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A Lei da Segurança Jurídica pegou

As disposições sobre segurança jurídica e eficiência na criação e na aplicação do direito público incluídas na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), rapidamente, “colaram” nas esferas administrativa, controladora e judicial, encaminhando uma transformação no plano da responsabilidade estatal.

As diretrizes da nova lei avançam para que as normas sejam aplicadas considerando situações concretas. Com sua aplicação, uma decisão deve ir além dos conceitos jurídicos abstratos e necessita estimar suas consequências práticas de acordo com o cenário fático e o contexto a que está inserida.

O primeiro passo para aumentar a previsibilidade e a segurança jurídica nas relações entre o Estado e a sociedade se deu com o PL 349/2015 do Senado, aprovado, finalmente, na Câmara dos Deputados sob o nº 7.448/2017 e submetido à sanção presidencial em abril deste ano.

As diretrizes da nova lei avançam para que as normas sejam aplicadas considerando situações concretas

Durante o período de análise do PL pelo presidente da República, foi travada verdadeira batalha no cenário jurídico brasileiro, com a tomada de posições bastante antagônicas. De um lado, diversas associações empresariais, a academia e prestigiados juristas apelidaram o PL de “Lei da Segurança Jurídica” e clamaram pela sanção integral de seu texto. Em outro flanco, associações de juízes e do Ministério Público, a Procuradoria-Geral da República e o Tribunal de Contas da União (TCU) reclamaram repúdio ao projeto.

Como sabemos, o presidente sancionou, com vetos parciais, a Lei 13.655/2018, que passou a vigorar imediatamente, com exceção do art. 29, que entrará em vigor no prazo de 180 dias da sua publicação. Desde então, temos acompanhado não só inúmeras referências à Lei em publicações, artigos acadêmicos e petições de advogados, como também a sua efetiva aplicação pelos mais variados órgãos da administração pública.

É o caso da Resolução 4.222/2018, em que a Procuradoria-Geral do Estado do Rio de Janeiro constituiu comissão para análise global da construção e da operação da linha 4 do metrô. A norma prevê que a comissão deverá levar em consideração a nova lei. Na prática, na análise sobre o destino da linha 4 do metrô carioca, a comissão deverá considerar, por exemplo, a segurança jurídica dos contratos em vigor e as consequências práticas de suas decisões.

Já o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) vem editando súmulas com base no art. 30 da LINDB, segundo o qual as autoridades públicas devem atuar para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas, inclusive por meio de súmulas administrativas.

No âmbito dos órgãos de controle, mesmo o TCU, que durante o período prévio ao escrutínio presidencial da proposta legislativa manifestou-se contrário à sua sanção, vem, reiteradamente, aplicando a nova lei em seus julgados.

Em julgamento de processo de auditoria na Prefeitura de Balneário Camboriú para avaliar a legalidade da gestão dos recursos financeiros do SUS, o TCU aplicou pena de multa ao agente público atribuindo à conduta o “erro grosseiro” previsto no art. 28 da LINDB (Acórdão 1628/2018). Em outro julgado recente, o Tribunal motivou o acórdão 1643/2018, no que diz respeito à absolvição de aplicação de multa aos então titulares dos Ministérios da Educação e do Planejamento, no art. 22 da LINDB, em reconhecimento aos obstáculos reais vivenciados pelos gestores públicos.

Em proposta de suspensão da concorrência pública para a contratação das obras da linha leste do metrô de Fortaleza, o TCU determinou a suspensão cautelar da licitação, ponderando as disposições dos arts. 20 e 21 da LINDB (acórdão 1746/2018).

É de notar que a Corte de Contas utilizou a nova LINDB em situações bastante variadas. A mesma lei: (i) serviu para condenar um agente público por ter conduta caracterizada como erro grosseiro (art. 28); (ii) justificou a absolvição de agentes públicos por restarem evidenciadas as dificuldades que acometem o gestor no trato da coisa pública (art. 22); e (iii) foi objeto de reflexões do julgador para o deferimento de cautelar de suspensão de um processo licitatório (arts. 20 e 21).

Na mesma toada, o Judiciário vem enfrentando a nova legislação. Em ação que discute a possibilidade de entidade de previdência descontinuar benefício previdenciário, o Tribunal de Justiça de São Paulo utilizou o art. 24 da LINDB para afastar a supressão da aposentadoria, sob argumento de que a revisão de ato administrativo deve sobrelevar a segurança jurídica (Apelação 1013639-29.2017.8.26.0566). No Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, os arts. 20 a 24 serviram de fundamento para garantir a publicidade de atos da administração e conceder à parte o direito de informações sobre os contemplados em Programa de Habitação Popular (agravo de instrumento 0028258-88.2018.8.19.0000).

A nova lei institui parâmetros lógicos e ponderados, que devem ser obrigatoriamente observados, e sua efetiva aplicação, tanto no âmbito judicial como administrativo, certamente produzirá melhores decisões que propiciarão um ambiente mais seguro para concretização de negócios.

Cristiano Castilhos é advogado e membro da Comissão de Infraestrutura da OAB/RJ

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

Fonte: Valor Econômico- 26/9/2018-

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