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Redução da Selic traz alívio para endividamento de empresas

O corte de quatro pontos percentuais da taxa Selic desde o início da flexibilização monetária, em outubro do ano passado, traz um alívio importante para o endividamento das empresas. Uma simulação feita pela Fitch mostra que somente com a redução da Selic no atual ciclo, do pico de 14,25% para os atuais 10,25% ao ano, a fatia do lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês) destinada ao pagamento de juros relacionados às dívidas recuou de cerca de 80% para 65%.

O estudo, que buscou dar uma sensibilidade do efeito da queda de juros no consumo do Ebitda das empresas, levou em conta alavancagem média de 4 vezes – medida pela relação entre dívida líquida e Ebitda. E partiu de um custo de captação total de 20%, resultado de uma taxa Selic superior a 14% mais um prêmio de risco sobre o CDI de mais de cinco pontos percentuais. Esse era um cenário bastante comum no pior momento da crise de crédito, verificado no fim de 2015 e que desencadeou uma onda de processos de renegociação e até mesmo de recuperação judicial.

O avanço fica ainda mais significativo se colocados na conta uma redução dos spreads de risco cobrados das empresas, além da queda do juro, e o crescimento da geração de caixa potencial. Esses indicadores já vinham em tendência positiva. Levantamento do Valor Data com base em 229 companhias de capital aberto (excluindo Petrobras e Eletrobras) mostra que o Ebitda cresceu, em média, 14,2% no primeiro trimestre.

As emissões de debêntures realizadas neste ano também já mostraram uma melhora na percepção de risco, com os spreads sobre o CDI variando de 0,8 ponto percentual a 3,7 pontos, conforme o rating do emissor. Em março, quando a Selic estava em 12,25% ao ano, a JSL, classificada com a nota “AA-“, pagou 127,5% do CDI em uma emissão de debêntures de quatro anos, o equivalente a um spread de cerca de 3,7 pontos percentuais. Mais recentemente, quando o juro havia caído para 11,25%, a Localiza (“AAA”) fechou uma captação de sete anos com taxa de 107,25% do CDI (spread de 0,80 ponto).

Em abril, com a Selic ainda em 11,25%, Lojas Americanas pagou 115% do CDI em debêntures de cinco anos, um prêmio de cerca de 1,7 ponto; Eletropaulo fez uma operação de quatro anos a um custo de 120% do CDI, o equivalente a 2,25 pontos de spread; e Neoenergia pagou 123,2% por três anos do CDI (ou spread de cerca de 2,6 pontos).

Nesse contexto, segundo o estudo de sensibilidade da Fitch, com o juro de 10,25% mais um spread médio de 2,5 pontos – o equivalente a um custo total de captação entre 12% e 14% -, e a manutenção de um crescimento de 15% para o Ebitda, a fatia da geração de caixa direcionada para o pagamento de juros da dívida teria condição de cair para abaixo de 50%.

O recrudescimento da crise política com o vazamento da delação dos controladores da JBS, contudo, pode atrasar a recuperação. O primeiro impacto vem da redução do ritmo e ciclo de corte da taxa de juros, indicada pelo Comitê de Política Monetária (Copom) na reunião desta semana, seguido pela dificuldade de medir o impacto do risco político para a atividade econômica e, consequentemente, para as empresas.

Ricardo Carvalho, diretor sênior da área corporativa da Fitch, conta que diversas emissões de debêntures em que agência vinha trabalhando com o objetivo de atribuir rating foram postergadas. “É difícil mensurar o spread com o cenário de incerteza. Os bancos estruturadores das operações estão com maior grau de insegurança em relação ao tamanho da taxa e, para aceitarem dar garantia firme de colocação dos títulos, acabam colocando-a lá em cima”, justifica.

A CPFL Renováveis é um exemplo. A empresa de energia anunciou na última semana o cancelamento de uma emissão de debêntures no valor de R$ 250 milhões.

Mas o fato é que as companhias já começaram a sair de um estágio considerado “proibitivo”, como ressalta Carvalho, caminhando para ter sobra de caixa e uma estrutura de capital mais sustentável. E, apesar da dúvida sobre a velocidade da melhora no balanço das companhias, a tendência positiva é certa e já é possível ver evidências nos resultados.

A Ecorodovias, concessionária da área de infraestrutura que possui resultados relativamente estáveis trimestre a trimestre, teve redução de 17,7% na despesa financeira líquida no primeiro trimestre em relação ao mesmo período do ano passado. Segundo a companhia, dentre os motivos da melhora estão a redução dos indexadores de dívida, a Selic e o IPCA.

A administradora de shoppings Iguatemi também registrou queda nas despesas financeiras líquidas, na casa de 16,2% na mesma base de comparação, e citou a baixa do juro como um dos fatores. A Multiplan afirmou que após a queda de 1,5 ponto da Selic no trimestre, o custo da dívida diminuiu de 13,18% em dezembro para 12,18%.

Com sobra de caixa, a percepção é de que as empresas vão trocar dívidas caras, levantadas nos últimos dois anos por falta de alternativas. Um dos casos mais emblemático do período foi a debênture emitida em 2015 pela CCR, companhia com boa avaliação de risco (“AA’), a um custo de cerca de 18% ao ano (124,5% do CDI da época, ou spread de 3,5 pontos). A empresa tinha grandes vencimentos de curto prazo e, em meio ao mercado fechado para riscos de crédito, não teve alternativa a não ser pagar caro.

E o caminho a ser trilhado está claro – será via mercado de capitais. Rafael Zlot, gestor de crédito privado do Brasil Plural, lembra que muitos títulos venceram nos últimos dois anos e nem todos foram substituídos, o que deixou o mercado com falta de papéis. Essa situação eleva o apetite dos investidores e operações recentes saíram com a taxa apertada, como foi o caso de Localiza, Droga Raia e Lojas Americanas.

Os bancos, avalia Mariano Andrade, sócio da Polo Capital responsável pela estratégia de crédito, devem continuar com pouco apetite para emprestar e as empresas de pequeno e médio porte, que acessavam majoritariamente o financiamento bancário, continuam em dificuldades. “Apesar do serviço da dívida decrescente, para alguns setores, como automotivo, de incorporação e logística, a retomada da receita é muito paulatina. Temos recebido aqui companhias que são bons créditos, mas que não estão conseguindo rolar linhas de capital de giro.”

Fonte- Valor Econômico- 2/6/2017- http://www.seteco.com.br/22148-2/

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