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Carf mantém distribuição desproporcional de lucros

Os escritórios de advocacia e as empresas limitadas ganharam um importante precedente no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) para validar uma prática muito comum no mercado: a distribuição desproporcional de lucros entre sócios. A modalidade leva em conta critérios estabelecidos pela companhia, como participação societária e desempenho.

A decisão, por maioria de votos, favorece o Pinheiro Neto Advogados, autuado por distribuição de lucros realizada no ano de 2011. É a primeira que se tem notícia após a reformulação do Carf, em decorrência da Operação Zelotes – que investiga um esquema de corrupção no órgão. Com as mudanças, segundo advogados tributaristas, os contribuintes passaram a perder causas com mais frequência no tribunal administrativo.

A distribuição desproporcional de lucros é permitida pelo artigo 1.007 do Código Civil. O Pinheiro Neto foi autuado, porém, porque no entendimento da Receita Federal não haveria previsão em contrato social nem prova de que os sócios concordaram com a prática, por meio de uma ata de reunião.

Na autuação, a fiscalização considera os valores pro labore e cobra contribuição previdenciária com alíquota de 20% (como contribuinte individual). Sobre os lucros distribuídos de forma desproporcional não incide, normalmente, Imposto de Renda e contribuição previdenciária.

No Carf, o Pinheiro Neto Advogados defendeu a regularidade da operação. A defesa afirmou que o artigo 1.007 do Código Civil permite a prática e que o contrato social previa a distribuição de lucros levando em consideração a participação e a performance dos sócios.

A banca ainda argumentou que houve a comprovação de que os sócios concordaram com a distribuição desproporcional. Foram apresentados e-mails dos sócios aceitando os cálculos realizados pelo comitê gestor. Para o escritório, não haveria necessidade de reunião entre os sócios e a elaboração de uma ata.

No julgamento da 1ª Turma Ordinária da 4ª Câmara da 2ª Seção, a maioria dos conselheiros (cinco votos a dois) entendeu que os deveres legais para possibilitar a distribuição dos lucros foram cumpridos pelo escritório. Eles aceitaram os e-mails com a anuência dos sócios, que comprovam o quórum para autorizar a operação (processo nº 18088.720004/2016-26).

Para os conselheiros, porém, bastaria a previsão feita em contrato social, conforme os artigos 4º e 6º do Provimento nº 169, de 2015, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), de aplicação obrigatória aos escritórios, conforme determina o Estatuto da Ordem (Lei nº 8.906/94).

O caso do Pinheiro Neto demonstra um aprofundamento na análise de distribuição desproporcional de lucros pela fiscalização, segundo o advogado Diego Aubin Miguita, do Vaz Buranello Shingaki & Oioli Advogados. “Foi necessária a materialização da aprovação dos sócios com relação à distribuição desproporcional. Não bastou a previsão em contrato social”, explica.

Antes da reformulação do Carf, os julgamentos sobre o tema eram, em geral, favoráveis aos contribuintes. Nas autuações de empresas ou escritórios de advocacia, a Receita Federal defende, normalmente, que houve simulação. Ou seja, que existiu uma remuneração disfarçada de participação desproporcional de lucros como forma de evitar tributação.

Foi o que a fiscalização alegou em duas autuações analisadas em 2014 pelo Carf, que envolvem o Ernesto Borges Advogados. O entendimento foi o de que todo o trabalho prestado pelo escritório foi realizado pelos próprios sócios e que a banca, ao partilhar os resultados de acordo com a produção de cada um, estaria remunerando os advogados pelos serviços. Os dois autos, porém, foram cancelados pelo tribunal administrativo. Segundo as decisões, se a distribuição de lucros foi efetuada com suporte na contabilidade, que se mostrou confiável, não haveria como alterar a natureza dos pagamentos (processos nº 2301-003. 375 e nº 2302-003.211).

No caso do Pinheiro Neto, porém, a Receita Federal entendeu que não houve irregularidade e não se tratava de remuneração. Mas considerou que não foram cumpridos todos os requisitos necessários, o que foi rejeitado pela maioria dos conselheiros.

De acordo com o advogado Caio Taniguchi, do escritório Bichara Advogados, o uso da distribuição desproporcional de lucros é praxe nos escritórios de advocacia. “Não conheço nenhum grande escritório que não faça assim”, afirma.

Para evitar autuações, o advogado recomenda que os escritórios deixem, de forma clara e formalizada, os critérios utilizados para a distribuição desproporcional de lucros. “Se não houver uma ata de deliberação, que exista algum tipo de documento no arquivamento interno, ou até mesmo e-mails que comprovem isso”, diz Taniguchi.

Procurado pelo Valor, o Pinheiro Neto Advogados informa, em nota que “o escritório defendeu a regularidade do modelo de distribuição de lucros adotado, documentalmente demonstrado e de acordo com a exigência legal, e obteve a anulação do auto de infração elaborado, diante da correção de sua atitude”. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), por sua vez, afirma, também por nota, que deve “aguardar a formalização do acórdão para analisar o cabimento de recurso no caso”. A defesa do escritório Ernesto Borges Advogados também foi procurada, mas não deu retorno até o fechamento da edição.

Fonte: Valor Econômico- 20/8/2018-

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