Rafael Capaz Goulart: casos de corrupção devem ser apurados desde que a conta não seja repassada às empresas
Uma empresa do setor de petróleo e gás obteve liminar na Justiça Federal para suspender a incidência dos juros de mora sobre uma dívida em discussão no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Como o tribunal administrativo está há quatro meses sem julgar processos em decorrência da Operação Zelotes da Polícia Federal, que apura denúncias de corrupção, a defesa da companhia alegou que não poderia ser punida com o pagamento da Selic.
A decisão, a primeira que se tem notícia, deve incentivar outros contribuintes a seguir o mesmo caminho, segundo advogados. As sessões do Carf foram oficialmente suspensas no dia 31 de março. No dia 28 de julho, houve uma cerimônia de retomada das atividades com a presença do ministro da Fazenda Joaquim Levy. Contudo, as novas turmas de julgamento ainda não estão completas, não houve aprovação do projeto de lei que prevê a nova remuneração dos conselheiros e, consequentemente, não há pauta para julgamentos.
Os advogados da empresa, Rafael Capaz Goulart e Bruno de Abreu Faria, do Abreu, Faria, Goulart e Santos Advogados, alegam que o artigo 24 da Lei nº 11.457, de 2007, prevê o prazo máximo de 360 dias para que o processo administrativo seja julgado. “Uma vez concluído esse prazo, a Fazenda entra em mora, o que anularia a cobrança dos juros de mora do contribuinte”, diz Faria. Para Goulart, “os casos de corrupção têm que ser apurados desde que essa conta não seja repassada às empresas”.
A juíza federal substituta Andreia Fernandes Ono, da 2ª Vara Federal de Piracicaba (SP), deferiu a liminar para suspender a cobrança dos juros de mora enquanto perdurar a suspensão das sessões de julgamento. “Considerando que o contribuinte não pode aguardar indefinitivamente a apreciação do seu pedido, bem como a inexistência de mora imputável à impetrante, entendo plausível a concessão de ordem liminar a fim de que não seja penalizada pela inércia ou demora”, diz na decisão.
Para a juíza, o fato de a administração não ter analisado o processo da companhia no prazo de 360 dias “configuraria ilegítima a incidência dos juros de mora sobre os créditos tributários sob apreciação, uma vez que a demora injustificada afronta os princípios que regem a administração pública, quais sejam legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, previstos no artigo 37 da Constituição Federal”.
A liminar deve encorajar outras companhias a entrar com ações, segundo Rafael Goulart. O escritório entrou com outros pedidos semelhantes. Entre eles, um pedido de liminar que foi negado no dia 15 de junho pela juíza Andréa Cunha Esmeraldo, da 4ª Vara Federal do Rio de Janeiro.
Na decisão, contudo, a magistrada entendeu que, como o Ministério da Fazenda, por meio de comunicado, estabeleceu que as sessões foram suspensas, mas que serão reprogramadas “sem prejuízo do total de sessões previstas para o ano”, nada impediria que esses recursos sejam julgados mais rápido após a reestruturação do Carf.
“Ademais, não se vislumbra risco de dano irreparável ou de difícil reparação, caso venha a ser reconhecida posteriormente a suspensão da incidência dos juros quando da prolação da sentença, vez que o impetrante não está na iminência de ser cobrado quanto aos créditos questionados”, diz a juíza na decisão.
O advogado Caio Marques Taniguchi, do Aidar SBZ, afirma que a tese o surpreendeu positivamente. Segundo ele, alguns contribuintes já tinham conseguido na Justiça o julgamento de seus processos administrativos em 30 dias, com a lei de 2007. Porém, acrescenta, que a liminar abre um novo caminho para a discussão ao afastar a incidência de juros de mora. “Ao considerar que a taxa Selic hoje é superior à inflação, tem sido um ótimo negócio para o Fisco deixar essas ações correndo”, diz.
Para o advogado, “o contribuinte não pode pagar pela morosidade do Fisco, ainda que a Operação Zelotes traga um justo motivo para a interrupção dos julgamentos”. Taniguchi também acredita que poderá se discutir na Justiça o pagamento da multa moratória de 75% do valor, que é lançada na autuação fiscal.
A demora nos julgamentos do Carf, porém, já vinha ocorrendo mesmo antes da operação, segundo o advogado Vinicius Branco, do Levy & Salomão Advogados. “O atraso já estava acontecendo devido ao acúmulo de processos”, diz.
Branco afirma que tem entrado com ações semelhantes no Judiciário para discutir a demora, independentemente da Operação Zelotes. “Passou dos 360 dias o contribuinte não tem que pagar juros de mora”. Segundo o advogado, essas ações são uma forma de apressar os julgamentos. Para isso, já conta com decisões mais antigas do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que determinam o julgamento de processos administrativos, mesmo antes da lei que fixou o prazo de 360 dias. A nova liminar, porém, dá um passo a mais ao afastar o pagamento dos juros de mora.
Procurados pelo Valor, o Ministério da Fazenda, a Receita Federal e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) não deram retorno até o fechamento da edição.
Fonte : Valor Econômico- 24/8/2015-
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