O Supremo Tribunal Federal (STF) poderá analisar a constitucionalidade das contribuições destinadas ao Incra, ao Sebrae, à Apex e à ABDI. Os Recursos Extraordinários nº 630898/RS e 603624/SC com repercussão geral reconhecida para discutir, respectivamente, a constitucionalidade da contribuição ao Incra e das contribuições ao Sebrae, Apex e ABDI devem ser apreciados pelo STF.
“Apesar de não discutir expressamente outras contribuições de mesma natureza, o entendimento adotado pelo STF no julgamento desses recursos também definirá a validade das contribuições ao salário educação, Senai, Sesi, Sesc e Senac, afinal todas elas também possuem como fundamento constitucional o artigo 149 e incidem sobre a folha de salários”, esclarece o advogado tributarista do escritório Schneider, Pugliese, Sztokfisz, Figueiredo e Carvalho Advogados, Flavio Carvalho.
Contabilidade – O recurso alega inconstitucionalidade com base em que argumentos?
Flavio Carvalho – Alega-se inconstitucionalidade com base na ofensa ao artigo 149, §2º, III, “a”, da Constituição Federal, norma que expressamente diz que as contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico somente poderão incidir sobre as seguintes bases econômicas: faturamento, receita bruta, valor da operação e valor aduaneiro (no caso de importação). Assim, todas as contribuições (que não sejam as da Seguridade Social e Previdenciárias, do artigo 195 da Constituição) que incidam sobre a folha de salários são (ou se tornaram) inconstitucionais a partir de 2001, quando promulgada a Emenda Constituição nº 33, que inseriu referida norma do artigo 149 na Constituição.
Contabilidade – Por que a base de cálculo das contribuições tem sido a folha de salários?
Carvalho – Foi uma opção política feita em nosso País faz muitos anos, antes da Constituição de 1988, que perdura até hoje, por mais que alguns governos tenham tentando desonerá-la ao longo do tempo.
Contabilidade – Caso a decisão do STF seja pela inconstitucionalidade da forma de cálculo das contribuições haverá efeito sobre todas as cobranças futuras?
Carvalho – Deverá ter efeito sobre todos os pagamentos futuros e para aquelas empresas que foram ao Judiciário será reconhecido o direito de reaverem o que pagaram indevidamente, respeitada a prescrição.
Contabilidade – Há a possibilidade de a União ou os órgãos terem de pagar uma restituição aos contribuintes? Como deve ser feito o cálculo desse valor?
Carvalho – Terão direito à restituição (que deve ser feita pela União e não pelos órgãos que recebem os recursos), os contribuintes que possuem ação judicial com esse pedido e que obtiverem decisão judicial nesse sentido. O julgamento do STF é importante para esses contribuintes que foram ao Judiciário, pois tornará mais célere a ação na hipótese de o Supremo reconhecer a invalidade da cobrança. Os demais contribuintes que não ajuizaram ação somente terão direito à restituição se o STF reconhecer a invalidade e a RFB se pronunciar autorizando essa restituição para o período que antecede o julgamento (o que somente deve ocorrer se houver manifestação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, nos termos do artigo19, §§ 5º e 7º, da Lei nº 10.522/2002). Em qualquer hipótese, a restituição deve ser corrigida pela Taxa Selic.
Contabilidade – Como reivindicar a restituição?
Carvalho – Atualmente, a única forma de obstar o pagamento dessas contribuições e requerer a restituição (que será corrigida pela Taxa Selic) é por intermédio de uma ação judicial. Caso o STF reconheça o direito dos contribuintes e a Fazenda Nacional emita comunicado oficial aceitando a decisão, poderá ficar mais fácil a restituição por intermédio de pleito administrativo.
Contabilidade – As contribuições são importantes à manutenção dos órgãos beneficiados?
Carvalho – No modelo hoje existente de financiamento desses órgãos, tais contribuição são bastante importantes para muitos desses entes paraestatais, que desempenham funções das mais variadas, algumas no nítido interesse do governo (como a Apex e a ABDI). A solução, se acaso foi reconhecida a inconstitucionalidade desses tributos, seria que esses órgãos, caso sejam realmente relevantes para nossa sociedade, teriam que buscar outras fontes de recursos para sua manutenção. Talvez, até mesmo a transferência de recursos públicos. Contudo, é relevante mencionar que o Brasil é o único país do mundo com tantos órgãos paraestatais que são financiados por recursos de toda a sociedade e cujos controles de gastos são muito precários, favorecendo o mau uso desses. O reconhecimento dessa inconstitucionalidade talvez coloque esse importante tema para debate da sociedade, haja vista que muitos desses órgãos são frutos de outra época, que perduram até hoje (como os serviços da indústria e do comércio).
Fonte- Jornal do Comércio- 10/5/2017- http://jcrs.uol.com.br/_conteudo/2017/05/cadernos/jc_contabilidade/560717-contribuicoes-pagas-a-orgao-paraestatal-tem-restituicao.html