Uma liminar da Justiça Federal da 3ª Região (São Paulo) permitiu que uma empresa do setor de comércio exterior possa incluir no novo Refis multa qualificada – aplicada quando o Fisco constata fraude, sonegação ou conluio do contribuinte.
A qualificação eleva o valor da penalidade de 75% para 150% sobre o montante que deixou de ser recolhido. No caso concreto, com os descontos do Refis, o valor da multa cai de R$ 6 milhões para R$ 2 milhões. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) vai recorrer.
A liminar (5011697-48.2017.4.03.6100) contraria a Instrução Normativa da Receita Federal nº 1.711, que regulamenta o Programa Especial de Regularização Tributária (Pert). A norma veda a inclusão de multa qualificada no Refis.
Segundo advogados, a disposição da IN extrapola o texto da Medida Provisória nº 783, que instituiu o Pert. A MP somente proíbe a inclusão de multa por fraude, sonegação ou conluio caracterizada “após decisão administrativa definitiva”.
No caso da empresa de comércio exterior, não havia decisão administrativa definitiva que determinasse o pagamento da multa qualificada. A empresa foi autuada por supostamente fazer importação por conta e ordem apenas para reduzir a carga tributária.
Segundo o advogado Pedro Guilherme Modonese Casquet, do Araújo e Policastro Advogados, que representa a empresa no processo, o dispositivo da MP que faz essa diferenciação em relação à multa qualificada já é inconstitucional. E a IN é mais grave porque restringe ainda mais o texto.
Ao analisar o mandado de segurança da empresa, o juiz da 14ª Vara Cível Federal de São Paulo quis ouvir a União antes de proferir a decisão. “A Fazenda alegou que, se fosse concedida liminar, seria uma medida injusta porque um contribuinte que praticou fraude teria um benefício fiscal”, afirma Casquet.
“Defiro a liminar requerida para assegurar às impetrantes o direito de aderir ao parcelamento de que trata a MP 783/2017, conquanto o único motivo seja a restrição imposta pela Instrução Normativa RFB 1.711/2017, considerando que não houve decisão administrativa definitiva em relação aos autos de infração”, afirma o magistrado na decisão.
A liminar é a primeira nesse sentido da qual se tem notícia. “Ela sinaliza para todas as empresas impedidas de incluir multa qualificada no Pert que é possível conseguir via Judiciário fazer essa inclusão. Especialmente agora que o prazo de adesão ao Pert foi prorrogado para 29 de setembro”, diz Casquet.
Também para o advogado Leo Lopes, do W Faria Advogados, a decisão indica que todas as empresas que querem incluir esse tipo de débito, ainda em discussão, podem conseguir decisão judicial semelhante. “Mas orientamos que, se quiserem fazê-lo, é melhor propor logo um mandado de segurança porque a Receita precisa ser indiciada antes da adesão ao Pert”, diz.
O advogado Paulo Camargo Tedesco, sócio Mattos Filho, afirma que, ao extrapolar a MP a Receita Federal desconsidera a discussão administrativa. “O devido processo legal, a ampla defesa e o direito ao contraditório – que é o direito do contribuinte de discutir a cobrança fiscal -, precisam ser considerados”, diz.
Por nota, a PGFN da 3ª Região disse que vai recorrer da liminar. Isso porque a decisão “afronta a IN 1.711, que regulamenta a MP 783, estabelecendo os procedimentos para a adesão ao Pert perante a Receita Federal”.
Quando a IN foi editada, especialistas em tributação já diziam que o dispositivo sobre a multa qualificada levaria as empresas à Justiça. Na época, a Receita disse ao Valor que, na prática, o dispositivo da IN veda a inclusão da multa qualificada “após decisão administrativa definitiva”. O órgão afirmou que, se o contribuinte desistir do processo e confessar a dívida para incluir no Pert, “há definitividade”. Assim, seria como se houvesse uma decisão administrativa definitiva.
Fonte: Valor Econômico- 4/9/2017-