Na esteira da abertura do prazo para a repatriação de recursos no exterior, a Receita Federal vai abrir uma sessão de perguntas e respostas para orientar os contribuintes que optarem pela regularização. A janela de oportunidade para a apresentação da declaração e o pagamento da multa e impostos devidos começa nesta segunda-feira (4), mas ainda há muitas dúvidas em relação à regulamentação da lei que permitirá a repatriação do dinheiro não declarado que está fora do País.
A expectativa dos escritórios de advocacia é de que o Fisco possa dirimir as incertezas com o questionário até o fim do prazo da regularização, previsto para 31 de outubro. Em caso de necessidade, já há demanda para que o órgão edite ato declaratório interpretativo, para afastar a insegurança jurídica e questionamentos posteriores na Justiça.
De acordo com advogados ouvidos pelo Broadcast, serviço de informações em tempo real da Agência Estado, já há muita procura de clientes sobre o programa, principalmente pessoas físicas de alta renda e empresas com atuação no exterior, e os casos estão sendo analisados individualmente. Há uma preocupação de que o contribuinte tenha documentos provando a origem e a titularidade dos recursos, para evitar problemas em um segundo momento.
O governo espera arrecadar R$ 35 bilhões com o programa de regularização, que hoje é um das principais apostas da equipe econômica para reforçar o caixa e ajudar a diminuir o rombo das contas públicas previsto para este ano. A Receita acredita que a maior parte do dinheiro entrará mais para frente, à medida que as dúvidas forem sendo resolvidas e o processo fique mais claro para os contribuintes. Na sexta-feira, representantes da Receita e do Banco Central apresentaram, em São Paulo, detalhes do programa em seminário organizado pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban).
O professor de Direto Financeiro da Universidade de São Paulo, Heleno Torres, avaliou que a regulamentação ficou muito boa e que a as dúvidas são naturais. “É impossível ter um caso igual ao outro. Ao longo do processo, alguns esclarecimentos podem ser objetos de atos declaratórios”, disse ele, enfatizando que a Receita tem todo o interesse em facilitar a compreensão dos contribuintes para aumentar a adesão.
Segundo Torres, que trabalhou na elaboração da lei, tem sido observado pelos escritórios de advocacia grande interesse na repatriação. Mas ele acredita que a adesão será progressiva e gradual até o final do prazo. No Chile, o programa de repatriação atraiu, nos três primeiros meses, cerca de 200 contribuintes e, ao afinal, a adesão chegou a 3 mil.
Torres disse que ouviu relatos de empresários que vão fazer a adesão ao programa e trazer o dinheiro de volta ao País para enfrentar dificuldades financeiras das suas empresas, inclusive para pagar despesas trabalhistas de funcionários demitidos.
Segundo o sócio do escritório Mattos Filho Advogados, Alessandro Fonseca, a demanda pela repatriação tem sido altíssima porque os contribuintes se conscientizaram que essa é a única oportunidade para regularizar o problema de evasão de divisas, já que a lei dá anistia penal àqueles que aderirem ao programa e pagarem os tributos e a multa devidas. “Ou resolve agora ou não resolve mais”, ressaltou.
O problema ganhou urgência com os acordos internacionais de trocas de informação que estão sendo assinados, inclusive pelo Brasil, que permitirão rastrear mais facilmente os recursos de origem não declarada. Fonseca disse que ainda há dúvidas na regulamentação que precisam ser resolvidas, sobretudo, para aqueles contribuintes que tinham recursos não declarados no exterior, mas o dinheiro já foi usado e não há saldo nas contas no exterior no dia 31 de dezembro de 2014, que é a data de corte do programa para a regularização. Esses contribuintes têm interesse na anistia penal, já que ao fazer a declaração há a confissão do crime de evasão fiscal. Para os casos de dinheiro, Fonseca alertou que é muito difícil presumir um valor nessa data de corte, como exige a Receita.
Ele está orientando os seus clientes a fazerem a adesão e o pagamento logo dos valores devidos, principalmente por causa da confissão do crime. A pena por evasão de divises é de dois a seis anos.
Exposição. Para o advogado Victor Schmidt, tributarista do escritório Siqueira Castro, os contribuintes que optarem por aderir aos benefícios têm que ter farta documentação comprovando a origem e titularidade dos recursos, para evitar serem excluídos do programa em um segundo momento.
Ele pondera que os contribuintes ficarão expostos e, se não conseguirem comprovar a licitude dos bens, poderão ter que pagar tributos maiores e multas que chegam a 150% do imposto devido, além de sofrerem investigações penais. “A lei impõe uma série de restrições e ficou um pouco ambígua. Já conseguimos antever um possível contencioso a partir das exclusões de contribuintes do programa”, acredita.
Apesar disso, ele lembra que há o risco de quem não aproveitar a janela para repatriar recursos ser “pego” pela Receita Federal depois. “O mundo está se tornando cada vez menor e utilizar recursos lá fora sem ser rastreado é cada vez mais difícil”, acrescenta.
A Receita Federal cobrará 30% (imposto de 15%, mais multa de mesmo porcentual) sobre o valor de bens e recursos no exterior agora regulamentados. Só podem ser declarados bens de origem lícita, mas os contribuintes serão “perdoados” de crimes tributários, como sonegação fiscal e remessa ilegal. Não é necessário entrar com os recursos no Brasil, eles poderão continuar aplicados no exterior.
Fonte: O Estado de S. Paulo- 5/4/2016-
http://www.seteco.com.br/midia/list.asp?id=14592