A Receita Federal pretende ampliar as regras sobre responsabilização de terceiros por dívidas tributárias. Tratam-se daquelas situações em que a pessoa não é o contribuinte em si, mas pode ser considerada como responsável pelo pagamento – por exemplo, sócios e administradores de uma empresa que tem débitos com o Fisco ou mesmo o empregador que retém o Imposto de Renda do empregado.
As alterações previstas tratam basicamente do momento em que esses terceiros devem ser indiciados. Hoje a fiscalização segue o que está estabelecido na Portaria nº 2.284, de 2010. Pela norma, a inclusão dessas pessoas só pode ocorrer quando o fiscal lavra o auto de infração com as cobranças que considera devidas.
Com a mudança, a indicação seria permitido também em outros quatro momentos: quando a compensação não é homologada (ou seja, o contribuinte deu por quitados débitos por meio de créditos que achava ter direito e a Receita não concordou), antes do julgamento do processo na primeira instância administrativa, depois que houver decisão definitiva do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e em situações de débitos declarados e não pagos.
As novas regras devem constar numa instrução normativa (IN) ainda sem data para ser publicada. A Receita Federal colocou o texto em discussão. Interessados podem se manifestar, fazendo críticas e sugerindo mudanças, até o dia 6 de dezembro. Trata-se da consulta pública de nº 7, já disponível no site do órgão.
No texto em que apresenta essa consulta pública, a Receita Federal justifica a mudança com o fato de ter verificado a “existência de lacuna quanto ao procedimento em outras circunstâncias” e afirma que isso teria ocasionado um “tratamento desigual” aos contribuintes por parte da fiscalização.
Já para advogados que estão acompanhando o assunto, a possibilidade de responsabilizar um terceiro a qualquer tempo – tanto no curso como depois de finalizado o processo administrativo – teria, na verdade, objetivo arrecadatório, já que aumentaria as chances da fiscalização de encontrar alguém para pagar as dívidas.
A Receita Federal informa no texto que “busca garantir o direito de o sujeito passivo responsabilizado exercer o contraditório e a ampla defesa” em todas as novas hipóteses previstas na instrução normativa”. Para os especialistas, no entanto, esse é um dos pontos mais frágeis da proposta.
“O novo devedor solidário deveria ter o direito de se defender desde o início do processo administrativo”, entende Breno de Paula, sócio do escritório Arquilau de Paula Advogados Associados e presidente da Comissão de Direito Tributário do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Mas não é o que a instrução normativa elaborada pela Receita Federal estabelece para todas as situações em que seria permitida a inclusão. Para aqueles que forem incluídos no momento em que não for homologada a compensação ou antes do julgamento da primeira instância administrativa, o procedimento de defesa será o estabelecido no Decreto nº 70.235, de 1972. Isso quer dizer que a defesa poderá ser feita tanto na Delegacia de Julgamento (DRJ) como no Carf.
Já nos casos em que a inclusão for feita depois de o processo ter sido julgado pelo Carf ou nas situações em que o débito for declarado pelo contribuinte mas não pago, o rito será o previsto na Lei Geral de Processo Administrativo (nº 9.784, de 1999). Nesse caso, a análise não será feita pelo Carf – como nas outras hipóteses – e sim pelo superintendente da Receita Federal.
“O Carf é um órgão paritário, com representantes do Fisco e dos contribuintes. Se a análise não for feita pelo Carf haverá, na prática, menos chances de se ter uma avaliação mais imparcial”, pondera Leo Lopes, sócio do FAS Advogados. Ele entende que o Decreto nº 70.235, por ser a regra específica do processo administrativo fiscal, deveria ser aplicado sempre que se tratar de responsabilização por débito tributário.
João Marcos Colussi, sócio do escritório Mattos Filho, chama a atenção ainda para uma outra questão: a defesa do terceiro, da forma como está prevista no texto elaborado pela Receita Federal, não suspende a exigibilidade do crédito, o que normalmente ocorre nos processos administrativos.
“O responsabilizado, por exemplo, o presidente ou o diretor de uma empresa, pode sofrer a cobrança do tributo antes mesmo de exercer o seu direito de defesa”, afirma o advogado.
Especialistas criticam ainda o fato de a mudança nas regras ser estabelecida por meio de instrução normativa. “Por mera portaria busca-se a ampliação dos institutos da solidariedade tributária e redirecionamento da certidão de dívida ativa”, critica Breno de Paula, do escritório Arquilau de Paula Advogados Associados. Esses dois pontos, acrescenta, têm “rígidos requisitos” previstos pelo Código Tributário Nacional (CTN). Constam nos artigos 124 e 135.
Fonte: Valor Econômico- 22/11/2018-
Receita pretende ampliar hipóteses para inclusão de sócio em cobrança