Pedro Bentes Pinheiro Filho: empresa não teve direito a apresentar defesa
Um microempresário do Pará teve que ir à Justiça depois de ter contas bancárias penhoradas para o pagamento de dívidas trabalhistas da antiga Varig. O problema surgiu com um relatório produzido pelo Núcleo de Pesquisa Patrimonial do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) do Rio de Janeiro que, de forma indireta, relacionou seu negócio ao grupo econômico da falida companhia aérea. Seu nome foi incluído em processos contra a empresa que correm em 80 varas da capital fluminense.
A mesma situação aconteceu com uma empresa de ônibus de Belém (PA), que esteve prestes a ter bens e contas bloqueadas para fazer jus a dívidas de uma outra companhia de transporte que faliu. Para os dois casos, foram obtidas liminares contra os efeitos desses relatórios.
Criados em 2014 pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), os núcleos foram implantados pelo TRTs para a identificação de bens de devedores e o pagamento de dívidas trabalhistas. Porém, advogados alegam que alguns ofícios extrapolam os dados obtidos e têm tomado conclusões precipitadas sobre o alcance desses grupos econômicos, sem possibilidade de defesa prévia.
A questão já foi levada ao Tribunal Superior do Trabalho (TST). O julgamento foi iniciado, mas ainda não há decisão. A União recorreu do mandado de segurança obtido no Órgão Especial do TRT do Rio que suspendeu os efeitos do relatório contra o empresário do Pará, relacionado à Varig. O relatório reproduz jurisprudência e doutrina, elencando uma série de pessoas jurídicas e uma física como responsáveis solidários por todas as dívidas do grupo econômico.
No TRT, os desembargadores consideraram abusiva a expedição de ofício da 43ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, que encomendou o relatório ao núcleo, sugerindo a inclusão do empreendimento como responsável solidário da Varig e da Fundação Ruben Berta.
A conclusão veio do fato de a microempresa possuir ações de uma sociedade anônima (chamada Iucap) que, por sua vez, era uma das sócias de uma outra empresa (Interunion), em liquidação extrajudicial, que possuía 6,93% de participação na Varig.
Porém, para os desembargadores, “não há qualquer indício de que houvesse ingerência ou participação, por parte das aludidas empresas, na administração das executadas (Varig e Fundação Ruben Berta)”.
No TST, por ora, apenas a ministra Maria Helena Mallmann votou. Ela considerou no julgamento do recurso (RO 884-55.2015.5.01.00 00), que o ato coator é administrativo e opinativo e decidiu por conhecer o recurso e julgá-lo extinto sem julgamento do mérito. A análise foi suspensa por pedidos de vista dos ministros Vieira de Mello e Alberto Bresciani, que destacou a oportunidade para se discutir o alcance desses órgãos.
A advogada do microempresário do Pará, Carolina Tupinambá Faria, do Tupinambá Advogados, afirma que entrou com o mandado de segurança quando seu cliente passou a ter as contas penhoradas. “O meu cliente nada tem a ver com a Varig e com base nesse relatório produzido começou a ter suas contas bloqueadas pelas 80 varas do trabalho do Rio”, diz a advogada, que assessora outras empresas em situações semelhantes.
A companhia de ônibus que foi alvo de um relatório produzido na 15ª Vara de Belém do Pará, enviado posteriormente a todas as varas do Estado para que a empresa fosse executada nos processos, só conseguiu suspender a ordem com um pedido de providências na Corregedoria do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) do Pará (nº 00101124-05.2017.5.08.0000).
Ao analisar o caso, o corregedor regional Walter Roberto Paro entendeu que a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica “sem a garantia do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal deve ser repelida por flagrante inconstitucionalidade”.
O advogado que assessora a companhia de ônibus, Pedro Bentes Pinheiro Filho, sócio do Silveira, Athias, Soriano de Mello, Pinheiro, Guimarães & Scaff – Advogados, afirma achar “uma extravagância dar poder ao Judiciário de investigação fora do devido processo legal”. Nesse caso, segundo o advogado, a juíza não teria nem pedido autorização à corregedoria. “Ela fez as investigações por conta própria e produziu juízo de valor, sem ouvir a empresa”, diz.
Segundo a defesa da companhia, a empresa não faz parte do mesmo grupo econômico da falida. O que houve, de acordo com Pinheiro Filho, é que o dono da devedora fez uma partilha em vida de suas empresas e citada não possuía sócios em comum há mais de 10 anos. “Essas questões já foram levadas ao Judiciário, que reconheceu que não houve fraude”, diz. O advogado também ajuizou no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) um pedido de controle administrativo sobre o caso, que ainda não foi julgado.
Procurado pelo Valor, o TRT do Pará informou por nota que a corregedoria é impedida de manifestar-se sobre qualquer processo pendente de julgamento, nos termos do artigo 28 do Código de Ética da Magistratura. O TRT do Rio não deu retorno até o fechamento da edição.
Fonte: Valor Econômico- 10/10/2017-