O governo publicou no Diário Oficial da União desta quinta-feira (19/4) a portaria nº 153/2018, que altera o regimento interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Entre outras mudanças, o dispositivo determina uma análise prévia de admissibilidade em repetitivo para recursos com temas idênticos, de forma que um caso é destacado como paradigma e a decisão é aplicada aos demais. Ainda, o texto altera prazos e atribuições de turmas e presidentes do tribunal administrativo, bem como concentra no coordenador-geral de Gestão do Julgamento a tarefa de fiscalizar se os conselheiros estão respeitando as regras do regimento. Ademais, a portaria estende de seis para oito anos o tempo máximo que presidentes e vice-presidentes de podem ficar no tribunal. O texto entra em vigor imediatamente.
A alteração no regimento já era esperada pela maioria dos conselheiros ouvidos pelo JOTA. Em janeiro deste ano, o Ministério da Fazenda alterou por decreto a estrutura organizacional do tribunal administrativo. De acordo com a pasta, as mudanças divulgadas hoje visam a “modernizar a área de gestão e aperfeiçoar dispositivos inerentes à área judicante”.
A principal novidade trazida pela portaria é o exame de conhecimento aplicado para um lote de processos, com base na análise de um caso destacado como paradigma por ser considerado o mais representativo da controvérsia tributária. O paradigma será sorteado entre as turmas do tribunal e, dentro do colegiado escolhido, será designado aleatoriamente à relatoria de um conselheiro. Caso a defesa do contribuinte ou a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) discordem da análise aplicada a um processo, ambos podem questioná-la no tribunal. A sistemática de conhecimento em caráter repetitivo já era aplicada no Carf, mas a opção ficava a cargo dos presidentes dos colegiados.
Interlocutores ouvidos pelo JOTA opinaram que a sistemática de admissibilidade em bloco ocorre em tribunais superiores e deve aumentar a produtividade do Carf, por acelerar a avaliação de processos mais comuns e com jurisprudência mais consolidada. Porém, alguns advogados consideraram vaga a redação do artigo que determina o procedimento. Por exemplo, restaram dúvidas quanto a quem reuniria os processos em lotes e quem definiria o paradigma. Questionado, o Ministério da Fazenda não se manifestou sobre o tema até a conclusão desta matéria.
“Será que os casos reunidos realmente serão iguais? O Carf é um tribunal técnico que analisa os fatos, não é como tribunais superiores, que não revisam provas. E se uma mesma turma ficar responsável por julgar todos os casos de um determinado tema, vai ficar mais difícil de haver divergência”, comentou um advogado.
Além disso, outro profissional destacou que, se a montagem dos blocos para julgamento não for muito cuidadosa, o tribunal corre o risco de ter todo o bloco considerado nulo. Outro interlocutor ponderou que, como a redação ficou vaga, a aplicação da sistemática dependerá da prática adotada na 1ª Turma da Câmara Superior, liderada pela presidente do tribunal administrativo, conselheira Adriana Gomes Rêgo.
Coordenação
A portaria também criou a Coordenação-Geral de Gestão do Julgamento. De acordo com o Ministério da Fazenda, a equipe agregará funções anteriormente exercidas pelas secretarias de câmara, coordenará a divulgação da jurisprudência, planejará os sorteios dos processos e exercerá atividades relacionadas à sugestão de súmulas e resoluções para uniformização das decisões.
A nova redação também atribui ao coordenador-geral de Gestão do Julgamento a competência de controlar se os julgadores estão respeitando os prazos regimentais. Caso a conduta de descumprir o regimento seja reiterada por doze meses a partir da primeira ocorrência notificada, o julgador pode ser desligado do Carf.
Nas duas primeiras vezes em que o conselheiro deixar de observar as regras, o coordenador notificará o relator do processo ou o redator designado para o voto vencedor de que a conduta pode culminar na perda de mandato. Na terceira vez, o coordenador deve avisá-lo de que ficou caracterizada a hipótese de perda de mandato. As notificações são encaminhadas à representação do conselheiro, seja a Receita Federal ou as confederações.
Segundo pessoas próximas ao tribunal administrativo, até agora essa verificação era dispersa e poucos conselheiros eram cobrados por desrespeito a prazos e, com as mudanças, o monitoramento deve se intensificar. Alguns interlocutores questionam se o tribunal estenderá o mesmo rigor de fiscalização a todos os julgadores. “O receio é que peguem mais pesado com conselheiros do contribuinte ou com os fazendários que votam a favor do contribuinte”, afirmou uma fonte ouvida pelo JOTA.
Outro advogado considerou a centralização positiva. Como os critérios para as notificações foram estabelecidos de forma mais objetiva, o profissional acredita que será difícil recomendar a saída de conselheiros de forma discricionária.
Novos prazos e obrigações
Entre as inúmeras mudanças inauguradas pela portaria, advogados apontaram principalmente que os presidentes e vice-presidentes de turma ou de câmara poderão exercer um mandato adicional. Com isso, o tempo máximo deles no Carf passa de seis para oito anos. Além disso, a nova redação prevê que presidentes de câmara, de seção ou do tribunal podem convocar sessões extraordinárias.
As alterações também dizem respeito ao impedimento de conselheiros. Antes, eram considerados suspeitos julgadores que, nos últimos cinco anos, participaram de escritórios que defenderam a empresa interessada no Carf. O prazo foi reduzido para dois anos. Em casos de impedimento, antes o processo era sorteado novamente entre os integrantes da mesma turma. Agora, a nova distribuição será realizada entre conselheiros das turmas competentes na mesma seção de julgamento. Na Câmara Superior, o novo sorteio continua sendo entre membros da mesma turma.
O dispositivo dividiu opiniões. Para o conselheiro Carlos Augusto Daniel Neto, que é representante dos contribuintes e vice-presidente da 2ª Turma da 4ª Câmara da 3ª Seção, a mudança é positiva, “pois evita que as turmas fiquem com turnos desfalcados”. “O Carf precisa de bons nomes na área tributária, e estes nomes estão justamente nos escritórios que atuam no Carf”, afirmou.
Já o tributarista Wernerson Hosang, sócio do Hosang Advocacia Tributária, considerou a medida arriscada. “A redução do prazo foi extremada: 60% do tempo de uma só vez. Se cinco anos pareceu exagero – e de fato era, dois anos mostra-se insuficiente para dissipar com eficiência, a meu juízo, qualquer espécie de vínculos ou relações eventualmente consideradas suspeitas”, disse.
O advogado complementa: “uma das prováveis causas da mudança é a dificuldade encontrada pela Instituição para nomear conselheiros que não se enquadrem nas condições de suspeição do Regimento, pelo longo período de cinco anos”.
Segundo advogados, o regimento também obrigará os presidentes de turma a dar preferência para processos quando a defesa estiver presente na sessão e o advogado se inscrever para acompanhamento ou sustentação oral. Muitos profissionais comemoraram a mudança, e criticaram presidentes que seguem a ordem da pauta independentemente da presença da defesa. Ainda de acordo com advogados, a partir de agora o tribunal administrativo deve avisar no site com antecedência sobre a retirada de processos de pauta.
Por fim, os presidentes de turma terão cinco dias úteis para formalizar as atas de julgamento e o tribunal terá mais dois para publicá-las no site. O regimento também passou a determinar prazo de 60 dias para os relatores se pronunciarem sobre a admissibilidade de embargos.
19/4/2018
Fonte- https://www.jota.info/tributos-e-empresas/tributario/carf-muda-regimento-promove-admissibilidade-em-bloco-e-altera-prazos-e-atribuicoes-19042018