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Qual o impacto das decisões do STF sobre as sentenças que afastam a exigência de tributos?

O Supremo Tribunal Federal (STF) vai bater o martelo sobre uma das maiores controvérsias do direito tributário. Os ministros, por unanimidade, decidiram analisar, em repercussão geral, o limite da coisa julgada nos casos em que o contribuinte obtém decisão judicial favorável ao não recolhimento de determinado tributo, mas cuja exigência é declarada constitucional, posteriormente, pelo STF, em ação direta de inconstitucionalidade (ADI).

Com o julgamento, que ainda não tem data marcada, a Corte dará uma orientação que deverá ser seguida pelos tribunais brasileiros. Iniciada no dia 4 de março, a votação sobre a existência de repercussão geral foi finalizada na quinta-feira (24/3) no plenário virtual do STF, e divulgada no dia seguinte.

No recurso escolhido como paradigma (RE 949297), o contribuinte obteve decisão em mandado de segurança para deixar de recolher a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), instituída pela Lei 7.689/88. O processo transitou em julgado em 1992. Em 2007, o Supremo, porém, declarou constitucional a exigência da contribuição (ADI 15).

De acordo com o ministro Edson Fachin, relator do caso, o plenário do STF também terá que discutir neste recurso a vigência e a aplicabilidade da Súmula 239 da Corte, segundo a qual a “ decisão que declarada indevida a cobrança do imposto em determinado exercício não faz coisa julgada em relação aos posteriores”.

“O tema revela uma tese de significativo impacto nas finanças públicas da União, porquanto envolve a exigibilidade de tributos no curso de largo período de tempo”, afirma o ministro Fachin, na manifestação (leia a íntegra abaixo). Segundo o ministro, “a depender do deslinde da controvérsia, pode haver um desequilíbrio concorrencial em uma infinidade de mercados, visto que parcela dos contribuintes, com equivalente capacidade contributiva, estaria sujeita a cargas tributárias diversas, por atuação do Estado-Juiz”.

O relator ainda diferencia o tema desta repercussão geral do tratado no RE 730.462 de relatoria do ministro Teori Zavascki, em que a Corte discutirá a relativização da coisa julgada fundada em norma posteriormente declarada inconstitucional em sede de controle concentrado, após o prazo da ação rescisória.

Controle difuso

O Supremo também deve aceitar, esta semana, julgar em repercussão geral um outro aspecto do limite das sentenças judiciais que afastam a exigência de tributos.

A partir de um litígio entre a União e a Braskem (RE 955227), os ministros definirão se as decisões da Corte Superior em controle difuso de constitucionalidade (inclusive as proferidas em em repercussão geral) cessam ou não os efeitos futuros de sentenças transitadas em julgado que reconheceram a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade do tributo.

Na manifestação, o ministro Roberto Barroso, relator do caso, classificou a matéria como uma das “controvérsias constitucionais mais importantes sobre coisa julgada ainda pendente de manifestação por esta Corte”.

Os ministros  têm até a quinta-feira (31/3) para se manifestarem sobre a existência de repercussão geral da matéria. Mas já há maioria de votos a favor.

No caso, a Braskem impetrou mandado de segurança para declarar nula uma cobrança de CSLL, no período de 2001 a 2003. A empresa alega que tem uma sentença favorável ao afastamento da exigência. A decisão judicial foi proferida em outro processo, transitado em julgado em 1992.

Em primeira e segunda instâncias, a Braskem obteve decisões que impediam a Receita Federal de lhe exigir a contribuição diante do trânsito em julgado do processo em que foi reconhecido o direito da empresa incorporada de não recolher a CSLL instituída pela Lei 7.689/1988, em razão de sua inconstitucionalidade.

Apesar de os tribunais entenderem que a lei era inconstitucional, o Supremo declarou a norma constitucional por entender que não haveria necessidade de a exigência ser prevista em lei complementar. Para a Fazenda Nacional, a empresa teria que recolher o tributo nos anos posteriores às decisões reiteradas do Supremo. Isso porque “os efeitos futuros da coisa julgada teriam sido sustados e o tributo passado a ser novamente exigível”.
 
Leia a íntegra da manifestação do ministro Fachin:

O Senhor Ministro Edson Fachin (Relator):

Trata-se de recurso extraordinário interposto em face de acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, cuja ementa se reproduz a seguir:
PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO. LEI 7.689/88. MANDADO DE SEGURANÇA. OFENSA À COISA JULGADA. APELAÇÃO PROVIDA.

1. A sentença prolatada nos autos do mandado de segurança 127/89/CE declarou a inconstitucionalidade da lei 7.689/88 tendo sido mantida por esta Corte com o trânsito em julgado […] 3. Apelação provida. (eDOC 2, p. 209)

No recurso extraordinário, interposto com fundamento no art. 102, III, a, da Constituição da República, aponta-se ofensa aos arts. 3º, IV; 5º, caput, II e XXXVI; 37; e 150, VI, c, do Texto Constitucional.

Nas razões recursais, sustenta-se que a coisa julgada formada em mandado de segurança em matéria tributária não alcança os exercícios seguintes ao da impetração, nos termos da Súmula 239 do STF.

Ademais, alega-se que a coisa julgada em seara tributária pode ser relativizada, em decorrência da superveniência de novos parâmetros normativos ou de decisão do Supremo Tribunal Federal que considere constitucional o diploma normativo tido por inconstitucional pela decisão passada em julgado.

A Vice-Presidência do Tribunal Regional Federal admitiu o recurso extraordinário, por considerar preenchidos todos os pressupostos de admissibilidade.

É o relatório.

Submeto a matéria ao Plenário Virtual, com a finalidade de que seja analisada a existência de repercussão geral.

O tema jurídico controvertido é o limite da coisa julgada em âmbito tributário, na hipótese de o contribuinte ter em seu favor decisão judicial transitada em julgado que declare a inexistência de relação jurídico-tributária, ao fundamento de inconstitucionalidade incidental de tributo, por sua vez declarado constitucional, em momento posterior, na via do controle concentrado e abstrato de constitucionalidade exercido pelo STF.

No caso concreto, trata-se de contribuinte que pretende obter ordem judicial que lhe assegure o direito de continuar a não recolher a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, instituída pela Lei 7.689/88, com base em decisão proferida em mandado de segurança ajuizado em 1989 e com trânsito em julgado em 1992, cujo fundamento é a inconstitucionalidade do diploma legal precitado por ofensa ao princípio da irretroatividade.

Ocorre que, de modo superveniente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, declarou a constitucionalidade da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), tal como prevista na Lei 7.689/88, no bojo da ADI 15, de relatoria do Ministro Sepúlveda Pertence, DJe 31.08.2007, a qual restou com a seguinte ementa:

I. ADIn: legitimidade ativa: “entidade de classe de âmbito nacional” (art. 103, IX, CF): compreensão da “associação de associações” de classe. Ao julgar, a ADIn 3153-AgR, 12.08.04, Pertence, Inf STF 356, o plenário do Supremo Tribunal abandonou o entendimento que excluía as entidades de classe de segundo grau – as chamadas “associações de associações” – do rol dos legitimados à ação direta. II. ADIn: pertinência temática. Presença da relação de pertinência temática, pois o pagamento da contribuição criada pela norma impugnada incide sobre as empresas cujos interesses, a teor do seu ato constitutivo, a requerente se destina a defender. III. ADIn: não conhecimento quanto ao parâmetro do art. 150, § 1º, da Constituição, ante a alteração superveniente do dispositivo ditada pela EC 42/03. IV. ADIn: L. 7.689/88, que instituiu contribuição social sobre o lucro das pessoas jurídicas, resultante da transformação em lei da Medida Provisória 22, de 1988. 1. Não conhecimento, quanto ao art. 8º, dada a invalidade do dispositivo, declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal, em processo de controle difuso (RE 146.733), e cujos efeitos foram suspensos pelo Senado Federal, por meio da Resolução 11/1995. 2. Procedência da arguição de inconstitucionalidade do artigo 9º, por incompatibilidade com os artigos 195 da Constituição e 56, do ADCT/88, que, não obstante já declarada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 150.764, 16.12.92, M. Aurélio (DJ 2.4.93), teve o processo de suspensão do dispositivo arquivado, no Senado Federal, que, assim, se negou a emprestar efeitos erga omnes à decisão proferida na via difusa do controle de normas. 3. Improcedência das alegações de inconstitucionalidade formal e material do restante da mesma lei, que foram rebatidas, à exaustão, pelo Supremo Tribunal, nos julgamentos dos RREE 146.733 e 150.764, ambos recebidos pela alínea b do permissivo constitucional, que devolve ao STF o conhecimento de toda a questão da constitucionalidade da lei.

Feito esse breve relato, parece evidente a repercussão geral da presente matéria de índole eminentemente constitucional, na medida em que está em questão a própria arquitetura do sistema de controle de constitucionalidade pátrio, tendo em vista a imbricada relação entre as modalidades abstrata e concreta de fiscalização da constitucionalidade dos atos normativos.

Sob o ponto de vista jurídico, o tema extrai sua relevância da compreensão que se dará aos limites da garantia da coisa julgada em seara tributária, à luz do princípio da segurança jurídica.

Além disso, deverá ser discutida a vigência e a aplicabilidade da Súmula 239 desta Corte, que assim preconiza: Decisão que declara indevida a cobrança do imposto em determinado exercício não faz coisa julgada em relação aos posteriores. Nesses termos, a potencial contrariedade do acórdão recorrido a enunciado sumular do STF possui repercussão geral presumida, por força de lei.

No âmbito econômico, o Tema revela uma tese de significativo impacto nas finanças públicas da União, porquanto envolve a exigibilidade de tributos no curso de largo período de tempo. Ademais, a depender do deslinde da controvérsia, pode haver um desequilíbrio concorrencial em uma infinidade de mercados, visto que parcela dos contribuintes, com equivalente capacidade contributiva, estaria sujeita a cargas tributárias diversas, por atuação do Estado-Juiz.

Enfim, na esteira social, coloca-se em questão o próprio consentimento fiscal entre os concidadãos da comunidade política constituída em pacto constituinte, sob o prisma da equidade tributária horizontal. Por outro lado, correlaciona-se a presente temática com legítimas expectativas de previsibilidade dos atos jurisdicionais por parte do corpo social.

Nesta manifestação, também se torna cabível fazer, de plano, uma distinção entre o presente feito e o assentado no Tema 733 da sistemática da repercussão geral (Relativização da coisa julgada fundada em norma posteriormente declarada inconstitucional em sede de controle concentrado, após o prazo da ação rescisória.), cujo recurso-paradigma é o RE-RG 730.462, de relatoria do Ministro Teori Zavascki, DJe 09.09.2015.

Verifica-se, a propósito, que a situação deste recurso extraordinário é diametralmente oposta ao Tema supracitado, o que pode levar a soluções jurisdicionais distintas, em que pese a lógica vinculação às razões de decidir do referido paradigma (leading case).

Ante o exposto, manifesto-me pela existência de repercussão geral da questão constitucional aqui exposta e a submeto à apreciação dos demais Ministros integrantes desta Corte.

Publique-se.

Brasília, 04 de março de 2016.

Ministro Edson Fachin

28/3/2016

Fonte- http://jota.uol.com.br/qual-o-impacto-das-decisoes-stf-sobre-sentencas-que-afastam-exigencia-de-tributos

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