias conseguirão reduzir as perdas operacionais atuais. Pesquisas mostram que uma empresa chega a perder entre 6% e 9% de seu faturamento em processos de produção. “É muito, principalmente em um momento econômico recessivo como este”, alerta a especialista.
Com o Bloco K, as perdas devem cair para, no máximo, 5%. No caso extremo, isso significaria redução de quatro pontos percentuais. Assim, uma empresa cujo faturamento é de R$ 10 milhões por mês, por exemplo, conseguiria reduzir suas perdas mensais em R$ 400 mil, ou R$ 4,8 milhões em um ano, quase metade do faturamento mensal, calcula Geuma.
“Os ganhos nas margens acontecerão à medida que a gestão de estoques seja mais eficiente em termos de compras e de melhor qualificação de fornecedores de matérias-primas e/ou produtos, além da melhoria na gestão de estoques, afastando erros, obsolescências e desvios”, afirma a especialista.
O presidente do Sindicato das Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e Pesquisas no Estado de São Paulo (Sescon-SP), Márcio Massao Shimomoto, ressalta que a grande maioria das empresas ainda faz o controle dos estoques no “papel”, sem acompanhar as etapas de custos entre a matéria-prima e o produto final. “Percebo isso em alguns encontros com associações empresariais. Com o maior controle exigido pelo Fisco, os empresários terão dados para perceber perdas e implantar melhorias em todos os processos. Dessa forma, o contador poderá identificar o custo real, produzindo relatórios sobre giro de estoque e margem de lucro de cada item, e embasar decisões estratégicas”, destaca.
Esses dados, até agora muitas vezes não acompanhados pelos gestores, deverão causar um ciclo virtuoso sobre a economia. Para Shimomoto, a nota fiscal eletrônica teve um impacto muito positivo sobre as pequenas e médias empresas, inclusive sobre a longevidade dessas companhias.
Ganha-ganha
Se por um lado empresas estão sendo beneficiadas com o Sped, os ganhos do Fisco não ficaram nem um pouco atrás. Com o EFD Contribuições, o crédito tributário constituído pela Receita Federal no ano passado, por exemplo, somou R$ 125,6 bilhões, terceiro maior resultado da fiscalização, superado apenas em 2013 e 2014. Para este ano, o crédito tributário a ser recuperado pela fiscalização foi estimado em R$ 165 bilhões.
“Antes do Sped, apenas 28% dos autos de infração emitidos pela Receita eram mantidos. No ano passado, chegou a 99,87%. Isso quer dizer que o nível de acerto do Fisco é de quase 100% devido ao cruzamento de dados”, diz Tânia, da TAF Consultoria. Ela informa ainda que, no início desta década, um auditor da Receita, em média, obtinha R$ 16,3 milhões com fiscalizações. Hoje, a média atinge R$ 59,7 milhões. Com isso, os valores médios de fiscalização da Receita passaram de RS 6,1 milhões, em 2012, para R$ 12,4 milhões. Em 2015, alcançou-se 24,3 milhões de escriturações eletrônicas recebidas pela Receita.
Fonte: DCI- 3/3/2016-
http://www.contabeis.com.br/noticias/27110/sped-garante-salto-de-qualidade/